
As formigas nectarívoras são insetos que se alimentam de néctar e, por isso, acabam protegendo sua fonte de alimento de outros animais, tornando-se uma possível substituta aos agrotóxicos. A tese de mestrado escrita por Fábio Túlio Pacelhe e publicada em março na revista Biotropica, estudou o mutualismo entre algumas espécies de formigas e plantas.
Normalmente, formigas como a saúva são tidas como pragas nas plantações. Essas espécies costumam danificar as folhas das plantas, que servem de substrato para que produzam fungos e se alimentem deles. Entretanto, espécies como a Ectatomma tuberculatum e Camponotus crassus, por exemplo, alimentam-se do néctar das plantas, tendo preferência por aquelas produzidas fora das flores, em estruturas conhecidas como nectários extraflorais, ou seja, glândulas especializadas na secreção de néctar, que não têm relação com a polinização, ao contrário dos nectários presentes nas flores.
O mutualismo entre as espécies ocorre da seguinte forma: as plantas atraem as formigas com o seu néctar. As formigas utilizam o néctar como alimento e, em troca, protegem as plantas de outros invasores. Segundo o professor Marco Aurélio Ribeiro, orientador da tese, pragas como gafanhotos e lagartas são atacadas pelas formigas quando tentam se aproximar da sua fonte de alimento, beneficiando o agricultor.
Embora esse uso seja possível, Fábio Pacelhe ressalta que isso é apenas uma especulação para o futuro, e que ainda é necessária muita pesquisa. “Nosso estudo não teve como objetivo inicial uma aplicação na agricultura, mas sim, encaixar mais uma peça no quebra-cabeças teórico sobre o mutualismo, nos permitindo fazer extrapolações de sua aplicabilidade na agricultura. Portanto, não foi feito nenhum teste ou estudo aplicando nossas descobertas em sistemas agrícolas, sendo necessário fazê-los”, explica o pesquisador, que trabalho em conjunto com o Instituto de Biociências da USP e pesquisadores da UFMG e da Universidade do Arizona.
Atualmente lecionando no IB, Marco Aurélio especulou quais agricultores seriam mais beneficiados com esse tipo de controle de pragas: “Isso (uso de formigas) pode ser melhor para quem usa sistemas agroecológicos. Geralmente, quem trabalha com grandes monoculturas já eliminou tantos elementos daquele ecossistema, que não tem como fazer o controle biológico natural ou semi-natural.”
Formiga da espécie Camponotus crassus predando um cupim da espécie Nasutitermes coxipoensis Imagem cedida pelo pesquisador Fábio Pacelhe
Ou seja, o uso de formigas só é possível se existir parte do ambiente original do local. Os sistemas agroecológicos, ou agroflorestais, citados pelo professor, são aqueles que unem a floresta original as plantações. Para implementar um, o agricultor derruba apenas a vegetação rasteira – composta de arbustos e ervas – e mantém as árvores mais altas.
Esse tipo de sistema é fundamental para o controle biológico, pois preserva a maioria das relações ecológicas da floresta. Assim, após ser implementado, as formigas que ali vivem vão ter uma opção a mais de alimento e tudo o que é preciso para protegê-lo. As espécies também podem ser introduzidas manualmente, dependendo da necessidade do agricultor.
Embora a domesticação das formigas seja uma tarefa relativamente simples, não existem dados suficientes para viabilizar a utilização desse método. Inclusive, devido às particularidades de cada espécie, é mais viável trabalhar com as espécies nativas, já que elas já estão adaptadas ao clima e meio ambiente. Para o professor, os estudos devem buscar agora entender qual espécie é mais vantajosa em determinada situação e quais as condições necessárias para que ela se estabeleça em cada cultivo.
Como Fábio Pacelhe enfatizou, a utilização do controle biológico na agricultura ainda é algo um tanto distante e que precisa ser mais estudado. Mas os dados coletados são otimistas, principalmente quando pensamos na saúde dos consumidores: “Apesar do controle biológico de pragas ainda não possuir claras vantagens econômicas sobre o controle químico, não há dúvidas de que seu uso traz menor impacto sobre o meio ambiente. A redução de produtos químicos também pode trazer impactos positivos e indiretos na saúde, uma vez que muitos agrotóxicos são agentes cancerígenos”, explicou o pesquisador.
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