Observatório de Remoções estuda conflitos gerados por estas situações nas cidades

Criado em 2012, grupo de pesquisa reúne equipe formada por pesquisadores de diversas universidades brasileiras

Cidade de São Paulo é o principal objeto de pesquisa do grupo - Imagem: Marcos Santos/USP Imagens

As remoções habitacionais são um conflito que atinge as metrópoles cotidianamente. Pesquisas da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP estimam que entre 2017 e junho de 2023 quase 34 mil famílias na região metropolitana de São Paulo foram afetadas por essa política. Devido a esta situação, o Laboratório Espaço Público e Direito à Cidade (LabCidade), da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP criou, em 2012, o Observatório de Remoções, projeto que realiza o mapeamento de remoções e conflitos de aluguel e de posse em regiões metropolitanas.

Além do LabCidade, outros cinco grupos de pesquisa contribuem com o projeto: Laboratório Praxis, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Laboratório de Estudos da Habitação (Lehab), da Universidade Federal do Ceará (UFC), Lugar Comum, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Grupo de Pesquisa Labá: Direito, Espaço & Política, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Observatório de Conflitos Fundiários do Instituto das Cidades, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Laboratório de Justiça Territorial (LabJuta) e Laboratório de Estudos e Projetos Urbanos e Regionais (Lepur), ambos da Universidade Federal do ABC (UFABC). Atualmente, o projeto principal do grupo é o Mapeamento das Remoções e das Ameaças de Remoções, que agrega e analisa periodicamente esses conflitos na região metropolitana de São Paulo, divulgando dados atualizados em seu site.

O projeto

Para o pesquisador Matheus Henrique da Silva Martins, coletar informações e acompanhar esses processos é desafiador, tanto pela invisibilização quanto pela fragmentação cada vez mais frequente. “Não é do interesse desses agentes mapear aqueles que são impactados por isso, muito pelo contrário. O mapeamento vai se tornando cada vez mais difícil porque esses processos também são cada vez mais fragmentários, assim como toda a política urbana”, afirma. “Os grandes projetos urbanos que víamos antes, que provocavam deslocamentos em massa, hoje se dão sobretudo em menor escala (especificamente em São Paulo), guiados por agentes de mercado que vão provocando remodelações e remoções pontuais mas que, vistas no todo, provocam um fenômeno de transitoriedade permanente sobre populações vulneráveis”, explica. “Chegar até essas pessoas exige uma grande rede, com participação de múltiplos agentes e articulação territorial, o que também é difícil.”

Para superar os desafios enfrentados na pesquisa, o grupo conta com uma equipe interdisciplinar de pesquisadores que estudam diferentes áreas, como urbanismo crítico, economia política, direito, sociologia e cartografia, que possibilitam a aplicação de diferentes metodologias ao projeto. Matheus aponta que a principal é a prática do “Mapeamento Colaborativo”, em que acontece a busca ativa por denúncias de remoções coletivas. “Fazemos isso por meio de uma rede de parceiros que inclui movimentos sociais, órgãos públicos como a Defensoria Pública e entidades da sociedade civil, além de grupos de Whatsapp, formulário de denúncias e clipping de notícias de remoções”, conta.

Atualmente, as análises do grupo estão voltadas para a dinâmica das remoções no contexto pós-pandemia, visto que durante a crise sanitária de Covid-19 a Justiça proibiu a ocorrência de despejos – medida que foi revogada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2022, dando origem a um “regime de transição”. Segundo Martins, as observações iniciais junto ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) ainda indicam conflitos: “O TJSP tem oferecido poucas soluções às disputas e quando essas ocorrem são sobretudo privadas entre as famílias ameaçadas e os agentes da remoção. Numa leitura mais geral, também temos observado cada vez mais o ‘risco’ como um fator mobilizado para efetivar a remoção, muitas vezes sem um esforço de minimizar ou eliminar o risco, mesmo quando isso pode ser feito”, Os resultados da observação sobre a etapa de “transição” pós-pandemia estão previstos para serem divulgados no balanço semestral de dezembro de 2023.

Além do Observatório de Remoções, o LabCidade ainda tem quatro projetos em andamento relacionados ao estudo da regulação, produção imobiliária e aluguel em São Paulo. Para o pesquisador o mapeamento de remoções ajuda a repensar as dinâmicas urbanas relacionadas à habitação e as políticas públicas que as regulamentam: “Acredito que o mapeamento evidencia a insuficiência das políticas postas em curso para sanar as necessidades habitacionais das populações de menor renda e, muitas vezes, o seu agravamento justamente por conta destas políticas. Evidenciar isso e como estas ocorrências deixam um rastro de despossuídos, que além de não acessarem essas políticas são impactos por elas, é um caminho para pensarmos em outros formatos possíveis”.

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