Arquitetura pode melhorar a relação entre espaço e pessoas com autismo

Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil

Todos os dias passamos em frente de diversas residências, condomínios e estabelecimentos sem refletirmos ativamente o que há dentro destes locais. Pensando nisso, a pesquisadora e arquiteta Luiza Ho visitou duas residências em sua dissertação de mestrado, “Residências para pessoas com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) – Arquitetura e necessidades”, defendida pela FAUUSP. O objetivo da pesquisadora foi mostrar como a arquitetura pode servir como instrumento ativo na mitigação de impactos das residências para pessoas dentro do espectro autista. 

O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) é a nomenclatura que caracteriza o agrupamento de diferentes condições marcadas por perturbações do desenvolvimento neurológico que culminam em dificuldades no relacionamento social dos indivíduos dentro do espectro. Vale salientar que o TEA tem apresentações distintas em cada caso, que vai dos casos mais leves aos mais graves, portanto cada paciente é diagnosticado com base no seu grau do espectro. 

Alguns pacientes diagnosticados com o TEA também podem desenvolver o Transtorno de Processamento Sensorial (TPS), que é a condição em que o cérebro e sistema nervoso apresentam dificuldades para processar estímulos do ambiente e dos sentidos. É neste ponto em que a arquitetura entra com a possibilidade de minimizar os impactos, como compartilha Luiza: “O TPS faz com que eles interpretem o ambiente diferente. Então essa questão do ambiente chega na arquitetura, porque existe toda uma linha de pesquisa na arquitetura que é o conforto ambiental.” 

Para a realização da pesquisa, a arquiteta fez uma revisão bibliográfica acerca das produções científicas entre arquitetura e TEA, boa parte do processo teórico precisou ser embasado por literatura estrangeira, devido a escassez de estudos sobre o tema no Brasil. Após o processo teórico, Luiza realizou pesquisas técnicas em duas residências destinadas a pessoas com autismo: Associação de Amigos do Autista (AMA) e Casa de David, ambas em São Paulo. 

É importante pontuar que os pacientes dessas residências costumam fazer parte de um grau mais grave do espectro, em que, normalmente, são dependentes desses serviços. Pelo mesmo motivo a arquitetura faz-se necessária também nesses ambientes, já que o TSP também pode estar presente nos pacientes das residências. Por isso, é preciso organizar o “layout do espaço” para transmitir uma sensação mais segura aos pacientes. “Há uma clara necessidade de ter uma clareza de qual é a função do espaço, a pessoa que com o TEA tem uma dificuldade, às vezes, de entender o contexto do espaço [..] Então quanto mais fácil pra pessoa, para ela ver aquele espaço e identificar seu uso como ‘se eu quiser ir pro meu quarto é só eu segui esse corredor’, é o mais ideal”, afirma Luiza.

A arquiteta refuta um argumento de que, no processo de criação desses espaços, é necessário fazer um espaço neutro. “O espaço neutro não existe […] há cores que o pessoal tende a achar que são cores neutras, como o branco ou o cinza. Mesmo essas cores elas causam um impacto na gente, temos sensações quando as olhamos”, enfatiza a pesquisadora.

Condições climáticas e acústicas são desafios para a arquitetura na ampliação de residências como as que foram estudadas pela Luiza Ho. Por isso, é importante ampliar-se também os estudos nacionais sobre o tema, já que as bases teóricas para aprofundar-se no assunto são, em sua maioria, estrangeiras: “não faz sentido aplicarmos algumas questões dessa literatura estrangeira ao Brasil, por diferenças culturais e climáticas […] É preciso analisar o que podemos aproveitar na bibliografia estrangeira ao nosso contexto. Por isso, nosso detalhamento prático não foi tão detalhado.” 

Ela encerra enfatizando a importância dos estudos sobre arquitetura buscarem também, além das questões teóricas e técnicas, proximidade com as questões sociais. Para quem sabe, num futuro próximo, não estarmos discutindo a relevância de um assunto do passado: como a arquitetura melhorou a qualidade de vida nas residências para pessoas com Transtorno do Espectro do Autismo. 

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