Pesquisadores indígenas compartilham suas vivências na universidade em evento realizado na USP

Ao sair das aldeias e ingressar nos espaços universitários, indígenas lutam por permanência e por preservação dos saberes tradicionais

Imagem de capa: Acervo Pessoal/Mirela Costa

No último dia 19 de abril, Dia dos Povos Indígenas, o Centro de Estudos Ameríndios (CEstA) da Universidade de São Paulo (USP) sediou um debate sobre vivências indígenas na graduação e na pós-graduação. Reinaldo Macuxi e Eric Kamikiawa, doutorandos do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS-USP) e convidados do evento, compartilharam com o público suas experiências ao saírem de suas comunidades de origem e entrarem na universidade. Dentre os principais temas abordados pelos pesquisadores estão as barreiras para a permanência no ambiente universitário e a falta de inclusão do pensamento indígena na produção científica.  

Reinaldo é do município de Normandia, em Roraima, e pertencente aos Macuxi, etnia que habita a região de fronteiras entre o Brasil, a Venezuela e as Guianas. O doutorando é graduado em Gestão Territorial Indígena e mestre em Desenvolvimento Regional da Amazônia pela Universidade Federal de Roraima (UFRR). Apesar da experiência no mundo acadêmico, Reinaldo destaca a ausência de informações para o acesso ao sistema educacional como uma das maiores dificuldades em sua trajetória. 

Eric (à esquerda) e Reinaldo (à direita) falam sobre suas experiências na trajetória acadêmica. [Imagem: Acervo Pessoal/Mirela Costa]
Segundo dados fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o número de matrículas indígenas no ensino superior passou de 9.764, em 2011, para 46.252, em 2021. Apesar do aumento significativo gerado por políticas afirmativas como a Lei de Cotas, a parcela de indígenas universitários ainda é pequena. Eles representam apenas 3,3% dos mais de 1,4 milhão de pessoas que se identificam como indígenas no país, de acordo com dados parciais do Censo Demográfico de 2022

Além dos desafios no ingresso ao ensino superior, a falta de apoio à permanência nas universidades e a desconsideração dos saberes indígenas nas bases curriculares também se colocam como barreiras a serem enfrentadas. Eric Kamikiawa, do povo Kurâ-Bakairi, no Mato Grosso, e também doutorando do PPGAS-USP, aponta como caminho para a reformulação da academia o desenvolvimento de uma ciência plural, que dialoga com variadas formas de produção de conhecimento. 

As percepções dos povos indígenas sobre cura, manutenção do meio-ambiente e relações equilibradas entre o homem e a natureza são de grande relevância, especialmente em meio a um contexto de intensas mudanças climáticas. O estudo das trajetórias indígenas também enriquece o cenário cultural do país, uma vez que os mais de 266 povos existentes no Brasil falam diferentes línguas e carregam seus respectivos costumes. 

A cosmovisão indígena propõe uma relação de conexão com a Terra e de convivência harmônica entre o homem e a natureza. [Imagem: Reprodução/Agência Brasil/Fábio Rodrigues Pozzebom]
Renato Sztutman, coordenador do CEstA e mestre e doutor em Antropologia Social pela USP, ressalta a importância de incluir mais pessoas indígenas nos espaços de pós-graduação.  “Só a partir de 2018 começamos a contar com vagas reservadas para indígenas no mestrado e no doutorado em Antropologia Social. É fundamental tê-los aqui, porque não podemos mais falar sobre indígenas sem contar com a presença deles como pesquisadores”, complementa. 

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*