Nasa retoma explorações em Vênus após 30 anos

Anunciadas em junho, as missões espaciais para um dos planetas mais hostis do sistema solar devem acontecer ainda nesta década

Imagem: Filipe Albessu Narciso

No início de Junho, a Nasa anunciou duas missões para o planeta Vênus: DAVINCI+ e VERITAS. As viagens estão programadas para 2028 e 2030, respectivamente. É a primeira vez em mais de 30 anos que a agência espacial norte-americana decide realizar uma missão para o planeta mais brilhante do Sistema Solar. A Agência Espacial Europeia também anunciou sua própria missão a Vênus, a EnVision, preparada para o início de 2030.

Vênus é o planeta mais semelhante à Terra tanto em tamanho quanto em massa. No entanto, esses indicativos não impedem o planeta de ser um dos mais desafiadores à vida no sistema solar: com temperaturas em toda a superfície acima de 450°C, uma atmosfera composta em cerca de 90% por ácido sulfúrico e uma pressão atmosférica 90 vezes maior do que a da Terra, Vênus instiga cientistas com as suas características adversas.

O raio equatorial da Terra equivale a 6378 km e o de Vênus a 6051 km, tornando os planetas muito similares em tamanho, mas dissonantes em condições para o desenvolvimento da vida. Créditos: Nasa.

Planeta Vênus e o Mundo Infernal 

De acordo com o professor do Departamento de Ciências Atmosféricas do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG/USP) Roberto Dell’Aglio Dias da Costa, Vênus sofre efeito estufa planetário que faz com que as suas elevadas temperaturas sejam constantes em qualquer região do planeta. Estas temperaturas, inclusive, estão acima da temperatura de fusão do chumbo (327,5°C). O que significa que, se houver chumbo na superfície de Vênus, ele estará líquido em razão do calor extremo.  

Tais condições climáticas tão severas fazem de Vênus “um mundo infernal”, nas próprias palavras do diretor da Nasa, Bill Nelson. Em uma coletiva de imprensa, o atual diretor revelou que os dois novos projetos têm a missão de descobrir como o planeta se tornou tão hostil. A missão DAVINCI+ busca medir a composição da atmosfera do planeta, definir como ocorreu sua formação e descobrir se já existiram oceanos em Vênus. Enquanto isso, o VERITAS deve mapear a superfície e analisar atividades de tectonismo e vulcanismo no planeta.

Vida fora da Terra? 

Em decorrência de diversas particularidades, a exploração direta a Vênus foi suspensa durante décadas. Os estudos, porém, continuaram surgindo, até mesmo aqueles que insinuassem a possibilidade de vida no planeta. 

Um estudo recente e polêmico sugeriu a existência de uma substância denominada fosfina nas nuvens da atmosfera de Vênus, um possível marcador biológico no planeta. Entretanto, outro estudo publicado na revista Nature Astronomy sugere que, ainda que as nuvens de Vênus possuam condições de temperatura e pressão adequadas para a vida, a ausência de água impede a existência de microorganismos. Com a chegada das sondas humanas ao planeta, seria possível ter respostas mais claras quanto a essas condições.

De acordo com Roberto Dell’Aglio Dias da Costa, a percepção de que a vida é dependente da existência de água sólida pode configurar uma visão muito centrada na experiência humana. Logo, há a possibilidade de existirem outras formas de vida que não sigam o modelo terrestre e que denotem essa inferência como equivocada. O desenvolvimento da exploração espacial poderá descobrir formas de vida diferentes daquelas conhecidas pela humanidade até o momento.

O professor do Departamento de Astronomia, Ramachrisna Teixeira, afirma que uma exploração espacial resulta em uma série de questionamentos tanto sobre a história do Universo quanto sobre a origem do ser humano. Dessa forma, as missões a Vênus podem trazer informações cruciais para uma melhor compreensão de todo o Sistema Solar e até mesmo do próprio planeta Terra. Combinadas com as diversas pesquisas que estão sendo realizadas em Marte e em várias outras regiões, a exploração espacial vem atingindo objetivos ambiciosos e simbólicos. Neste sentido, Roberto da Costa esclarece que “a exploração espacial, no entanto, é um processo pouco imediato, mas é possível que o mundo observe grandes descobertas nas próximas duas décadas”, destaca ele. 

Na percepção de Ramachrisna Teixeira, o momento presente é de grandes avanços tecnológicos e muito investimento destinado a responder uma questão essencial da existência humana. “O ser  humano nunca buscou tanto a vida fora da Terra como hoje”, ressalta ele. De acordo com o professor, a busca por confirmação de vida fora da Terra é fonte de curiosidade constante para a humanidade. “A resposta negativa para essa pergunta nunca poderá ser confirmada. Por isso, a humanidade sempre estará atrás de uma confirmação de vida lá fora”.

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