Com ampla reforma, biblioteca transforma corpo e espírito

Mudanças já se iniciaram no Instituto de matemática e Estatística e contaram com sugestões de alunos

Projeto iniciado em 2016 reforça o ambiente imersivo da biblioteca, mas procura torná-lo mais acolhedor. Foto: Raphael Concli

O que um estudante de matemática pura, um de matemática aplicada e outro de ciência da computação têm em comum? Além de lidarem com números e cálculos e dividirem listas de exercícios há algo mais que compartilham: o espaço da biblioteca. E no caso do Instituto de Matemática e Estatística (IME) da USP, em breve não só estudantes, mas toda a comunidade universitária terá uma instalação bastante reformulada e mais moderna.

Um complexo projeto de reestruturação da biblioteca do Instituto está em curso. Os recursos vêm da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), da Superintendência de Espaço Físico da USP e do próprio IME. A maior parte, cerca de R$1,8 milhão, origina-se da reserva técnica Fapesp ao projeto de pesquisa em Neuromatemática do professor Antônio Galves. A reserva técnica corresponde a uma verba disponibilizada aos projetos da fundação para investimento em materiais e recursos de pesquisa.

“A biblioteca em um instituto de matemática tem sido uma instituição muito importante e valorizada”, destaca o professor Clodoaldo Ragazzo, diretor do IME. A decisão de investir na biblioteca surgiu em conversas com colegas, conta. Estes o ajudaram a perceber que uma obra naquele prédio poderia atingir toda a comunidade do Instituto. Numa previsão otimista, o término das obras será em torno de março de 2018.

Conversas de exatas

A matemática, assim como a filosofia, é uma área em que os textos não envelhecem rapidamente, lembra o professor ao comentar a importância da preservação do acervo. O IME, a propósito, contém uma vasta coleção de revistas científicas que datam do século 19, além de muitos recursos sobre didática em matemática. Daí a conta é simples: quanto mais livros, menos espaço.

Por isso, a primeira etapa da reforma consistiu em compactar espaços na biblioteca. Uma das soluções foi a instalação de estantes deslizantes e remanejamento do acervo, já realizadas ao longo de 2016.

Para as etapas seguintes, duas reuniões abertas aos alunos foram realizadas a fim de se compreender as demandas e necessidades dos estudantes. Foi surpreendente notar que os alunos não queriam que se escondessem os livros, conta o professor Clodoaldo, animado com o envolvimento.

Gianne Uchôa, assistente da direção do instituto e arquiteta de formação, lembra bem dos diversos perfis. Foi ela quem fez os exercícios de layout do projeto. O aluno de matemática pura tende a ser completamente focado e prefere as mesas mais silenciosas, dentro do acervo ou nas salas de leitura. Uma caneta que cai, ou uma trena de arquiteta que se abra sem aviso prévio, atrai olhares, lembra a arquiteta.  

Já a matemática aplicada e ciência da computação tem tipos mais próximos. Precisam de concentração também, mas há maior necessidade de diálogo, assim como espaços para trabalhos em grupo – o que inclusive foi demandado pelo pessoal da computação. Três salas do tipo deverão ser criadas.

Longe de querer generalizar tipos, Gianne procura ressaltar a sensibilidade com que é preciso observar as pessoas e usos que se dão num local, o que interfere diretamente no planejamento: “Essas linhas de pensamento diferentes se refletem nas vontades e necessidades colocadas na mesa.”

Projeto da sala com as mesas de estudo individuais e as democráticas divisórias. Imagem fornecida por Gianne Uchôa

Praticidade maior que luxo

A partir das sugestões dos alunos um programa de necessidades básicas foi pensado. Além das salas de estudo em grupo prevê-se também a ampliação de espaços individuais como a sala de leitura, um dos poucos locais da universidade com acesso disponível 24 horas por dia, todos os dias da semana. Novas áreas de estudo individual dentro do acervo serão criadas também. E a fartura de tomadas e bom acesso à internet devem se tornar realidade.

As mudanças vêm acompanhadas de novo mobiliário, como poltronas e bancadas com divisórias e até de equipamentos como o scanner planetário de autoatendimento, capaz de digitalizar livros sem danificá-los e de forma mais eficiente. Até a altura das divisórias foi motivo de deliberação. Enquanto uns queriam, literalmente, elevada privacidade, outros consideravam que se grandes demais, as peças seriam opressoras. Ganhou um equilibrado meio termo.

Haverá uma realocação de funcionários para o pavimento superior, com salas mais organizadas e privadas, separadas do acervo por paredes de vidro. E também será feita uma reforma na iluminação. Como de praxe na matemática, soluções simples são as mais elegantes. Será o caso com a iluminação por rebatimento a ser instalada, de modo a tornar mais eficiente a distribuição de luz e evitar o sombreamento causado pelo pé direito baixo e estantes altas. Além disso, será feita uma ambientação de espaços de descanso, com luzes que produzem menos o efeito de alerta.

O scanner planetário já está disponível para uso na biblioteca. Foto: Fred Manoel Alves

Espírito digital

“O objetivo é deixar o ambiente mais confortável e usual e adequar os espaços de estudo”, sintetiza Stela Madruga, diretora da biblioteca do IME. Segundo avalia, os nativos digitais gostam de ter estes espaços na universidade, onde se concentram melhor do que em casa.  

Ela é elemento chave na reestruturação de uma biblioteca cada vez mais integrada ao digital. É fato que com tantos recursos online a circulação de material impresso tem diminuído, aponta. Mas é justamente aí que a biblioteca se renova, aprimorando os serviços que pode oferecer. Não é só uma reforma do prédio que está em causa, mas uma mudança de espírito, pontua o professor Clodoaldo.

Embora o acervo há muito já possa ser consultado online, no IME só este ano é que os antigos fichários com indicação dos livros foram deixados de lado. Agora a busca  é somente online, por meio do sistema Dedalus – Banco de Dados Bibliográficos da USP ou pelo Portal de Busca Integrada. sistema de descoberta adquirido pelo SIBi  que permite a busca em todo tipo de produção que a Universidade possua: de publicações impressas a eletrônicas; de livros a periódicos em bases de dados digitais.

Outros serviços como o auxílio com gerenciamento de pesquisa bibliográfica, pesquisa em bases de dados, e mesmo ajuda no preenchimento de perfis acadêmicos online como ORCID, ResearcherID e Currículo Lattes estão em desenvolvimento. Neste pacote prevê-se também a remodelação da página da biblioteca no site do IME, conta Stela.

Se alguns poderiam dizer que investir numa biblioteca seria algo estranho em tempos de acelerada digitalização Gianne arremata: “Não é ir na contramão, mas compreender o tempo atual”, como querem demonstrar.

Da esquerda para a direita o professor Clodoaldo Ragazzo (diretor do IME), Stela Madruga diretora da biblioteca do instituto) e Gianne Uchôa (assistente da direção do IME)

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