Falta de dados atrapalha o combate à desigualdade racial no Brasil

Estudo em andamento denuncia deficit de dados para analisar as causas da desigualdade racial no Brasil

“Tem a análise dos Estados Unidos, mas e a nossa? Quero saber a história do Brasil”, explica Lucas Cavalcanti - Arte por Mayara Prado

Em um estudo em andamento da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da USP (FEA), o pesquisador Lucas Cavalcanti busca criar estimativas de acesso à terra, educação e relações de renda entre brancos e negros para consolidar uma base de dados capaz de auxiliar em futuras políticas públicas contra o racismo.

A princípio, a pesquisa possuía como foco o mercado de trabalho em São Paulo pós escravidão, mais precisamente na Primeira República, porém o pesquisador se deparou com um grande déficit censitário neste período. O censo de 1900 não incluía informação para cor, em 1910 não teve censo, em 1920 novamente sem informação para cor, em 1930 também não teve censo e apenas em 1940 se teve um censo completo. “É um período de apagão das estatísticas no Brasil, exatamente no momento em que essas eram de extrema necessidade”, aponta Lucas.

O pesquisador então se deparou com um trabalho de Karl Mosmann que utilizou um censo completo de São Carlos, feito em 1907. Tal estudo mostra que o oeste paulista nunca foi um grande centro escravista e que a porcentagem da população negra na região era semelhante a dos Estados Unidos, cerca de 15%.

Grande parte da mão de obra nas fazendas de café da região era de imigrantes europeus que possuíam condições de trabalho semelhantes aos dos negros. No entanto, esses eram vítimas de uma repressão sistêmica, comprovada por notícias e dados de encarceramento da época. Dessa forma, mesmo com a igualdade salarial, a violência foi capaz de criar uma pirâmide social que persiste até os dias atuais.

A partir de então, a pesquisa de Lucas Cavalcante tem um novo enfoque: utilizar os dados disponíveis do censo de 1907 e de 1940, compará-los e analisar o que ocorreu no Oeste Paulista neste intervalo de tempo. Como no Brasil não existe um estudo com esta especificação, o pesquisador se inspira em trabalhos estadunidenses, como o de Robert A. Margo, que criou gráficos comparando a situação de negros e brancos nos Estados Unidos, de forma a analisar as causas para a desigualdade socioeconômica atual.

“Tem a análise dos Estados Unidos, mas e a nossa? Quero saber a história do Brasil”. Lucas possui como objetivo criar gráficos, assim como os de A. Margo, que comparem o acesso à terra, à educação e o capital acumulado entre brancos e negros, com ênfase no oeste paulista, visto que o Brasil é um país muito complexo onde “depende de cada região para se falar de opressão”. Além disso, o estudo, devido às dificuldades encontradas para achar dados e a limitação de tempo, deixará diversas pontas soltas, mas essas serão futuros ganchos para próximos pesquisadores se aprofundarem no assunto.

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