
Segundo dados divulgados pela Unesco, em 2022, no relatório State of the Ocean Report 2022, os investimentos mundiais nas ciências oceânicas são baixos e no Brasil estão entre os menores. Tal cenário, além de prejudicar a execução de pesquisas científicas, leva a uma menor preservação dos ambientes aquáticos devido à falta de conhecimento.
Em 2022, porém, o Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo (Cebimar-USP) inicia um projeto de expansão de pesquisa, a partir da construção da primeira estação de mergulho científico no país. “[A estação] vai aumentar muito a nossa capacidade de operar com atividade de mergulho. Poderemos ter mais estudantes, pesquisadores, fazer mais atividades. Trará muitos benefícios para a pesquisa marinha aqui do Brasil”, afirma Hudson Pinheiro, coordenador do projeto e cientista do Instituto, especialista em mergulho técnico.
O que são os mergulhos científicos e técnicos?
A atividade de mergulho, quando realizada com um equipamento de mergulho completo (equipamento Scuba), é chamado de autônomo, pois permite ao indivíduo respirar debaixo d’água. Essa técnica é utilizada tanto para turismo e atividades recreativas quanto para mergulhos científicos e técnicos. Quando essa atividade é utilizada por pesquisadores, com objetivo de coleta de dados, no campo, ela se torna um mergulho científico.
Já o mergulho técnico é realizado em maiores profundidades, necessitando de maior treinamento e aprimoramento da técnica. Isso porque, com o aumento da pressão, os gases do corpo humano são comprimidos e podem tornar-se tóxicos ao organismo. O oxigênio (a partir de 60 metros de profundidade), pode causar um efeito tóxico agudo, levando a uma convulsão e afogamento, por exemplo. O nitrogênio, a partir de 30 a 40 metros, começa a ter efeito narcótico, que pode provocar alucinações.
Como solução, é utilizada uma mistura de gases diferenciada: diminui-se a quantidade de nitrogênio e oxigênio adicionando gás hélio. “Assim é possível atingir profundidades maiores e permanecer nelas por mais tempo. Com o equipamento que adquirimos, temos capacidade de realizar mergulhos de até 150 metros de profundidade.” Além disso, o retorno à superfície é feito com paradas descompressivas para que os gases diluam no sangue novamente e sejam liberados pela respiração.
Devido aos riscos associados à prática, como utilização de gases errados, mudanças ambientais repentinas ou falhas no equipamento, o profissional deve ser altamente qualificado. Hudson também destaca a importância do foco, do controle emocional e do senso de responsabilidade do mergulhador: “É o tipo de trabalho que não pode ter pressão e nenhum tipo de obrigação, tipo ‘você tem que ir até certa profundidade, tem que mergulhar naquele ponto e coletar tal peixe’, não é assim. Tem que estar tudo muito certo e as condições do mar ideais.”
Primeira estação do Brasil
Localizada próxima à praia, a estação de mergulho técnico começou a ser construída em 2022, um projeto financiado pelo Auxílio Jovem Pesquisador em Centros Emergentes, da Fapesp.
Contará com equipamentos para recarga de cilindros de mergulho (compressor e cascata), que ampliam a potência da estação de recarga: “Hoje em dia eles demoram cerca de meia hora para recarregar um cilindro. Com uma estação com cascatas de ar comprimido, é possível encher em até cinco minutos.” Ademais, contará com um local para armazenamento de todo equipamento relacionado ao mergulho científico e técnico, como coletes, roupas de mergulho e cilindros de ar.
Será a primeira estação de mergulho técnico no Brasil, uma das poucas no mundo, e proporcionará a logística necessária para pesquisadores de todo o país.
A relevância para a ciência brasileira
Pinheiro relembra suas expedições, realizadas com mergulho técnico: “Quando a gente passa dos 100 metros de profundidade, temos uma média de duas novas espécies descobertas por hora de exploração. Isso mostra que ainda há muito a ser explorado e catalogado”.

De fato, a exploração dos ambientes marinhos ainda reserva muitos locais não descobertos, com espécies desconhecidas. E, a partir do conhecimento, há um enorme potencial para o desenvolvimento da ciência e da preservação da biodiversidade brasileira. “As áreas protegidas e o manejo são voltados principalmente para as áreas rasas, que temos mais conhecimento. Então, todo o ambiente mais profundo, que hoje serve como base para as atividades de pesca, acaba completamente desprotegido e eles possuem uma biodiversidade completamente diferente. Assim, estamos tentando chamar atenção para isso”.
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