A máxima de que os profissionais do campo, em sua maioria, são pessoas mais velhas que utilizam conhecimento passado de geração em geração para produzir se mostra cada dia mais incorreta. Nos últimos anos, o agronegócio tem se destacado como espaço para profissionais jovens e mais especializados — e a mudança se deve, principalmente, à inserção de tecnologia na produção agrícola, pecuária e agroindustrial.
De acordo com dados do último boletim Mercado de Trabalho no Agronegócio Brasileiro, criado pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) junto do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da USP, o segundo trimestre de 2024 bateu o recorde de número de brasileiros em atividades relacionadas ao agronegócio, com cerca de 28,6 milhões de pessoas no setor. O aumento de 2,3% em relação ao mesmo período do ano anterior não surpreendeu apenas pela quantidade, mas também pelo tipo de qualificação da mão de obra.
Segundo o estudo, houve um aumento no número de profissionais do campo com carteira assinada e com nível de instrução que abrangem o ensino médio e superior. A tendência vem de alguns anos: já no segundo semestre de 2023, um levantamento do Centro de Estudos do Agronegócio da Fundação Getulio Vargas (FGV) mostrou que, nesse período, o setor chegou a 5,7 milhões de pessoas em vagas formais, o que rendeu a maior taxa de formalidade desde 2016.
O aumento da qualificação da mão de obra está ligado com a crescente presença de tecnologia no campo, gerada principalmente pela implementação da agricultura de precisão. O uso de ferramentas e maquinários modernos cria um mercado de trabalho com diversas oportunidades para jovens formados em áreas convencionais do agro, como agronomia, e setores que são novidades, como ciência de dados, designer de máquinas e pilotagem de drones.
Novos trabalhos do campo
Apesar de ter sido introduzida no Brasil já na década de 1990, a prática da agricultura de precisão — que consiste no uso de um sistema de gerenciamento baseado em variação espacial e temporal para produzir — só teve avanços significativos em território nacional a partir dos anos 2000. Hoje, com as tecnologias recentes, o modelo tem dado resultados ainda mais positivos e demanda profissionais com maior nível de especialização.
Alberto Bernardi, pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste, destaca os conhecimentos necessários para atuar na área: “Atualmente, a agricultura de precisão tem como base o uso de GPS, automação de máquinas, drones, inteligência artificial, e análise de dados para otimizar o uso de recursos (como água e solo) e insumos (fertilizantes e pesticidas)”, o que, conforme Bernardi, reduz custos de produção e minimiza o impacto ambiental.
O conceito de Internet das Coisas (IoT), popularmente conhecido pelos eletrodomésticos inteligentes, também conquista espaço no agro. “A Internet das Coisas está sendo cada vez mais utilizada na integração de dispositivos conectados à internet para monitorar e controlar equipamentos agrícolas, colheitas e a produtividade, reduzir os custos, promover a sustentabilidade e acessar mercados”, afirma o pesquisador.
Entre as novas profissões do campo, áreas que envolvem o uso de dados e tecnologia têm se destacado no mercado. Em 2021, o estudo Profissões Emergentes na Era Digital, realizado pela Agência Alemã de Cooperação Internacional (GIZ), o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), revelou algumas das profissões com potencial para gerar milhares de vagas ao longo dos próximos dez anos: na lista, estão presentes ocupações como cientista de dados agrícola, designer de máquinas agrícolas, engenheiro agrônomo digital, técnico em agricultura digital e operador de drones.
Bernardi define a flexibilidade como uma das características essenciais para atuantes na área: “Tem que ter flexibilidade para interagir com outras áreas como informática, eletrônica e robótica. Ter curiosidade para conhecer e entender onde estas tecnologias podem ser úteis vai facilitar muito a atuação e abrir mercado de trabalho”.
Ao todo, o Profissões Emergentes na Era Digital estipula que 148,7 mil vagas de emprego relacionadas à Agricultura Digital ficarão vazias por falta de profissionais qualificados. O número pode ser explicado pela baixa oferta de cursos de formação especializada relacionados à agricultura digital: na época do levantamento havia 23 cursos cadastrados na plataforma do Ministério da Educação, com cerca de 2.250 vagas oferecidas anualmente aos estudantes.
A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) é uma das fomentadoras da formação especializada na área do agro no Brasil e oferece diversos cursos de capacitação para produtores rurais e profissionais do campo, além de investir em pesquisas que levam novas tecnologias para o meio rural.
Para o pesquisador Alberto Bernardi, a modernização e a inovação dos processos de trabalho do agro são a chave para reverter o cenário de déficit de mão de obra. O auxílio tecnológico, aponta o profissional da Embrapa, pode atrair mais jovens para atuar nas áreas especializadas. “A tecnologia certamente poderá atrair e reter mais pessoas interessadas no trabalho no campo, já que ela torna o trabalho mais eficiente, racional e menos pesado”, diz.
Carreiras promissoras
Jovens que buscam ingressar em um mercado no qual a qualificação é o fator decisivo para o sucesso encontram nos setores do agronegócio a oportunidade perfeita. Além da baixa concorrência em vagas que demandam especialização, o salário competitivo é outro forte atrativo.
O Guia Salarial de 2024 da Robert Half, empresa especializada em recrutamento que é referência sobre tendências de vagas, definiu a remuneração das profissões do futuro do agro, que podem chegar a até R$ 25 mil, quase vinte vezes mais que o salário mínimo vigente.
Conforme o Guia, o salário de um gerente de fazenda pode variar de R$ 19 mil a R$ 25 mil, o de cientista de dados agrícolas entre R$ 8 mil e R$ 12 mil e o de operadores de drones, na faixa de R$ 5,5 mil a R$ 9 mil.
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