USP analisa impacto das religiões nos debates sobre política pública no Brasil

Ainda que menos frequentadas que no passado, instituições religiosas vêm se tornando cada vez mais influentes na política nacional

Imagem: reprodução Creative Communs

O Centro de Estudos da Religião e Políticas Públicas (Cerp) é uma organização sem fins lucrativos e de caráter laico, vinculado à USP, dedicada aos estudos sobre a influência religiosa na política e economia brasileira. 

Fundado por Raphael Corbi e Fábio Miessi, o instituto tem como principal objetivo fornecer dados e análises quantitativas acerca do tema. Em entrevista para a Agência Universitária de Notícias (AUN), Raphael Corbi afirma que “o Cerp surgiu para preencher uma lacuna. Há muitas pesquisas e estudos que fazem análises relevantes do impacto das religiões na política, porém todas com um viés qualitativo. Ainda não havia, antes do nosso centro, uma entidade com rigor metodológico que fornecesse dados concretos acerca do tema. Por isso, criamos um órgão capaz de suprir essa necessidade.”  

Para além dos textos acadêmicos e análises complexas, os pesquisadores também desenvolvem artigos e outros projetos com linguagem mais acessível, com intenção de democratizar o acesso a essas informações e fomentar o debate público sobre o assunto. Não raro, estudos do Cerp aparecem em matérias de veículos da grande imprensa, como a Folha de S.Paulo e o Nexo Jornal. 

Segundo o fundador do centro, a circulação desses materiais no meio popular é essencial – “Ainda que as pessoas estejam indo menos na igreja hoje em dia do que em relação ao passado, é notável uma partição maior da religião na política nacional. Portanto, há uma maior presença de pautas guiadas por essas crenças circulando no parlamento. Isso transforma a religião e o posicionamento de líderes religiosos em um ponto chave para o entendimento da política em geral no Brasil ”. 

A religião dentro da política

Para exemplificar essa influência na prática, o professor Corbi cita o caso da recém promulgada Emenda Constitucional 116, que isenta do IPTU os templos religiosos que funcionam em espaços alugados. Essa medida, que era uma reivindicação feita principalmente por líderes evangélicos, segundo as análises do Cerp afeta positivamente o crescimento do número de igrejas evangélicas no país, pois essas frequentemente se instalam em propriedades das quais são locatárias. Em contrapartida, igrejas católicas costumam ser proprietárias do espaço físico de seus templos, sendo pouco beneficiadas pela medida em questão. O professor também destaca que, segundo análises do centro, a abertura de um templo evangélico gera um aumento de cerca de 4 pontos percentuais nos votos recebidos por políticos da chamada Frente Parlamentar Evangélica  (FEP). Além disso, destaca que líderes evangélicos são substancialmente mais influentes nas decisões políticas de seus fiéis do que os católicos. 

É importante salientar que a influência eleitoral citada acima é referente a unidades abertas em um determinado contexto. No caso, trata-se de igrejas abertas em pequenas cidades, onde há poucas entidades religiosas. Em cidades maiores, o efeito exercido pela abertura de uma única igreja termina se diluindo, tornando a correlação de causa e efeito entre os fatos mais complexa. 

Igrejas e o “mercado de fiéis”

Ao analisar dados da Receita Federal que dizem respeito à entrada e saída de templos religiosos de várias regiões do Brasil, foi observado que as igrejas se comportam como empresas que competem entre si, reproduzindo padrões observados em outros vários tipos de mercado. “As igrejas reagem à competição, essa observação é o que nos dá o conforto de afirmar que elas competem. Na hora de tomar a decisão de se instalar em uma região A ou B, os líderes religiosos tendem a se instalar onde não há outra instituição religiosa já estabelecida no local, para evitar concorrência. ”  Esse comportamento é observado entre igrejas de denominações diferentes, mas é ainda mais latente quando se trata de disputas entre igrejas de mesma linhagem. 

O crescimento da igreja evangélica  

Dentro dessa lógica de mercado anteriormente citada, as igrejas evangélicas parecem estar tomando a dianteira no que se refere ao interesse dos fiéis. O número de evangélicos no Brasil aumentou cerca de 14%  nos anos compreendidos entre 1991 e 2010, quando ocorreu o último censo. Nesse mesmo período, é possível observar uma queda proporcional na população autodeclarada católica. Parte desse crescimento se deve a Frente Parlamentar Evangélica, que atua na política em benefício das igrejas dessa denominação. Outra parte, se deve ao espaço conquistado na grande mídia, também por meio da política, por instituições como a Assembleia de Deus e outros grupos que contam com extensos horários de programação  própria em canais de tv aberta, como a Rede Tv. Corbi ressalta que a relação entre as igrejas evangélicas e a FEP é de caráter retroalimentativo. O crescimento de um influencia positivamente no poder do outro. 

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