Indígenas Apiaká e arqueólogo do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP realizam pesquisa em conjunto

Trabalho arqueológico serviu como conexão da comunidade com seu passado e presente

Pintura rupestre encontrada em um dos sítios arqueológicos (Foto: Luis Alvarenga)

A Terra Indígena (TI) Apiaká do Pontal e Isolados, localizada no norte do Mato Grosso, é uma área de mais de 980 mil hectares habitada por populações ancestrais, em sua maioria da etnia Apiaká.

Luis Vinícius Sanches Alvarenga, agora mestre em arqueologia pelo Museu de Arqueologia e Etnologia da USP (MAE), já trabalhava na área de arqueologia desde sua graduação, tendo seu primeiro contato com o povo Apiaká em 2017. A convite de um amigo que trabalhava na ONG indigenista Operação Amazônia Nativa (OPAN), ele foi à TI para desenvolver um trabalho na bacia do Rio Juruena sobre os locais sagrados para vários povos da região.

Para seu mestrado, sua pesquisa foi fundamentada na arqueologia colaborativa, a qual, como o nome indica, envolve a produção de conhecimento acadêmico arqueológico com a colaboração e, sobretudo, o direcionamento pautado pelos próprios indígenas. “Eles sabem porque a arqueologia é importante para a cultura deles, e eles querem conhecer seu território. Então eles propõem o projeto e eu entro colaborando”, explica Luis.

Esse meio de pesquisa auxilia as pessoas a terem acesso a uma história que não se limita ao passado. Assim, elas podem determinar o que aqueles sítios e vestígios arqueológicos com os quais convivem significam para elas.

O pesquisador destaca a autonomia da comunidade nesta forma de produção de conhecimento: “Não cabe a mim falar: ‘olha, de acordo com o meu estudo essa peça não é Apiaká’. É como se você estivesse tentando legitimar ou não o fato de eles estarem ali”.

A região apresenta uma grande diversidade de sítios arqueológicos como pinturas rupestres, fragmentos de cerâmica e outros vestígios de antigas aldeias. Além de marcadores na paisagem reconhecidos pelos indígenas como parte de sua trajetória histórica, como rios, serras e montanhas, por exemplo.

Assim como essas evidências materiais, as fontes coletadas pelos relatos orais desempenham um papel fundamental para o estudo arqueológico e entendimento do povo Apiaká, sobretudo para compreender sua diáspora e seu retorno.

A TI é perpassada por diversos rios, como o grande rio Juruena (Mapa: Terras Indígenas no Brasil)

Expulsão e retomada

Desde o século 19, os Apiaká passavam por um processo de expulsão e genocídio. Segundo sua oralidade, no começo da década de 1920, por conta dos anos de conflitos com seringueiros e surtos de doenças, a maior parte decidiu migrar para outras regiões, ao passo que alguns grupos familiares resistiram por lá.

E ainda houveram pessoas que preferiram cortar contato com a comunidade e se isolar em pontos mais remotos do território. A presença de isolados na região foi fundamental para se avançar o processo de demarcação.

A partir do ano 2000 eles iniciaram a retomada de seu território tradicional.  Em sua primeira viagem para a TI, o arqueólogo ficou na Aldeia Matrinxã, uma ocupação que havia sido recém inaugurada e que se tornou um marco importante para o reconhecimento da região, tanto perante o Estado quanto para o próprio povo.

No dia 5 de setembro de 2024 o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) assinou uma portaria declaratória reconhecendo a região como território indígena. Feita a demarcação física da área pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), com a disposição de placas e marcos indicando os limites da terra, a área poderá então ser definitivamente homologada.

O arqueólogo valoriza a luta dos povos originários pela conquista de seu reconhecimento histórico e sua resistência na atualidade: “Eles vão reivindicar e vão conseguir, porque isso é deles. Eles resistem há pelo menos 500 anos de dominação e vão continuar resistindo e existindo”.

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