Recentemente, logo no final do ano passado, foi publicada uma dissertação de mestrado, pela FAU-USP, que resolveu uma discussão travada entre autoridades ambientais desde 2015 em São Paulo. Essa pesquisa concluiu que, apesar das chamadas “fachadas verdes” causarem impacto positivo naqueles que se encontram dentro dos prédios revestidos de plantas, elas têm um impacto mínimo para o microclima urbano como um todo. Por esse motivo, não deveriam ser utilizadas como forma de compensação ambiental em regulações mediadas pelo governo.
Essa discussão tomou forma quando, em março de 2015, um decreto aprovado pela prefeitura de São Paulo autorizou a execução dessas fachadas verdes como meio de compensação ambiental dentro do município. Tal coisa não era permitida por lei antes: o Termo de Compromisso Ambiental (TCA) não permitia que tal equiparação fosse feita através dessas fachadas, e sim pela implantação de espaços verdes que correspondessem às supressões ambientais causadas. (O TCA é uma autorização prévia da prefeitura, uma análise feita pela Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA) para que um Projeto de Compensação Ambiental – elaborado por determinado agente que necessite realizar obras envolvendo corte ou transplante de árvores – seja aprovado. Dessa forma, esse agente terá autorização para causar futuras supressões ambientais, mas essas terão de ser compensadas com novo plantio de árvores, por exemplo.)
A nova medida governamental (seguida por mais outras duas que a reforçaram, em 2015 e em 2016) foi muito questionada por autoridades ambientais e estudiosos do assunto. Isso porque ainda não se sabia se essas fachadas tinham um impacto ambiental suficiente (ou equivalente ao dos espécimes arbóreos) para serem usadas como compensações de danos ambientais maiores. A pesquisadora Priscila Weruska Stark, graduada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), procurou responder essa questão em sua dissertação de mestrado “O impacto das fachadas verdes nos microclimas urbanos”, iniciada em 2016 e finalizada no ano passado. Na dissertação, conclui que, apesar da utilização dessas fachadas não ser suficiente, elas têm, um impacto positivo ao resfriar os ambientes internos das construções nas quais se envolvem.
Resultados do processo
Já é de conhecimento geral que espaços verdes são importantes para as cidades pelo papel regulador que eles têm sobre a sua temperatura. As árvores, com seus troncos largos e compridos, cheios de verdes em suas muitas pontas, têm grande importância nessa questão. Elas são responsáveis por capturar o gás carbônico da superfície e absorver e transformar suas moléculas até que resultem em oxigênio – abaixam, portanto, a concentração de gases nocivos à saúde humana de forma eficiente. No seu tronco, diz a pesquisadora, é onde fica armazenada a maior parte do carbono. Suas folhas, em grande volume, proporcionam sombreamento em áreas urbanas tomadas pelo sol e pelo calor, diminuindo também a temperatura do microclima urbano. Além disso, já foi constatado, em outras pesquisas citadas por Priscila na dissertação, que conviver perto de espaços verdes (como um todo) melhora a saúde mental dos indivíduos.
Por causa de todos esses benefícios citados (além do aumento da umidade do ar e recarga de lençóis freáticos), sua implementação em compensações ambientais é “muito bem-vinda”, ainda mais quando de forma adensada, em corredores compridos. Priscila cita, em sua tese, que a professora Denise Duarte (titular da FAU-USP) defende que uma estratégia eficiente para incrementar infraestruturas verdes nas áreas urbanas é “manter a vegetação arbórea conectada entre pequenos parques urbanos, com arborização nas vias, formando uma rede de infraestrutura verde e densa na cidade, criando oportunidades de adaptação e provocando um efeito oásis nos dias de calor extremo.”
O que a pesquisadora agora analisa também é o papel que as chamadas “fachadas verdes” exercem nesse meio. Sua conclusão é de que o impacto ambiental e social não é próximo ao dos espécimes arbóreos, e de que não faz sentido usá-las, então, como forma de compensar grandes danos ambientais (como aprovado por decreto em 2015 e endossado em 2016 pela prefeitura de São Paulo).
As fachadas verdes – que são conceituadas como plantas cujas raízes estão no solo e que crescem pelas paredes de construções – possuem alta densidade foliar, mas suas características não permitem que muito gás carbônico seja absorvido no processo de fotossíntese. Isso significa que são menos eficientes na tentativa de tornar o microclima menos quente, além de também não proporcionarem sombreamentos maiores. Ao longo de várias medições feitas por programas computacionais, a pesquisadora chegou à conclusão de que, afastados 60 centímetros das paredes verdes, seus aparelhos já não registravam mudança térmica alguma.
Dessa forma, um empreendimento que causou um grande dano ambiental não deveria ser compensado pela implementação de fachadas verdes, porque essas últimas têm um impacto ambiental bastante inferior ao dos espécimes arbóreos.
Mesmo assim, Priscila reforça que essas paredes não deixam de ter sua importância: além de ainda existir um impacto no bem-estar dos cidadãos, a temperatura fica mais baixa dentro dos edifícios envoltos por paredes verdes. Isso evita que energia elétrica seja gasta para refrigerar artificialmente os ambientes internos. “Podemos afirmar que as fachadas verdes podem se apresentar como uma ótima alternativa para a economia de energia no resfriamento de edificações, além de se mostrarem como um elemento importante na sensação de bem-estar psicológico, reduzindo a aridez da malha urbana. Porém, o seu benefício para o conforto térmico em áreas externas é insignificante”, relata ela.
Os custos de implementação e manutenção
O fato de que o impacto ambiental dessas fachadas verdes é menor não é a sua única desvantagem em relação às árvores. As paredes verdes demandam tecnologias de suporte, nutrição e irrigação, além de cuidadosa manutenção, enquanto a grande maioria das árvores, depois de já estabelecida a muda, não necessita de mais cuidados humanos: a própria chuva e o ambiente se tornam responsáveis por alimentá-la.
Segundo a pesquisadora, em 2017, uma muda dentro dos padrões exigidos pela prefeitura custava 150 reais, enquanto o metro quadrado de uma parede verde cerca de 800 reais. “Atualmente, segundo reportagem do jornal Estadão, cada edifício do Minhocão [área em que há muitas paredes verdes implementadas] gasta mensalmente cerca de 2.000 reais em manutenção, água e energia para a conservação dos sistemas verticais.”
Dessa forma, mesmo que as fachadas sejam uma alternativa a lugares em que não há espaço suficiente para o plantio de árvores (e sejam melhores do que nada), seus altos gastos em implementação e manutenção, e seus poucos benefícios ambientais, fazem delas um mau investimento econômico e ecológico (e uma saída ruim para as compensações ambientais mediadas pelo governo).
Em primeiro lugar, parabéns a Priscila Weruska Stark pelo trabalho científico desmistificador: finalmente, alguém resolver dar números ao assunto. Mais ainda em se tratando de tese elaborada em ambiente não muito afeito a pesquisa pragmática.
Em segundo lugar, só não enxergou quem não quis: é óbvio que sempre se tratou de vantagem para o empresariado imobiliário. Paredes (ou fachadas verdes) não ocupam espaço e o custo de sua manutenção é – na grande maioria dos casos – delegado ao condomínio.
Não era necessário uma pesquisa científica para “saber” que elas não substituem árvores, mas para “comprovar”.