USP elabora plano geoturístico para o litoral norte de São Paulo

Coleta de amostras nas Ruínas de Lagoinha, em Ubatuba. Imagem: Karlla Arruda

Em continuidade aos trabalhos desenvolvidos pelo Núcleo de Apoio à Pesquisa em Patrimônio Geológico e Geoturismo (Geohereditas) da USP, Karlla Arruda realizou, em seu projeto de doutorado, o inventário do patrimônio geológico de Caraguatatuba e do patrimônio cultural e construído das quatro cidades do litoral norte de São Paulo: Caraguatatuba, Ilhabela, São Sebastião e Ubatuba. Com os resultados, propôs um plano geoturístico integrado para a região, que trabalha com a gestão do geoturismo. Além disso, selecionou e mapeou 35 sítios de geodiversidade — locais que, diferentemente dos geossítios, não necessariamente têm valor científico, mas podem ser utilizados com propósitos turísticos e educacionais. Os dados levantados foram também utilizados em mapas que indicam os pontos de interesse para o geoturismo nas cidades estudadas.

O plano geoturístico desenvolvido inclui diversos elementos, ainda que tenha um enfoque maior na geodiversidade, uma vez que esse elemento costuma ser preterido em estratégias de gestão do patrimônio natural. “Embora a palavra  geoturismo tenha o ‘geo’ na frente, a prática não está relacionada apenas à geologia. ‘Geo’ está relacionado à terra, portanto, diz respeito a um turismo voltado a todos os elementos da terra: biodiversidade, geodiversidade e sociedade”, explica a pesquisadora.

Um dos elementos considerados para o geoturismo no litoral norte foi o patrimônio construído da região. Ele abrange construções, monumentos e ruínas que tenham valor histórico e cultural para a sociedade e que possuam algum elemento geológico característico em seus materiais de construção. “É uma forma de trabalhar a geologia na área urbana, para que o turista tenha contato direto com a geodiversidade  sem a necessidade de se deslocar para os meios naturais”, diz Karlla. Um exemplo de patrimônio construído inventariado na pesquisa é o Sobradão do Porto, em Ubatuba. O edifício de 1846 tem nos batentes das portas gnaisse facoidal, um tipo de rocha típica do Rio de Janeiro. “O visitante que passa por esse local por outros motivos pode receber também essa informação geológica”, pontua.

Há, ainda, a inclusão do patrimônio cultural, que, de acordo com a pesquisadora, têm ligação estreita com a geodiversidade e, por isso, pode fazer parte do geoturismo. “Da mesma forma que a sociedade afeta diretamente a geodiversidade, seja na forma de mineração ou aplainação de morros, por exemplo, a geodiversidade também interfere diretamente nas dinâmicas sociais de seu entorno”, afirma Karlla. A região do litoral norte tem uma forte herança cultural que provém de comunidades caiçaras, indígenas e quilombolas, que se instalaram nas áreas costeiras — ou no interior das serras, no caso dos quilombolas — por oferecerem condições geomorfológicas favoráveis.

Reunião com líderes da aldeia indígena Boa Vista, em Ubatuba. Imagem: Karlla Arruda

Contudo, muitas dessas comunidades tradicionais, como afirma Karlla, estão sendo expulsas das regiões costeiras por conta do turismo de massa centrado majoritariamente em praias. A ideia de incluir o patrimônio cultural no plano de gestão do geoturismo do litoral norte é de beneficiar tais comunidades com o retorno econômico do turismo, por exemplo. No caso dos indígenas da aldeia da Boa Vista, em Ubatuba, muitos têm que se deslocar até a cidade para trabalhar e vender o artesanato produzido nas aldeias. Com a promoção dos sítios da geodiversidade próximos e da própria aldeia no plano geoturístico, estimula-se o desenvolvimento do turismo e comércio local, inserindo-os nesse contexto comercial, além de participá-los na divulgação do conhecimento geológico para os turistas. “Os indígenas têm um conhecimento muito grande da natureza, que não queremos desconsiderar. Queremos que eles possam se beneficiar da geodiversidade de alguma forma”, comenta Karlla.

Propostas de intervenção

Além da unificação do inventário do patrimônio geológico, construído e cultural das cidades do litoral norte e da confecção de mapas geoturísticos, a pesquisadora estudou intervenções estruturais e estratégias para a conservação dos sítios da geodiversidade levantados durante o projeto. Com base na investigação de como geoparques europeus trabalham a gestão do geoturismo, Karlla propôs medidas que poderiam ser aplicadas ao Brasil.

Uma das propostas de intervenção é a instalação de painéis informativos. “O uso desse tipo de painel é comum nos geoparques da Europa e isso já foi feito nos geossítios do litoral norte pelo Geohereditas, mas isso ainda não existe nos sítios da geodiversidade”, aponta a doutoranda. Além disso, há também a sugestão de se construir estruturas de segurança como grades e corrimãos, principalmente em mirantes, para evitar acidentes envolvendo os visitantes.

Há, também, as intervenções não estruturais, como cursos e palestras sobre geodiversidade e de formação para monitores ambientais, o que já vem sendo feito pelo Núcleo de Apoio à Pesquisa em Patrimônio Geológico e Geoturismo nas cidades do litoral norte. A pesquisadora propõe, ainda, o desenvolvimento de atividades para crianças, como teatros e jogos didáticos: “Toda forma de atividade lúdica é válida para atrair o interesse das crianças e trabalhar sua imaginação.”

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