Pesquisadores da USP participam de primeiro estudo epidemiológico nacional sobre malária na gestação

Durante mais de uma década, os cientistas mapearam os focos da doença no país e investigaram o perfil da população infectada

A malária aumenta o risco de aborto espontâneo, parto prematuro e pode trazer complicações para a saúde da gestante. [Imagem: Reprodução/Pixabay]

Um estudo publicado em maio na revista científica The Lancet Regional Health – Americas, coordenado por pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da USP (ICB) e da Faculdade de Saúde Pública da USP (FSP), analisou os padrões de infecção por malária durante a gravidez em várias localidades do Brasil. Ao longo de 15 anos, os cientistas avaliaram dados de mais de 60 mil gestantes que haviam contraído a doença, a fim de mapear os focos de contágio.

“O objetivo do estudo era traçar um panorama da doença, tanto na região endêmica, o Norte, como na região extra-amazônica”, explica Jamille Dombrowski, pesquisadora do ICB-USP. “A ideia era fazer não apenas um levantamento dos casos de malária gestacional, mas uma análise de como se deu a evolução da doença no país ao longo dos anos”.

Por meio da consolidação de dados obtidos a partir do Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica e Notificação de Casos (Sivep-Malária), do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc) e do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), os pesquisadores identificaram municípios no Amazonas, Acre, Rondônia e Pará com alta incidência de malária na gestação. Outra descoberta foi a de que mulheres jovens são mais propensas a contrair a infecção (cujo agente causador é um parasita do gênero Plasmodium, transmitido pela fêmea infectada do mosquito Anopheles).

 

A partir de análises estatísticas, o estudo apontou as taxas de incidência de malária a cada 1000 habitantes em diversos municípios da Amazônia Legal. Foram feitas análises por espécie: em azul, Plasmodium vivax, e, em vermelho, Plasmodium falciparum. [Imagem: Reprodução]
Além disso, o estudo, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), apontou indícios de que o tratamento dessas pacientes pode não estar sendo feito de maneira adequada. Isso foi constatado com base em estatísticas do Sivep, que evidenciaram um elevado percentual de administração de primaquina para gestantes com malária. Trata-se de um medicamento contraindicado durante a gravidez, pois pode provocar a destruição dos glóbulos vermelhos do sangue do feto (células responsáveis pelo transporte de oxigênio).

Segundo o Guia de Tratamento de Malária no Brasil, criado pelo Ministério da Saúde, gestantes e crianças com menos de 6 meses de idade não devem usar a primaquina. No caso de infecções pelo Plasmodium vivax, espécie predominante no Brasil, as mulheres grávidas devem ser tratadas com cloroquina por três dias. Depois, é indicado um tratamento preventivo, com a ingestão do medicamento semanalmente até um mês de aleitamento. O objetivo dessa medida é prevenir recaídas, que são provocadas por uma forma do parasita que se mantém dormente no fígado, chamada de hipnozoíto.

Segundo a pesquisadora do ICB, as informações reveladas pelo estudo são de grande importância para os agentes responsáveis por elaborar as políticas de combate à malária. “Os mapas que construímos, indicando os clusters (aglomerados) de maior incidência da doença, podem auxiliar o Ministério da Saúde e os serviços públicos regionais de saúde como um todo a detectar com mais facilidade as regiões críticas e voltar a atenção para esses locais”. 

A pesquisadora Jamille Dombrowski em trabalho de campo. [Imagem: Arquivo pessoal]
Para retratar com precisão o quadro epidemiológico da malária no Brasil, os pesquisadores empregaram diversas análises e métodos estatísticos. Um deles foi o método bayesiano espacial, que permitiu identificar as taxas de incidência da doença em municípios, corrigindo valores falsos que poderiam surgir em virtude do tamanho reduzido de algumas populações. Também foi feita uma análise espacial, que considerou o conjunto total de casos de malária ocorridos entre 2004 e 2014, detectando as áreas de maior e menor risco de contágio. Outro tipo de análise realizada foi a espaço-temporal, que levou em conta as mudanças espaciais nos locais estudados.

* O artigo “Mapping and characterizing areas with high levels of malaria in pregnancy in Brazil: A spatiotemporal analysis” (DOI: 10.1016/j. lana.2022.100285 ) de Jamille Gregorio Dombrowski, Laura Cordeiro Gomes, Camila Lorenz, Raquel Gardini Sanches Palasio, Paola Marchesini, Sabrina Epiphanio e Claudio Romero Farias Marinho, pode ser lido em: https://www.thelancet.com/issue/S2667-193X(21)X0010-5

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