Desregulamentação do streaming prejudica produção audiovisual

Reprodução: Freepik

A chegada da internet alterou a maneira como o audiovisual é consumido. Entre 2014 e 2018, o consumo de vídeo online cresceu 135% no Brasil, indica pesquisa da Provokers. Youtube, Netflix e Amazon Prime são exemplos de serviços que compõem um novo segmento de mercado que compete com a tradicional TV paga e, até mesmo, com o cinema.

Esse cenário, segundo Giovanni Francischelli, documentarista e pesquisador na área de políticas públicas para cinema e audiovisual, tornou obsoleta a legislação brasileira que regula o setor, criando lacunas e assimetrias jurídico-tributárias que, por vezes, prejudicam a produção nacional independente.

Com isso, grupos de interesses, como radiodifusores, produtores audiovisuais, representantes das plataformas de streaming e do mercado de telecomunicações, estão se mobilizando na reformulação das leis existentes, sobretudo da Lei do Serviço de Acesso Condicionado (SeAC).

Entraves

A insegurança jurídica decorrente da legislação atual pode ser observada na arrecadação da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine). O tributo incide sobre os agentes de mercado do audiovisual, com a finalidade de compor o Fundo Setorial do Audiovisual, destinado ao fomento do setor.

A contribuição, porém, não está sendo arrecadada dos serviços de Video on Demand (VoD), como a Netflix, contrariando uma instrução normativa da Ancine publicada em 2012. O pesquisador esclarece que há dois argumentos por parte das plataformas de streaming para a não contribuição.

“O primeiro é contra a forma como o tributo é recolhido”, explica Francischelli, e avança: “Cobrado por título, acaba sendo inviável para os serviços de VoD, que têm catálogos grandes. Um único título estrangeiro pode custar até R$ 7 mil”. O outro argumento é da ordem jurídico-tributária, seguindo o princípio constitucional que tributos somente podem ser instituídos por lei.

As reservas de mercado, ou simplesmente cotas, são outro instrumento fundamental para o desenvolvimento da indústria do audiovisual do Brasil, sobretudo da produção independente. Enquanto na TV paga, há uma regulamentação sobre os percentuais de conteúdo nacional que devem compor a grade horária, o VoD segue sem regulamentação e com um percentual pífio de produções brasileiras em seus catálogos.

Soluções

Há projetos de lei tramitando na Câmara dos Deputado, a fim de resolver os impasses relacionados ao VoD. O projeto mais avançado, na visão de Francischelli, é o do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), que ganhou um substitutivo na terça-feira, 12 de novembro, apresentado pela deputada Benedita da Silva (PT-RJ). As discussões giram em torno de uma Condecine sobre o faturamento e a presença de cotas nas plataformas de streaming.

Francischelli defende uma regulamentação convergente para o audiovisual no Brasil. Isto é, que a legislação não se baseie no suporte tecnológico, mas sim em elementos mais amplos, como liberdade de expressão, fortalecimento da Ancine e na manutenção dos fundamentos políticos que, historicamente, sustentam o setor (Condecine, Fundo Setorial do Audiovisual e cotas).

Os pontos de Francischelli são desenvolvidos em artigo, com co-autoria de Vitor Blotta, professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, no âmbito do grupo de pesquisa Jornalismo, Direito e Liberdade, do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP.

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