Por João Paulo Almeida – joao.almeida@usp.br
A tese de doutorado da pesquisadora Ana Lúcia Iara Gaborim Moreira, Regência coral infantojuvenil no contexto da extensão universitária: a experiência do PCIU, apresentada na Escola de Comunicações e Artes (ECA), traz como resultado o reconhecimento da regência coral infantojuvenil como um campo legítimo de pesquisa e de conhecimento acadêmico, além de estabelecer uma nova metodologia de trabalho na área. Traz também os resultados práticos da experiência com o coral, uma iniciativa bem-sucedida no campo artístico-musical. A pesquisa, inclusive, recebeu menção honrosa na área de linguística, letras e artes, dentro do “Prêmio Tese Destaque USP”, e pode virar um livro, contribuindo para o campo da música e da educação no país.
Como professora de Regência, Canto Coral e Prática de Ensino em Música no curso de Licenciatura da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Gaborim montou um coral, o Projeto Coral Infantojuvenil, PCIU na instituição.
O projeto começou em 2013, para ensinar música por meio do canto coral para crianças na faixa etária de 6 a 12 anos e em poucos meses os alunos começaram a se apresentar em eventos da própria universidade e outros, através de parcerias, como a feita com a Fundação de Cultura Municipal. Em 2014, novos integrantes chegaram e houve a primeira apresentação fora de Campo Grande, em Dourado. Nesse ano, foi organizado também o 1o Encontro de Coros Infantojuvenis da UFMS, envolvendo todo o estado do Mato Grosso do Sul.
Em 2015 algumas músicas foram gravadas em estúdio, houve mais uma apresentação fora da cidade em Bonito, e o projeto continuou crescendo, atendendo também crianças mais novas, na faixa etária de 4 e 5 anos, chamado de “PCIUzinho”.
Em 2016, mais duas faixas etárias foram abertas e o número de inscritos ultrapassou 100 alunos, de forma que nem todos conseguiram entrar. Uma parte dos alunos de 6 a 12 anos mais antigos ficou no grupo “PCIU Alfa”, a turma acima de 13 anos no “PCIU Mais” e os pais dos coralistas no “PCIU Master”.
Também em 2016, o PCIU cantou na recepção da tocha olímpica na UFMS, atuou junto com Coro Comunicantus da USP e participou do Painel Funarte de Regência Coral em Campo Grande.
Depois de 4 anos, o PCIU é também espaço de estágio e aperfeiçoamento para os alunos do curso de música. Além dos resultados artísticos traz também benefícios às crianças que vão desde a timidez e comunicação até o desenvolvimento psicossocial, físico, cognitivo. Os ensaios trazem leitura e escrita musical, jogos rítmicos, preparação vocal, apreciação, percepção e estudo de repertório, que colaboram com melhorias na escola, nas mais diversas disciplinas. As dificuldades de trabalho técnico variam de criança para criança, de acordo com sua origem e experiência, mas todos os aspectos são desenvolvidos de maneira global.
O repertório dos ensaios é eclético, de Tchurip do Japão, a brincadeiras como “Cada um no seu quadrado”, misturando o que já é conhecido pelas crianças com aquilo que, em geral, não lhes é oferecido em outros lugares. “A música tem uma ampla gama de estilos e gêneros desenvolvidos em milhares de anos, porisso há múltiplas possibilidades em termos de repertório, de conteúdos, de jogos para seremcantados, ouvidos, brincados”, explica a pesquisadora.O PCIU busca o aprendizado musical, um legado para toda a vida dos educandos, procurando sempre um resultado artístico de excelência.
É um trabalho contínuo, e não uma atividade pontual para uma determinada apresentação, como ocorre em muitas instituições, como forma de autopromoção, ou preparação para alguma festividade, muito comum nessa área.
Quanto ao regente, Gaborim afirma: “Enquanto profissional da área da regência, é precisocompreender sua função comunicativa e ao mesmo tempo, interpretativa. Isso envolveprincipalmente a sua postura (em sua concepção física e psicológica), o domínio do gestual e a compreensão musical”. Ela aponta as concepções, de “regente-educador”, com habilidades nocampo psicopedagógico e da ludicidade e o “regente-cantor”, onde o autoconhecimento é essencial para que possa instruir os alunos com exatidão, mostrar exemplos e cobrar melhorias. Além dos conhecimento musicais, ele deve ter liderança e habilidade para lidar com as relações humanas. Precisa estar preparado para situações inesperadas, conflitos interpessoais e para levar palavras de encorajamento, consolo e motivação.
Ana Lúcia Gaborim considera também que a formação de regente deveria considerar conhecimentos de psicologia, já que o regente é um modelo a ser seguido. Há um planejamento técnico, musical e de conteúdo, mas muitas vezes na hora do ensaio, na prática, surge a necessidade de se focar nas pessoas, no que estão sentindo, no que refletem musicalmente.
Há também diversas obrigações do regente extraclasse, com funções administrativas, burocráticas e o lado de relações públicas com entidades que promovem o coro ou orquestra. Dada a realidade, também precisa atuar no marketing, na divulgação, nas apresentações e nas ações junto ao público. São habilidades que muitas vezes transcendem sua competência musical.
A pesquisadora também ouviu 52 regentes de coros infantojuvenis, de todo o país, para levantar dados concretos a respeito de dificuldades e desafios da área. Ela constata seis tipos de problemas atuais: ausência de graduação em regência coral infantojuvenil, a ausência da música como área do conhecimento nas escolas brasileiras desde 1971, a falta de instalações e estruturas físicas adequadas, falta de uma equipe junto ao regente, falta de material didático e o advento das novas tecnologias que influencia toda a comunicação de massa.
Contudo, mesmo nesse cenário: “os regentes continuam motivados e impulsionados a desenvolverem seus projetos e a prática coral se faz presente, pelos inúmeros benefícios que têm proporcionado àqueles que nela se envolvem”, afirma.
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