Branqueamento de corais: como as espécies brasileiras foram afetadas

A partir do caso do coral M.Harttii, estudo entendeu as consequências do evento de branqueamento de corais de 2019 e do aquecimento global nas espécies do Atlântico

Corais são animais marinhos invertebrados, conhecidos como pólipo. [Imagem/Reprodução Giulia Braz]

Estudo realizado pelo Laboratório de Recifes de Corais e Mudanças Climáticas (LARC), do Instituto de Oceanografia da USP (IOUSP), buscou compreender o processo erosivo do coral Mussismilia harttii, a partir do contexto de branqueamento dos corais de 2019. Os corais brasileiros foram muito afetados por este fenômeno decorrente das mudanças climáticas. Até então, pouco se estudava a respeito dos recifes únicos do Atlântico Sudoeste, focando-se mais nas espécies caribenhas e indo-pacíficas. Dessa forma, o estudo pôde expandir o olhar sobre o fenômeno do branqueamento e suas consequências para outros eixos geográficos, a partir do caso do coral endêmico e regionalmente dominante, M.Harttii

O aquecimento global tem gerado sérias consequências aos recifes de corais ao redor do mundo, o que gera preocupação por parte dos seus estudiosos. De acordo com Giulia Braz, bióloga, mestranda do LARC e uma das cientistas envolvidas no estudo, os serviços ecossistêmicos oferecidos pelos recifes movimentam cerca de 9.8 trilhões de dólares e beneficiam 500 milhões de pessoas por ano. “Isso tudo, por conta da proteção do impacto das ondas na costa, turismo, pesca de subsistência, indústria de farmacologia e biotecnologia, aquarismo e a própria diversidade biológica”, reiterou Giulia. A espécie estudada pelo laboratório, M. Harttii, apresenta funções ecológicas que possibilitam a existência de uma fauna associada a ele, e está ameaçada de extinção. “Com a erosão de M. harttii, a consequência direta é a perda de habitat para muitas espécies, afetando diretamente a biodiversidade e riqueza de espécies locais”, comenta a bióloga.

A morfologia de M.Harttii o torna ideal para conseguir quantificar a erosão, uma vez possui várias colunas que se unem apenas na base da colônia [Imagem/Reprodução Giulia Braz]
O branqueamento é um processo decorrente do aumento da temperatura superficial da água. Nesse processo, microalgas, chamadas zooxantelas, moradoras das células dos corais, liberam radicais livres nos tecidos desses indivíduos. Como consequência, os corais expulsam as microalgas. A problemática é: as zooxantelas são grande parte da alimentação dos corais. A partir dessa dificuldade de nutrição exógena, os pigmentos do coral se degradam, fazendo com que seu tecido fique cada vez mais fino e translúcido, tornando seu esqueleto visível, o que permite a aparência esbranquiçada. “O que pudemos notar nesta pesquisa é que no caso do branqueamento em Mussismilia harttii, o estado de saúde das colônias era diretamente relacionado à porosidade do esqueleto. Sendo que, quanto mais poroso, mais frágil fica o esqueleto, e as colônias acabam erodindo”, reitera Giulia. 

Com base  no estudo, que coletou amostras de coralito M. Harttii – de uma colônia saudável, uma levemente branqueada, uma severamente branqueada e uma morta – 90% das colônias sofreram branqueamento e mais de 60% tiveram perda de cobertura viva. Somado a isso, houve uma perda de 33,8% a 85,2% de área de colônias intactas e a erosão severa de todas as amostras.

No Brasil, os recifes se encontram desde a foz do Rio Amazonas até a região de Santa Catarina e apresentam uma série de particularidades que os tornam mais resistentes do que as espécies existentes no Caribe e no Indo-Pacífico. “Devido a grande malha fluvial do litoral brasileiro, nossos recifes estão adaptados a uma quantidade maior de sedimentos na água, bem como uma turbidez elevada, explica a bióloga. “Estes fatores que configuram desvantagens para recifes de corais em outras províncias, aqui acabam, de certa forma, protegendo os corais das ondas de calor, pois barram a penetração da luz na água”, continua . Fora isso, Giulia comenta que os recifes brasileiros conseguem existir em maiores profundidades, locais menos afetados pelo aquecimento global, fator protetivo nos casos de branqueamento. Esses fatores, infelizmente, não protegem totalmente as espécies brasileiras.

A costa de recifes brasileiros está entre os maiores sistemas de recifes de corais no planeta [Imagem/Reprodução Freepik]
Por fim, o estudo apresentou mais uma das ameaças, consequentes do aquecimento global, aos corais. É necessário um olhar mais atento às regiões afetadas pelo branqueamento, para que medidas sejam tomadas e evite-se maiores perdas para esses indivíduos. Para Giulia, caso os recifes continuem sendo amplamente afetados, será enfrentada a perda dos recursos produzidos por ambientes coralíneos que possibilitam a existência dos serviços ecossistêmicos gerados por eles.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*