PL do Saneamento Básico gera dúvidas sobre eficiência de privatização

Para especialista, problemas de infraestrutura exigem políticas públicas mais profundas

Esgoto a céu aberto mostra falhas estruturais - Foto: Valter Campenato (Agência Brasil)

O sistema de saneamento básico como um todo está em discussão na “PL do Saneamento”, projeto em discussão na Câmara dos Deputados de autoria do senador Tasso Jereissati (PSDB/CE). O que entra em jogo é quem aplica o serviço: o projeto amplia para empresas privadas o fornecimento de água tratada, coleta de lixo e rede de esgoto. Apesar de já prestarem o serviço, elas são apenas 6% na área. 

Para Leandro Giatti professor da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, o problema de oferecimento não é apenas sobre qual empresa administra o serviço, mas a maneira que a infraestrutura é planejada e construída. Para ele, privatizar ainda mais o serviço simboliza uma medida paliativa dentro de uma estrutura deficitária muito maior. 

“É a ideia de que a solução pra tudo é privatizar, mas a estrutura é muito mais complexa”, explica. Para o pesquisador, é mais necessário discutir mudanças de pensamento “sistêmico e territorial” do que oferecer o serviço a outras empresas.  

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2018, organizada pelo IBGE, revela que são 24 milhões de residências sem água encanada e mais 15 milhões sem coleta de lixo. Esgoto em casa é quase luxo: apenas 66% das moradias têm o serviço instalado. É mais que o dobro de casas sem água, chegando a 57 milhões de casas que não possuem acesso à rede. 

Giatti explica que a disparidade entre serviços da mesma área é reflexo de um paradigma antigo. “No geral, a mentalidade é levar água antes do esgoto. A cobertura de água tratada é bem melhor”. Basta olhar para os rios em São Paulo, capital do estado com os melhores indicadores do País: “a distribuição de água é boa na cidade, mas nossos rios revelam que a rede de esgoto está bem atrás.”

A rede de esgoto é importante para o próprio abastecimento de água. Sem o serviço bem estruturado, a poluição de recursos hídricos como rios é muito maior. “Aqui, temos que buscar água cada vez mais longe. Toda a macrometrópole paulista sofre com a escassez hídrica.” 

Entre regiões

Existem detalhes regionais entre os dados nacionais sobre cobertura de saneamento básico: 86% das casas brasileiras têm água tratada, mas os números são puxados para cima por estados de algumas regiões, de acordo com dados do Pnad. Enquanto em São Paulo 96% das casas estão cobertas, em Rondônia menos de metade das residências recebem o serviço (43%). 

O atraso na rede de esgoto, além de nacional, se manifesta entre regiões. Na região Norte e em alguns estados no Nordeste, a distribuição beira os 20%. No Piauí, que possui os piores índices, menos de 10% das casas têm rede de esgoto instalada. 

Giatti acredita que a privatização não melhora o quadro, necessariamente. “As empresas podem deixar de lado uma área menos lucrativa, que ainda ficará na mão do Estado”, define. Em Manaus, o sistema foi privatizado, mas não resolveu todos os problemas. Em Paris e Berlim, na Europa, as cidades estão reestatizando o serviço.

Mas também critica as atividades das empresas estaduais, no que considera a falta de transparência e a falta de inovação. “O papel dessas companhias deve ser presente, buscar alternativas e mudar paradigmas.”

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