Aspecto social dos trabalhos verdes normalmente ignorado é tema de mestrado na USP

Fonte: Reprodução

Conceitualmente criados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), os chamados trabalhos verdes seriam aqueles que visam a preservação ou restauração do meio ambiente, assim como propiciam condições decentes de trabalho. A autora do mestrado A proteção do trabalhador nos trabalhos verdes, realizada pelo Departamento de Direito Trabalhista da Faculdade de Direito da USP, Olívia Pasqualeto, alerta, no entanto, para a existência de “falsos” trabalhos verdes, em razão da vulgarização do tema pelo green marketing.

“Muita gente fala da vantagem dos combustíveis de matriz energética limpa,por exemplo, mas o aspecto social dos trabalhos que beneficiam o meio ambiente é deixado de lado”, explica a pesquisadora sobre os motivos de ter se envolvido com o estudo dos trabalhos verdes.

Foram analisadas 15 definições de “trabalhos verdes”, além da oficial da OIT. Muitas empresas acabam criando o próprio conceito para que possam se enquadrar e usar o termo publicitariamente, nem sempre se preocupando com similaridades do que seria um trabalho verde de fato. A definição que mais se distanciou da adotada pela OIT foi a da Sociedade Americana de Energia Solar, que indica que empregos verdes são apenas aqueles que envolvem energias renováveis. “É um exemplo muito mais restritivo que não leva em consideração se tem pessoas trabalhando em situações análogas a escravidão, se acontecem muitos acidentes ou se são engenheiros bem-remunerados, em um ambiente adequado. Para eles qualquer situação envolvendo energia limpa seria um trabalho verde”.

O motivo para que a parte social dos trabalhos verdes seja esquecida se deve, além da falta de entendimento do termo, com cada um criando uma caracterização, ao fato de que a área ligada à sustentabilidade é estudada em geral de maneira técno-científica, procurando avanços de cunho tecnológico. As ciências sociais, como a sociologia ou mesmo o direito, acabam negligenciando o estudo do trabalho sustentável.

A análise feita na dissertação, um dos primeiros trabalhos na área, aponta que, na maioria dos casos em que o senso comum chama de verde, as condições decentes de trabalho acabam não sendo atingidas. “Muitas vezes [os trabalhos verdes] estão envolvidos com tecnologias práticas novas, desconhecidas, que demandam um estudo, uma preocupação, para evitar que acidentes inesperados aconteçam. Essas novidades ainda são uma barreira. Além disso, esses trabalhos que poderiam ser verdes, como catadores de lixo, são realizados de maneira muito rudimentar em países em desenvolvimento como o Brasil. Os riscos são muito maiores do que quando a atividade é mecanizada”.

A expressão meio ambiente não se limita ao natural, engloba também o ambiente artificial, cultural e do trabalho. “O meio ambiente do trabalho é uma das faces do meio ambiente e a proteção dele está diretamente ligada a proteção do trabalhador. Isso é, eliminar risco de acidentes, por exemplo, proporcionar mobília adequada para que se possa digitar sem desenvolver transtornos de ação repetitiva”. Dessa forma, a dissociação dos empregos verdes e decentes seria quase impossível. As profissões urbanas podem ser considerados trabalhos verdes, não tendo que ter relação em si com a natureza.A engenharia civil e a arquitetura têm crescido muito na direção da sustentabilidade, muitas vezes se enquadrando mais facilmente como trabalho verde do que outras atividades potencialmente verdes mais óbvias, devido ao pré-conhecimento das tecnologias da área e ao refinamentos das atividades.

A apropriação do termo pelo green washing (tradução literal: lavagem verde) é extremamente perigosa pois aposta no apoio cego da sociedade à tudo aquilo que parece verde, sem que haja uma preocupação em determinar a veracidade do rótulo. Esse encorajamento desmedido auxilia na perpetuação de condições ruins de trabalho em setores pouco desenvolvidos que estão protegidos por serem caracterizados como sustentáveis. “A OIT deveria ter uma maior pró-atividade em se comunicar com as outras organizações que manejam o tema, procurando divulgar mais claramente o que seriam realmente os trabalhos verdes, assim como programas educacionais e de incentivo interno nos países”.

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