Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP completa 60 anos e inicia comemorações com a exposição “Tempos Fraturados”

Exposição de longa duração propõe uma reflexão sobre temáticas da experiência histórica, política e social dos séculos XX e XXI, relacionando-as ao próprio contexto de criação do Museu

Vista da exposição “Tempos Fraturados”. Foto: Arquivo Pessoal/Guilherme Castro Sousa

Para comemorar os 60 anos de sua criação, o Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP destina os 6º e 7º andares de seu edifício, localizado no Parque Ibirapuera, para um novo acervo de longa duração. A exposição “Tempos Fraturados” foi inaugurada em 18 de março de 2023, iniciando as comemorações do sexagenário do Museu, e terá duração de cinco anos. 

Durante esse período, o público poderá compreender as principais características do acervo, enquanto a coleção será  revisitada, de tempos em tempos, oferecendo mais espaço para outras questões contemporâneas. A mostra abrange obras e artistas que retratam o contexto histórico-político-social dos séculos XX e XXI, no Brasil. Essa temática está diretamente relacionada ao contexto de criação do Museu de Arte Contemporânea, em 1963, um ano antes do golpe militar. Em seus anos iniciais, pela gestão de Walter Zanini, o Museu foi transformado em uma plataforma de denúncia, reflexão e resistência durante o período de repressão. 

Exposição: produção e eixos temáticos

Para a exposição, um grupo de seis curadores reuniu as obras do acervo em três eixos — a institucionalização do Museu, a arte como experiência coletiva e a arte como experiência subjetiva. O eixo institucional apresenta o conjunto de 13 obras doadas por Nelson Rockefeller, magnata e ex-vice-presidente dos Estados Unidos, para incentivar a criação do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM SP). A coleção foi transferida para a USP em 1963, dando origem ao MAC.

Os outros eixos contemplam os agrupamentos Inconsciente (não) livre, Guerra Fria, Resistência, Êxodo, Retrato, Apropriação e Violência. De acordo com Rodrigo Queiroz, curador da exposição e professor associado da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, “Os grupamentos ou núcleos da exposição ‘Tempos Fraturados’ apresentam as diferenças entre uma posição mais apaziguada, contemplativa do artista e seu oposto, uma postura de enfrentamento do status quo que perpetua a desigualdade”. 

A boba (1915-1916), Anita Malfatti. Foto: Arquivo Pessoal/Guilherme Castro Sousa

Alguns dos agrupamentos conseguem articular as duas posturas, como Apropriação. Neste acervo, é possível encontrar obras que exploram a representação do outro, como nas esculturas de Victor Brecheret, nas quais o indígena é apresentado como um símbolo de exotismo que constitui a “identidade nacional” do Brasil. Enquanto as obras de Anna Bella Geiger, por exemplo, reproduzem as posturas e as atividades de mulheres indígenas de diversas etnias encontradas em cartões postais de bancas de jornal, e chamam a atenção para as diferenças entre a mulher branca, moradora da cidade, e a mulher indígena que vive em sua comunidade. Apesar disso, a artista faz uma crítica às tarefas comuns a todas as mulheres em suas pinturas, como determinadas atividades domésticas. 

Segundo Rodrigo, a História da Arte não existiria sem a apropriação, já que “nem sempre o artista fala sobre si mesmo. Falar sobre o outro, em maior ou menor grau, não deixa de ser uma espécie de apropriação, nem que seja a apropriação do ‘lugar de fala’, para usarmos um termo bem atual”. Porém, quando um artista se apropria do outro, e o retrata superficialmente, sua referência acaba sendo banalizada e, para o professor, essa atitude deve ser questionada. 

Já o núcleo Êxodo retrata o fenômeno que se manifestou em diversos momentos do século XX, quando populações foram obrigadas a abandonar seus países de origem devido a guerras, conflitos étnicos e perseguições políticas. Este acervo reúne obras produzidas por artistas refugiados ou imigrantes que, em diferentes momentos, chegaram ao Brasil, como Arthur Kaufmann, Eric Brill, Frans Krajcberg, Pola Rezende, Alice Brill e Hildegard Rosenthal.

Em primeiro plano, Êxodo (1960), Pola Rezende. Em segundo plano, Desamparados (1947), Abelardo da Hora. Foto: Arquivo Pessoal/Guilherme Castro Sousa

Helouise Costa, professora livre-docente e curadora, afirma que “um grande contingente de intelectuais e artistas aqui aportaram no período da Segunda Guerra Mundial, seja como refugiados ou imigrantes. Boa parte deles chegaram com formação e experiência prévia em diversas áreas e puderam contribuir de maneira significativa para a literatura, dramaturgia, fotografia e artes de uma maneira geral”.

São Sebastião (Marighella) (1969-1970), Sérgio Ferro. Homenagem ao líder da Ação Libertadora Nacional (ALN), Carlos Marighella, assassinado em novembro de 1969, no contexto da ditadura civil-militar no Brasil. Foto: Arquivo Pessoal/Guilherme Castro Sousa

Essa coleção, como outras do Museu de Arte Contemporânea, expõe eventos que influenciaram a formação sociopolítica brasileira. O núcleo Violência traz um acervo que dialoga com o contexto de opressão e violência dos anos iniciais do MAC, fundado um ano antes do início da Ditadura Civil-Militar no Brasil. As obras de Beth Moysés e da artista guatemalteca Regina José Galindo, por exemplo, refletem sobre a violência de gênero e o feminicídio, questões que assolam o Brasil e o mundo nos dias atuais.

5664 Mulheres (2014), Beth Moysés. Foto: Arquivo Pessoal/Guilherme Castro Sousa

Algumas das obras da exposição “Tempos Fraturados” possuem em suas etiquetas um QR Code que leva o visitante a textos curtos sobre elas. Todas as obras podem ser encontradas no 6º e 7º andar do Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP, localizado na Avenida Pedro Álvares Cabral, 1301, no Parque Ibirapuera, em São Paulo. O MAC funciona de terça a domingo, das 11h às 21h, e a entrada é gratuita.  

Para saber mais sobre o Museu de Arte Contemporânea e todas as suas exposições, acesse este link.

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