A pesquisa de doutorado realizada pelo engenheiro agrônomo Paulo Henrique Bertucci Ramos elaborou um modelo de negócio que pretende auxiliar startups do ramo agrícola — também chamadas de agtechs — a atingirem um grau de desenvolvimento que as permitam ocupar um espaço consolidado no mercado e se tornarem rentáveis.
Paulo comenta que dentro das diversas categorias de startups, as agrícolas enfrentam maiores dificuldades de crescimento, principalmente pela resistência dos consumidores. “O agronegócio é uma área da economia que demora um pouquinho mais para absorver a tecnologia. É mais difícil você conseguir fazer com que um produtor entenda ou adote tecnologias importantes para o agronegócio.”
Baseado nisso, o estudo procurou entender porque algumas empresas do ramo conseguem atingir uma “escalabilidade” — termo utilizado para definir quando startups alcançam esse nível de crescimento estável e promissor —, enquanto outras permanecem estagnadas. “Essas que possuem escalabilidade, que conseguem mostrar para o agronegócio sua importância, têm uma estrutura diferente daquelas ainda em estágios iniciais”, explica.
O estudo elencou cinco elementos essenciais que permitem a escalabilidade das agtches: governança, alocação de recursos, acompanhamento de atividades, fomento ao capital humano, e maturidade do modelo de negócio.
“Não é só porque vou ter todos esses elementos que vou crescer, mas são pontos que acreditamos que as empresas têm que olhar e são pontos que essas empresas que já estão mais maduras no mercado tem muito característicos”, reitera Paulo.
O pesquisador comenta que agtches em escalabilidade possuem elementos de governança corporativos bem estabelecidos. Por exemplo, conselhos de administração, reuniões específicas para determinar para onde elas vão, como elas vão e treinamento da diretoria.
Paulo também explica a importância da “departamentalização”, em que cada pessoa é responsável por uma determinada atividade e é cobrada para isso. Em agtches que demoram a crescer isso ocorre de forma diferente, geralmente uma única pessoa atua em várias áreas e acaba não sabendo a real responsabilidade das suas atividades, dificultando o aprimoramento de tarefas específicas .
O modelo mostra ainda a relevância da valorização do capital humano, como elucida o pesquisador: “As pessoas são vistas nessas empresas como um ponto chave, um ponto de necessidade para o crescimento. Você tem investimentos em cursos, investimentos em palestras, enfim, um fomento do capital humano”.
Outro diferencial é que quando essas empresas começam a crescer, há a possibilidade dos próprios funcionários, ou pessoas que fazem parte da comunidade interna, de comprar ações da própria empresa. Isso estimula o desejo de desenvolver e contribuir para o crescimento das startups, comenta o doutorando.
E um último aspecto levantado pelo pesquisador é a maturidade do negócio: “Empresas que estão em escalabilidade já tem seu produto desenvolvido e geralmente sem necessidade de ajustes para entrega final. Então, ela vai para o produtor com aquele pacote tecnológico desenvolvido”. Já aquelas que não possuem seu produto totalmente determinado acabam perdendo tempo no desenvolvimento, em definir o produto final, ao invés de focarem em crescer.
O modelo elaborado por Paulo e seu orientador, o professor Marcelo Caldeira Pedroso, tem o objetivo de ser uma ferramenta prática que auxilie de maneira funcional os donos de agtches: “A gente fez um modelo gráfico e visual e a ideia é apresentar ele nesses eventos, em ambientes de inovação, para que as pessoas compreendam os aspectos que precisam olhar dentro de suas empresas para começar a ganhar tração e escalabilizar”, esclarece Paulo.
O arquétipo apresenta termos fáceis, com elementos que sejam entendidos por aqueles que tenham o mínimo de conhecimento sobre ecossistemas de inovação e modelos de negócio, priorizando a clareza, segundo o doutorando. A pesquisa completa está sendo divulgada no formato de artigos, dos quais um deles recebeu o Prêmio Milton de Abreu Campanário por ser o 3° artigo mais citado no ano de 2021 na Innovation and Management Review.
Considerando a importância do setor agrícola para o Brasil, Paulo manifesta um dos motivos que objetivaram a pesquisa. “ É muito importante você entender porque as startups nascem demasiadamente, mas porque só algumas conseguem crescer. E é um negócio que demanda um impacto muito grande dentro da balança comercial brasileira”. Segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Esalq/USP, a porcentagem de participação do agronegócio no PIB brasileiro nos últimos dez anos teve média de 23,4%.
A metodologia de pesquisa utilizada foi tanto qualitativa quanto quantitativa. Paulo realizou entrevistas com CEOs de agtches que estavam em escalabilidade pelo Brasil todo a fim de investigar os diferenciais dessas empresas. Depois da elaboração do modelo, ele retornou a conversar com essas pessoas para avaliar o estudo e realizar as modificações finais.
O doutorado faz parte do programa de pós-graduação em administração da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA), da USP, e foi defendido no dia 29 de março de 2022.
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