Física identifica fenômeno da polarização ideológica na sociedade

Você sabia que comportamento humano pode ser codificado em matemática? Tese aponta cenários que levam o indivíduo a mudar ou não de opinião

O estudo identifica jogo de confiança e desconfiança entre indivíduos. Créditos: Pixabay

A divergência entre vozes e opiniões na sociedade e as relações de poder e influência entre elas, fenômeno chamado de polarização ideológica, foi o assunto estudado na tese de doutorado de Felippe Alves Pereira, pesquisador do Instituto de Física, orientado pelo professor Nestor Caticha.

O estudo teve como objetivo entender quais mecanismos levam a polarização ideológica na sociedade através da codificação do comportamento humano em matemática e da utilização de princípios físicos. “Desenvolvemos um modelo baseado em representações de pessoas – agentes – que interagem entre eles”, explica o pesquisador. “Esses agentes emitem opiniões sobre assuntos e podem desconfiar uns dos outros, levando ao surgimento de comunidade com opiniões distintas”. Para representá-los, foi desenvolvido um algoritmo de aprendizado de máquina (machine learning).     

Em relação aos parâmetros utilizados para quantificar aspectos ideológicos, Felippe Alves determinou em sua pesquisa um conjunto de fundamentos morais relevantes. De acordo com o pesquisador, cada pessoa dá um peso para uma base moral. Ao entrar em contato com um assunto, representado por seu peso em cada base, a pessoa pode ter uma opinião positiva ou negativa. Ela depende de uma soma cooperada dos pesos dados pela pessoa vezes o peso da questão. 

Dessa forma, o agente formula opiniões para cada assunto dentro de um universo predefinido. “Temos opiniões de vários assuntos e conseguimos identificar polarização ideológica de acordo com o quão distante está um grupo do outro”. Na teoria, podemos olhar para dentro da cabeça do agente e saber os determinados pesos. Na realidade, seria possível fazer perguntas para as pessoas e saber onde estão posicionados dentro do espaço ideológico que foi criado para eles. 

Uma das hipóteses da tese é que os agentes atribuem desconfiança uns aos outros, variando de acordo com a sociedade. É importante ressaltar que existem grupos pequenos de indivíduos interagindo no modelo de Alves. Sendo assim, todos se conhecem e conseguem atribuir confiança ou desconfiança uns aos outros. 

Outra hipótese refere-se aos assuntos discutidos pelos agentes, que são aleatórios. Isso permite identificar que a polarização vai existir caso a combinação de ideologia e desconfiança estejam juntas. Por exemplo, não há surpresas quando alguém recebe e confia na opinião do outro, ou então quando alguém desconfia e discorda. O que leva o agente a mudar de opinião e de confiança em relação ao outro depende do quão confiante o indivíduo está com a própria opinião e na própria atribuição de confiança. 

Segundo Felippe, a conclusão é que há um jogo de confiança e desconfiança entre os envolvidos. Quando os agentes são muito extremistas, ninguém mais muda de opinião e a desconfiança só se acentua. “Se no início os envolvidos não sabem quanta confiança atribuem uns aos outros e possuem vários assuntos para discutir, com o tempo, há uma polarização e se formam dois grupos antagônicos. Conforme o tempo passa, se nada mudar, essa oposição só se intensifica”. 

Uma outra conclusão na teoria de Felippe Alves, que nenhum outro modelo de sociofísica conseguiu fazer, foi demonstrar que se a sociedade de agentes vive numa região em que poucos assuntos são discutidos, a polarização ocorre muito rápida e forte. Já quando há muitos assuntos a serem discutidos, a polarização pode não acontecer e se estagnar. Existe uma relação entre a quantidade de assuntos e a intensidade da polarização ideológica. 

Alves também aplicou sua teoria no modelo de decisões judiciais da corte de apelações dos EUA, proveniente do livro “Os juízes são políticos? Uma análise empírica do judiciário federal”, dos autores Cass Sunstein, David Schkade, Lisa M. Ellman, Andres Sawicki.  

Confira a tese do físico na íntegra por aqui.

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