ONG Casa 1 fornece abrigo para jovens LGBTQ na região central de São Paulo

Pesquisador da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP destaca que acolhimentos são mais eficientes por focarem em um público menor, diferentemente das medidas generalistas dos órgãos públicos

Para pesquisador, equipamentos de acolhida para populações marginalizadas funcionam melhor quando destinados a um número menor de pessoas — Fotomontagem de Guilherme Castro com imagens de Reprodução/Casa 1 e TextureLabs

A Casa 1 é uma organização não governamental que atua no bairro da Bela Vista, região central da cidade de São Paulo. A iniciativa contempla um espaço de acolhida para pessoas LGBTQ expulsas de casa, em razão de sua sexualidade ou identidade de gênero.

Inaugurada em 2017, a residência — que agora se divide em três polos — atende atualmente três mil e quinhentas pessoas. No local, há um centro cultural com atividades socioeducativas e uma clínica para atendimento psicoterápico. Esses elementos se concentram numa região em que o cuidado e a socialização se relacionam pela proximidade e criam um fluxo de serviços e pessoas.

Segundo Artur de Souza Duarte, pesquisador e mestre pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, a Casa 1 é um projeto único no Brasil, já que consegue aliar moradia, cultura, formação e saúde, abarcar pessoas em situação de vulnerabilidade e fornecer alternativas para que elas retomem a autonomia de suas vidas.

Posição dos polos da ONG no mapa de São Paulo – Foto: Reprodução/Artur de Souza Duarte

Para o pesquisador, o projeto se diferencia por ser um ponto de ancoragem para a população da região. Além dos acolhidos do espaço, ex-moradores frequentam e auxiliam nas dinâmicas dos três setores — residência, cultura e saúde — como passam a morar no entorno. Cria-se, por meio da variedade de ações, uma rede de apoio orgânica.

Através de etnografia, participação direta e estudo de caso, Duarte identificou que a atuação do poder público no Bixiga, como é casualmente chamado o bairro, era ineficiente para contemplar a variedade de pessoas vulneráveis.

Conforme pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), 61% das pessoas que se declaram LGBTQ e estão em situação de rua sofreram algum tipo de violência física em São Paulo no ano de 2019. O levantamento ainda ressalta a possibilidade de aumento nas ocorrências.

Artur de Souza Duarte – Foto: Reprodução/LinkedIn

Em razão disso, a Casa 1 desenvolveu um sistema de recorte para melhor atender ao público pretendido: há uma triagem realizada pela equipe de saúde que seleciona jovens de 18 a 25 anos, autodeclarados LGBTQ, com enfoque nos perfis socioeconômicos e identitários.

De acordo com Duarte, o principal desfalque nas políticas de Estado para atender essa população são as medidas generalistas. “Não adianta fazer uma política que seja generalista e atenda todos, entre aspas, de forma igual”, diz. “Essas pessoas [LGBTs vulneráveis] têm diferentes graus de necessidade e de vulnerabilidade.”

Para ele, equipamentos de acolhida para populações marginalizadas funcionam melhor quando destinados a um número menor de pessoas. Isso possibilita um trabalho mais individualizado e qualitativo, com um acompanhamento próximo e humanizado.

Entre as referências de iniciativas similares e que deram certo, Duarte destaca as organizações francesas Pôle Jeunesse (Polo Juventude) e Le Refuge (O Refúgio), que se sobressaem pelas estratégias modernas e de conciliação com as famílias, além de seus números expressivos.

O pesquisador destaca que, embora o projeto siga os passos das referências estrangeiras, ainda é uma medida paliativa. Diferentemente das organizações já bem estruturadas e que recebem incentivo fiscal do governo, a Casa 1 se mantém por meio de doações individuais e pequenas colaborações privadas. Por conta disso, não há um fluxo abundante de caixa para ampliar e melhorar o complexo.

Outra questão apontada é o tempo em que o jovem pode permanecer na casa de acolhimento. O período ideal é de quatro a cinco meses, porque, segundo Duarte, “é muito difícil [para o jovem] estar pronto para a vida adulta. Uma parte consegue, mas outra não. E muitas pessoas têm demandas diferenciadas”.

Segundo o pesquisador, os órgãos públicos precisam aperfeiçoar suas medidas de assistencialismo e fornecer mais pontos de apoio e estruturas de acompanhamento a longo prazo — não somente medidas temporárias, como albergues e semelhantes.

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