Cientista desenvolve biossensor vestível para detecção rápida da varíola dos macacos

Pioneira na identificação da varíola dos macacos, tecnologia promete democratizar e agilizar os diagnósticos em crises sanitárias

Biossensores vestíveis permitem diagnósticos mais ágeis e são promessa para melhora na qualidade dos serviços de saúde [Imagem: Reprodução/Guerchon Ndebo/Organização Mundial da Saúde]

Um diagnóstico rápido e acessível. Essa foi a necessidade que o último surto de monkeypox virus (MPXV) – ou varíola dos macacos –, ocorrida em 2022 e 2023, trouxe às discussões sanitárias internacionais. A emergência inspirou o pesquisador Lucas de Lima e o Professor Thiago Paixão, ambos do Instituto de Química (IQ) da Universidade de São Paulo (USP), a desenvolver um dispositivo pioneiro no diagnóstico da infecção: um biossensor eletroquímico vestível e miniaturizado. A pesquisa, nomeada Biossensor capacitivo eletroquímico têxtil inteligente para detecção do vírus da varíola dos macacos em tempo real, foi publicada pela American Chemical Society (ACS) Publications Journal em março de 2025.

O biossensor é um sistema de dois eletrodos (ponto de transição em um circuito elétrico) que ainda está na fase de protótipo. A detecção do vírus ocorre através da capacidade de armazenar energia, chamada capacitância eletroquímica: anticorpos específicos para o MPXV são fixados no sensor que, por sua vez, capta alterações nos sinais elétricos na presença do vírus. “Isso funciona como uma ‘bateria rápida’, onde cargas se acumulam na superfície do eletrodo. O vírus se liga ao anticorpo, ele altera esse acúmulo de cargas, o que muda o sinal detectado. Esse princípio permitiu uma detecção rápida, sem a necessidade de reagentes químicos”, explica Lima.

Com a detecção direta do MPXV na pele do paciente, o pesquisador escolheu como material para compor o sensor a fibra de aramida (polímero sintético de alta resistência e leveza). Além de possuir excelente flexibilidade e resistência ao calor, a fibra é um material de baixo custo e com boa biocompatibilidade, o que é ideal para sensores descartáveis ou vestíveis, como o desenvolvido. 

Tecnologia de gravação a laser

O sensor foi fabricado a partir do uso do método de laser-scribed graphene (LSG), conhecido como gravação a laser. A técnica permite uma produção rápida e automatizada de sensores, além de não exigir o uso de tintas condutivas ou de solventes químicos, o que torna o processo de construção dos mecanismos mais limpo e sustentável.

O aparelho foi produzido a partir da técnica laser-scribed graphene (LSG) sobre fibra de aramida, um material têxtil flexível, resistente e lavável [Imagem: Lucas de Lima/Acervo Pessoal]
O sensor de LSG em aramida apresenta uma alta porosidade, característica que favoreceu a fixação dos anticorpos do MPXV para os testes de sensibilidade do aparelho. Mas, dentre os desafios, Lima destaca a dificuldade de se obter sinais eletroquímicos estáveis por capacitância. A solução, segundo o pesquisador, foi otimizar os parâmetros empregados no sistema do protótipo.

Além dos parâmetros eletroquímicos e da adequação do mecanismo de dois eletrodos interdigitados, o biossensor foi testado com diferentes linhagens virais: SARS-CoV-2 (B.1 e Ômicron), Orthobunyavirus oropoucheense, vírus Mayaro e vírus vaccinia. A alternância entre as cepas virais permitiu que o sensor reconhecesse, exclusivamente, o anticorpo específico da varíola dos macacos sem quaisquer reações cruzadas entre os vírus.

A mudança no sinal eletroquímico que permite o diagnóstico da doença também foi testado com amostras reais de diferentes secreções do corpo humano, como saliva, plasma e simulações de pele infectada. O protótipo do biossensor também pode ser utilizado para o reconhecimento do MPXV em outras vertentes das triagens clínicas, como na urina, no sêmen e nas fezes de pacientes com suspeita de infecção.

Barateamento de custos

Biossensores vestíveis são uma tendência crescente no monitoramento da saúde, uma vez que permitem um acompanhamento contínuo dos pacientes e, sobretudo, intervenções precoces em caso de diagnósticos positivos. O protótipo de  Lima tem ainda maior potencialidade: o sensor possui uma integração com um potenciostato (instrumento eletroquímico que controla a diferença de potencial) portátil via smartphone, que permite monitoramento em tempo real, mesmo em locais remotos.

A nova tecnologia pode ser útil em triagens e monitoramentos rápidos de doenças, tornando-se parte do cuidado pessoal de saúde [Imagem: Lucas de Lima/Acervo Pessoal]
A tecnologia point-of-care (no ponto de atendimento), segundo Lima, foi a base para a criação do sensor, porque se baseia na redução dos custos hospitalares e melhora as respostas sanitárias a surtos patológicos. “Dispositivos point-of-care permitem diagnósticos rápidos, ajudando na tomada de decisões médicas imediatas. Isso pode evitar a superlotação de hospitais e possibilitar o atendimento em regiões de difícil acesso, como comunidades indígenas ou áreas remotas”.

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