Normalmente, só temos conhecimento da política internacional de um governo federal. No entanto, cada estado, província, município e cidade podem ter sua própria política de atuação externa e entre estados.
Buscando, unir duas áreas de interesse – políticas públicas e relações internacionais – a doutoranda, Graziela Cristina Vital, estudou as diplomacias entre cidades, por meio de um estudo comparativo entre as políticas externas subnacionais de São Paulo e de Toronto, de 2001 a 2004.
Durante esse período, a USP firmou um edital de cooperação com a Universidade de Toronto, o que permitiu com que a pesquisadora pudesse viajar a cidade e entrevistar ex-prefeitos, vice-prefeitos e vereadores, de modo a conseguir material suficiente para uma análise aprofundada. A escolha de Toronto, além do edital, também insere-se no seu objetivo de pesquisa que era comparar uma cidade de um país em desenvolvimento (São Paulo) com uma de um país desenvolvido.
Diferentemente da opinião do senso comum, a pesquisadora observou que a política externa subnacional de São Paulo está mais avançada do que em Toronto, cidade cosmopolita localizada em um país mais desenvolvido. Essa disparidade envolve principalmente o nível de institucionalização dessas políticas, foco de sua pesquisa.
Em São Paulo, existe desde 2001, uma secretaria internacional centralizada e destinada apenas a promover essas relações. Ao longo dos governos Serra, Kassab e Hadadd essa ainda foi expandida tanto em número de recursos e verbas como de funcionários. Enquanto em Toronto, não existe um órgão especializado unicamente nisso, as estratégias de relações externas estão difusas no aparato público, divididas em cerca de cinco departamentos.
Essa diferença deve-se ao foco das relações externas, o qual é influenciado em três fatores – tipo de federalismo, níveis de desenvolvimento socioeconômico e perfil do mandatário. Toronto e São Paulo podem ser considerados estudos de caso, por serem representativos desses três aspectos levantados acima.
Cidades localizadas em países menos desenvolvidos tendem a focar suas estratégias internacionais na troca de experiências ou na intensificação de relações políticas. Para São Paulo, por exemplo, ainda em processo de urbanização caótico e desregulado, o câmbio de boas práticas de políticas públicas de infraestrutura, transporte e saúde de cidades em países desenvolvidos são ótimas medidas de cooperação.
No entanto, a pesquisadora também observou que o perfil partidário ideológico tanto do prefeito como do secretário de relações internacionais das cidades influi no cerne da política adotada. Assim, governos mais identificados com a esquerda como o de Marta e de Haddad, as relações externas estavam mais voltadas a fomentar relações políticas com outras cidades, além da troca de boas práticas.
Já nos governos Serra e Kassab, considerados de direita, a pauta econômica é muito mais forte, afirma Graziela. A Secretária de Relações Externa de São Paulo por meio do contato com consulados, câmaras de comércio ou mesmo direto com a empresas e bancos de organizações internacionais (FMI, Banco Mundial) consegue trazer empresas para sua cidade, assim como investimentos e, inclusive, financiamento de projetos sociais. No governo Marta, a UE e a Ilê de France financiaram o Nós da Periferia, programa de qualificação profissional para a população carente do centro da cidade de São Paulo.
Em contrapartida, cidades localizadas em países desenvolvidos como o Canadá não possuem interesse em trocas de políticas públicas, pois grande parte dessas problemáticas mais estruturais já foram superadas. Desse modo, os diversos departamentos que compõem parcialmente as relações internacionais de Toronto preferem se dedicar ao aumento do vínculo econômico com outras cidades. O Invest Toronto, portanto, é o departamento mais forte das estratégias internacionais, cuja função é promover Toronto no exterior para atrair novos negócios.
Além disso, no Canadá as províncias têm certa autonomia, mas nada comparável ao federalismo brasileiro, no qual as cidades desde da Constituição de 1988 não enfrentam nenhum impedimento dos entes federais para uma atuação internacional. No caso canadense, cada cidade é considerada “creatures of the province”, o que significa as cidades não possuem nenhuma autonomia sem a anuência a priori das províncias. Isso explica, também, a dificuldade da institucionalização das relações externas subnacionais de Toronto.
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