Torcedores representam vantagem competitiva para as marcas patrocinadoras

Segundo pesquisa, a lealdade que o torcedor dedica ao time pode ser transferida para as empresas

Dificilmente os torcedores trocam de time e essa lealdade é importante para a marca patrocinadora. Imagem: Reprodução (GettyImages)

Sob a ótica do marketing, pesquisa da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP voltou-se para a lealdade do torcedor brasileiro com o seu time de futebol e sua relação com os patrocínios. Destaque na indústria esportiva, o futebol recebe, no Brasil, cerca de 70% dos patrocínios destinados ao esporte. Ciente disso, Fernando Fleury avistou um espaço a ser explorado e partindo da questão “O torcedor pode ser considerado uma vantagem competitiva para o clube pelo qual ele torce?”, buscou descobrir se a lealdade ao time pode ser transferida às marcas patrocinadoras.

Logo de início, Fernando ressalta a existência de grande confusão com os termos identificação e lealdade. Por isso, dedicou uma parte de sua tese para diferenciar os dois termos. Enquanto identificação se encontra no nível psicológico gostar e ter amor pelo time , a lealdade está mais ligada à relação financeira, ou seja, ir aos jogos e comprar os produtos relacionados ao time. Por esse motivo, a identificação não tem grandes oscilações, mas a lealdade pode sofrer muitas alterações se não for bem trabalhada, pois é afetada pelo desempenho em campo e econômico do time e até pela situação econômica e social do país. É muito frequente encontrar casos de pessoas que são identificadas com seus times, mas não necessariamente leais. “É comum os torcedores não estarem dispostos a gastar com o time, porque acham que é papel do time dar tudo para eles.”

Ao observar os patrocínios, percebe-se que as marcas, na maioria das vezes, buscam apenas a exposição. Fleury afirma que exposição é algo muito legal, mas pode não trazer nenhum resultado e não dá garantia de maiores vendas ou que a marca será lembrada. Segundo o pesquisador, hoje, as empresas investem em programas de fidelidade buscando a lealdade dos clientes. De acordo com o estudo, o torcedor pode ser uma vantagem competitiva, já que a lealdade ao time já está estabelecida: “É interessante observar que, hoje em dia, fazemos uma série de trocas na nossa vida, mas são raras as pessoas que trocam de time”. Essa relação é muito importante para as empresas e sai muito mais barato se elas investirem nessas pessoas que já estão com a lealdade formada e ter como única tarefa transferi-la do time para a marca.

Metodologia e resultados

Para verificar essa hipótese, o pesquisador utilizou duas teorias já existentes: a teoria de transferência de imagem, que diz que as marcas se associam a eventos e times buscando trazer para si os aspectos positivos dos patrocinados, e a Teoria do Equilíbrio, que diz que as pessoas buscam equilíbrios e esses equilíbrios estão baseados em relações sociais, ou seja, no âmbito das empresas, a ideia é que se as pessoas são leais ao time, é mais fácil gostar da empresa que patrocina esse time. Mas se essa empresa patrocina o rival e a pessoa odeia o rival, então é mais difícil que ela goste da empresa.

Com base na metodologia de equação estrutural, o pesquisador desenvolveu um questionário com 83 itens validado por 18 professores nacionais e internacionais. O objetivo era mensurar a lealdade e cada item, que correspondia a uma pergunta do questionário, media aspectos referentes à lealdade. Na amostra, obteve-se respostas de grande parte do território nacional apenas um estado não teve correspondentes. Poderiam participar qualquer pessoa que declarasse torcer para um time de futebol brasileiro não precisava ser brasileiro ou morar no Brasil. A amostra final continha cerca de 800 respostas que atendiam aos requisitos: torcer para um time brasileiro e completar todo o questionário.

Ao medir a lealdade com as marcas patrocinadoras, o estudo levou em consideração três fatores: atitude (predisposição à marca), congruência (relação dos produtos da marca com o patrocínio) e percepção (o quanto a pessoa percebe a marca como sendo boa ou não). Observou-se que não há influência de nenhum desses fatores na relação direta de transferência de lealdade dos times para as marcas, resultado que se relaciona com a Teoria do Equilíbrio.

Entretanto, para ser transferida, a lealdade precisa ser trabalhada. O pesquisador afirma que existe, atualmente, um problema de gestão, já que os times ainda não entendem essa relação de lealdade e não sabem do poder que possuem. “A nossa intenção é mostrar para o mercado que essa relação pode ser melhor trabalhada e que existem outros aspectos que podem ser explorados no patrocínio, além da simples exposição da marca na televisão”. De acordo com Fleury, o torcedor é único e raro: “Os times precisam parar de ver o torcedor como simplesmente um torcedor. O torcedor é, na verdade, um coproprietário do time”.

Dessa forma, os patrocinadores precisam começar a refletir quando forem buscar quem patrocinar, atentando-se não só a quem dá mais exposição, mas quem tem uma capacidade maior de transformar a lealdade do torcedor ao time em uma lealdade à marca: “É preciso transformar aqueles coproprietários em embaixadores das marcas patrocinadoras, porque é isso que as empresas querem, pessoas que as defendam”. Um torcedor de futebol que defende o seu time tem muito mais chance, se bem trabalhado, de defender as marcas patrocinadoras.

Segundo o pesquisador, é possível fazer uma inferência de que sim, a lealdade tem capacidade de ser transferida, mas é preciso criar processos para que essa transferência aconteça. A pesquisa não aponta quais seriam esses processos, mas o estudo não pretende parar, já que o objetivo é continuar estudando essa relação da lealdade dos torcedores com as marcas parceiras e tentar tornar isso uma teoria, a Teoria da Transferência de Lealdade: “A ideia é estudar esse processo de transferência de lealdade para fazer disso uma teoria e isso leva muito tempo, porque precisamos observar os resultados ao longo de anos”.

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