Professor diz que a forma como voltaram as aulas presenciais em SP gerou um “reino da confusão” para alunos, professores e familiares

Ocimar Munhoz Alavarse, da Faculdade de Educação da USP, explica que o retorno às aulas não contou com padrão de funcionamento para as escolas

Escola Estadual São Paulo antes da pandemia [Imagem: Reprodução]

No estado de São Paulo, as aulas presenciais de escolas já retornaram. Em entrevista à Agência Universitária de Notícias (AUN), o professor da Faculdade de Educação (FE) da USP e coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Avaliação Educacional (GEPAVE), Ocimar Munhoz Alavarse, defende a importância da escola presencial, mas acredita que o retorno não foi feito de maneira adequada.

Um calendário foi desenvolvido pelo governo estadual especificamente para as escolas privadas e outro para as públicas. As primeiras tiveram o retorno iniciado em 1º de fevereiro de forma opcional para cada instituição, enquanto as escolas estaduais retornaram no dia 8 de fevereiro.

Entre as municipais, as localizadas na capital paulista voltaram no dia 15 do mesmo mês e, nas outras cidades do estado, houve a possibilidade de o retorno acontecer a partir do dia 8. A decisão governamental também definiu que as instituições só poderiam retornar com 35% do total de alunos por dia.

Ainda em fevereiro, algumas escolas suspenderam suas aulas presenciais devido a surtos de Covid-19 entre alunos e funcionários, como é o exemplo da escola privada Instituto Educacional Jaime Kratz, de Campinas.

O especialista Ocimar Alavarse destaca um ponto da iniciativa estadual que cria um cenário em que não há um padrão entre as escolas: a ida às aulas não é obrigatória, fica a cargo da família. Para Alavarse, isso gera um problema, pois não define efetivamente uma solução para os alunos que não vão às aulas e pode resultar em diferenças de funcionamento entre as escolas. 

Também pontua que diretores e cargos de gerência das instituições podem ficar confusos em relação às medidas de ação para os que decidirem não comparecer às aulas. Alavarse comenta que a medida governamental gerou um “reino da confusão”, tanto para as escolas quanto para as famílias das crianças e adolescentes. 

Outra questão a ser considerada é a da saúde dos professores. Uma pesquisa realizada pelo jornal Folha de S. Paulo em parceria com a Secretaria de Educação do estado em 2020 apontou que cerca de 43 mil dos 166 mil professores da rede estadual de ensino disseram ser grupo de risco da Covid-19, dificultando para que ensinem presencialmente. Dentre esses, muitos não irão retornar às salas na recente volta às aulas.  

Rossieli Soares, secretário de Educação de SP, afirmou que professores temporários serão contratados para cobrir o grupo de risco. Os únicos números oficiais divulgados até o momento foram de janeiro, quando o governo de SP decretou que iria contratar 10 mil novos professores para o retorno presencial, número menor que o de integrantes do grupo de risco.

Alavarse propõe a solução de que fosse feito um plano de retorno obrigatório às aulas de forma mais eficiente e padronizada, garantindo a segurança sanitária. Para o professor, 25% do total de alunos seria um bom número para o retorno, o que permitiria que cada aluno tivesse uma semana de contato com os professores por mês, já que cada mês tem aproximadamente quatro semanas.

O ensino remoto ainda se sustenta?

Alavarse aponta que “a desigualdade é marca da escolarização brasileira”, destacando que tal situação foi agravada durante a pandemia, uma vez que grupos de alunos ficaram sem alternativa para assistir às aulas online em razão da carência de dispositivos de acesso à internet.

Além disso, o especialista chama atenção para os próprios professores, muitos dos quais não tinham o costume de usar ferramentas online de ensino. Apesar de também ver problemas no ensino presencial brasileiro, Alavarse pontua que esse é o modelo que a maioria dos professores melhor sabe trabalhar. Para ele, a pandemia os deixou em situação de “vulnerabilidade pedagógica”. 

Outro grupo presente na formação educacional que também foi afetado é o de pais e familiares. Alavarse destaca que eles passaram a atuar de forma similar a gestores do ensino com seus filhos dentro de casa, uma função exercida por educadores. Esse cenário também faz com que muitos queiram que as crianças e jovens retornem às escolas, uma vez que deixarão de desempenhar esse papel em casa. 

Com todas essas pessoas afetadas e com as mudanças promovidas pela pandemia, Alavarse acredita que o ensino presencial vem sofrendo, e ainda sofrerá, alterações. O professor afirma que os dispositivos tecnológicos passarão a fazer parte do aprendizado de maneira significativa como um complemento às aulas presenciais, sendo que alguns devem ter acesso às tecnologias mais cedo e outros mais tarde, dependendo da realidade de cada um.

Na avaliação de Alavarse, o real problema da volta às aulas presenciais está na maneira como vem sendo feita, pois, apesar de tudo, cumpre um papel essencial para familiares, professores e alunos, principalmente os mais vulneráveis.

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