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Imaginar quais eram os costumes e crenças de um povo que viveu séculos atrás é uma tarefa simples para mente humana. Porém, comprovar teorias utilizando fragmentos de antigos objetos é um trabalho extenso e com desfechos inesperados. A arqueóloga Juliana Figueira da Hora, em sua tese de doutorado para o Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da USP, analisou figuras negras em cerâmicas encontradas na ilha de Tasos e descobriu a ligação entre mulheres tasienses e o culto à deusa Ártemis. “Minha pesquisa foi uma metamorfose, não esperava por isso, a cerâmica falou comigo”, disse a pesquisadora.
O trabalho tinha como objetivo inicial estudar as cerâmicas do período arcaico provenientes da ilha de Tasos, situada ao norte do Mar Egeu. De acordo com Juliana, naquela região “foram escavados e retiradas diversas figuras negras peculiares, com formatos variados”. Com esse material em mãos, ela se sentiu conduzida em elaborar a pesquisa sob outro ponto de vista: “são mil possibilidades, eu não quis fazer um catálogo dos fragmentos, eu queria comparar com outros materiais. Queria que a trajetória fosse material, sem precisar ir para a parte histórica que está escrita.”
As figuras negras encontradas em vasos chamados lêcanas não eram pinturas feitas pelos artesãos, a decoração provinha da queima do barro. Comparando com os costumes atuais seria como a moda daquele período. Todos queriam ter em suas casas objetos com essas ornamentações, principalmente pela sua característica religiosa.
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Lêcanas eram peças tipicamente femininas utilizadas como ofertas em cultos. Essa ligação entre objeto e pessoa foi possível ser observada pela quantidade de itens encontrados em “lugares que as mulheres frequentavam. A dinâmica era de oferendas e devotos dentro do universo feminino”, afirma a arqueóloga. Além dos vasos, bens pessoais eram oferecidos a Ártemis ― protetora das meninas, mulheres e da cidade.
Grande foi a quantidade de informações coletadas através das análises e de documentos: “fiz um banco de dados muito amplo, com mais ou menos 800 fichas”. Para Juliana, a maior dificuldade era ter permissão para realizar a pesquisa, “eu precisava da autorização da Escola Francesa, que detém os direitos dos materiais, e eu só podia analisar uma amostra dos fragmentos”. A arqueóloga foi auxiliada por uma professora do MAE para conseguir ter acesso aos objetos. Atualmente, graças ao aumento de projetos feitos por brasileiros nessa área de estudo, o acesso aos itens está cada vez mais fácil, possibilitando uma expansão para a pesquisa do Brasil.
Durante todo o projeto a cerâmica foi a chave para esclarecer questões até então pouco discutidas. O ateliê local de figuras negras tasienses demonstrou ser inovador em suas técnicas e decorações e, muito além disso, foi possível adentrar na esfera social daquele povo para desvendar qual o tamanho da influência grega em suas práticas culturais.
A ilha de Tasos no período arcaico era um local importante com domínios sob outras áreas. Suas características particulares, desde os rituais e habitações, até cultura material demonstram traços da cultura grega que foi agregada às práticas regionais. Porém, a região “passou por um momento de tirania. Atenas dominou Tasos e acabaram as figuras negras”, disse a pesquisadora. Com a influência de outros costumes, novas ornamentações foram produzidas.
A pesquisadora Juliana da Hora sempre teve interesse pela Grécia, e no MAE trabalhou no Laboratório de Estudos Sobre a Cidade Antiga (LABECA). Foi no doutorado que ela conseguiu esquematizar um projeto acerca da cerâmica tasiense e sair do Brasil, com apoio de professores, para trabalhar com essa materialidade. A pesquisa além de esclarecer lacunas na história, também possibilita caminhos para pesquisadores brasileiros terem acesso aos materiais e realizarem diversos estudos naquela região.
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