Geralmente, ao avaliar a eficiência de um sistema de saúde, é normal utilizar-se da sua eficácia e acesso a recursos para aferir a sua efetividade junto à população. Contudo, ao utilizar esse método, a avaliação da estrutura dos sistemas de saúde pelo mundo exclui componentes importantes que podem levar a melhorias e total aproveitamento deles.
Ao fazer a avaliação utilizando-se do conceito de equidade de acesso à saúde junto a eficácia, é possível ver disparidades nessas estruturas que vão além do aspecto técnico. A equidade é um princípio segundo o qual cada um é tratado “desigualmente na medida de suas desigualdades”, buscando igualdade de direitos levando em conta a desigualdade material.
A tese de doutorado de Simone Schenkman, pela Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, intitulada Avaliação de eficiência dos sistemas de saúde: o valor da equidade em saúde em equilíbrio com a efetividade, analisa a literatura relacionada aos métodos avaliativos de dos sistemas de saúde de diversos países para destacar as problemáticas que a falta da equidade ao classificar a efetividade de um sistema de saúde podem trazer.
“O objetivo é realmente poder verificar esse equilíbrio entre a eficiência, a equidade e a efetividade”, afirma a doutoranda. A tese aponta que políticas de austeridade fiscal e os processos de mercantilização da saúde entram em conflito com a garantia dos direitos de acesso.
Com as imposições geradas pelo sistema econômico vigente para ampliar a eficiência e efetividade dos sistemas de saúde, a equidade seria uma espécie de fator protetor em relação às consequências dessas medidas sobre a população. Assim, incluí-la nos princípios de avaliação permite que um quadro mais preciso sobre o funcionamento seja obtido.
Equalidade: igualdade frente à desigualdade
A amostragem utilizada pela tese levou em conta a rede de saúde de mais de 165 países para entender o papel da inequidade em criar dificuldades para a população. De acordo com a doutoranda, a pesquisa revelou que além da vertente econômica, a social interfere diretamente no acesso a um sistema de saúde igualitário.
Dessa forma, questões estruturais, como racismo ou marginalização de populações periféricas, por exemplo, se interseccionam com pontos importantes que facilitam o acesso à saúde, como investimentos na área. “Onde você tem mais iniquidade, em termos de educação, gênero e etnia, por exemplo, são exatamente os locais com os piores níveis de eficiência”, afirma.
De acordo com a pesquisadora, ao analisar fatores sociais em uma escala local, ficam mais nítidos os contornos da desigualdade no acesso à saúde. Ao afunilar o escopo analisado, é possível notar, ainda, como outros fatores aumentam a inequidade, entre eles a renda familiar, a educação e o próprio ambiente em que se vive.
Assim, a eficácia de um sistema de saúde deixa de estar nos recursos disponíveis para utilização no setor e passa a estar na forma como se consegue distribuí-los à população, de forma a beneficiar todos.
Simone exemplifica utilizando-se do sistema de saúde dos Estados Unidos, conhecido por possuir uma vasta rede de recursos de alta qualidade e que é totalmente privatizada. Como o acesso à rede de cuidados depende de poder econômico, aspectos discriminatórios na esfera social interferem nas possibilidades de obtenção desse poder, afetando diretamente as condições de vida e indiretamente o acesso à saúde.
Para Schenkman, além de restringir o direito à saúde da população, essa forma de categorização que não leva em conta a equidade de acesso impede que serviços de saúde, como é o caso dos Estados Unidos, atinjam seu pleno potencial. “A gente viu o quanto essas questões influenciam o resultado dos níveis de saúde e como a equidade consegue melhorar muito a eficiência e a efetividade”, conclui.
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