Países da Iberoamérica apresentam diferenças em leis sobre casamento entre pessoas do mesmo sexo

Pesquisa mostra a relação entre a existência de leis voltadas para a população LGBTQI+ e o bem-estar psicológico e social da mesma

A parada do orgulho LGBT em São Paulo ocorre em um dos pouco países da Iberoamérica que permitem o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Imagem: Pinterest

Composta por 22 países, a chamada Iberoamérica — composta por Portugal, Espanha e suas ex-colônias na América — é uma região com grande discrepância quanto às legislações sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Algumas nações permitem essa união, outras a proíbem, alguns apresentam outras alternativas de união, e ainda existem aqueles que não permitem o casamento. E cada uma dessas decisões têm um impacto direto no bem-estar psicológico e social de cada integrante da população LGBTQI+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Transgêneros, Queers, Intersexuais, dentre outras designações) desses locais.

Essas foram as conclusões da tese de Doutorado de César García Vázquez, intitulada “Homosexualidad y matrimonio en Ibero-América: cambios psicosociales e institucionales” (Homossexualidade e matrimônio na Iberoamérica: mudanças psicossociais e institucionais, em tradução livre), desenvolvida no Instituto de Relações Internacionais.

Algo que chama atenção na pesquisa de Vázquez é a grande quantidade de dados analisados: a legislação sobre casamento entre pessoas do mesmo sexo de todos os 22 países da Iberoamérica e Andorra — um micro país europeu próximo à Espanha — além de entrevistas com membros da comunidade LGBTQI+ de todas essas nações para traçar um perfil psicossocial dos mesmos. Ao todo, foram 1290 participantes. A Iberoamérica reúne, sozinha, 10% da população mundial, sendo “um espaço amostral bastante representativo e considerável”, comenta Vázquez.

Os aspectos legais

A primeira coisa que Vázquez analisou foi como cada país trata, em sua legislação, o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Ele aponta que a maioria possui “legislações velhas e desatualizadas” sobre o matrimônio. O pesquisador comenta, porém, que a população LGBTQI+ acabou se beneficiando dessa característica: “As leis antigas são mais genéricas, permitindo uma interpretação que possibilitou o casamento entre pessoas do mesmo sexo”. Isso ocorreu, por exemplo, no Brasil.

No total, oito países (com cerca de 75% da população da Iberoamérica) têm leis permitindo o casamento entre pessoas do mesmo sexo, cinco por alterações via poder legislativo e três com interpretações do judiciário que permitem essa união. Quinze países não possuem leis sobre o matrimônio, com seis deles sem nenhum dispositivo legal que o possibilite ou o proíba.

A situação do casamento entre pessoas do mesmo sexo em países Iberoamericanos. Fonte: César Vázquez. Tradução: João Pedro Malar

Mas também existem países que atualizaram suas leis para proibir o matrimônio entre pessoas do mesmo sexo, é o caso da Bolívia, Equador, Paraguai, Honduras e República Dominicana. Quatro países não permitem o matrimônio, apenas a união estável entre casais, são eles: Chile, Equador, Andorra e Costa Rica. No caso deste último país, seu judiciário determinou que, até 2020, o poder legislativo deverá tornar legal o matrimônio entre pessoas do mesmo sexo.

Vázquez comenta que a união estável surge como uma “alternativa para casos em que a maioria da sociedade é contrária a associar o simbolismo do casamento com casais do mesmo sexo”, mas reforça que ela não é o ideal, já que a população LGBTQI+ do país continua privada de um direito e de uma liberdade que o resto da sociedade possui.

A situação do casamento entre pessoas do mesmo sexo em países Iberoamericanos. Fonte: César Vázquez. Tradução: João Pedro Malar

Os efeitos de uma lei

Um dos objetivos de Vázquez com a pesquisa era “determinar a relação entre a existência de leis sobre o matrimônio com o bem-estar psicológico e social da população LGBTQI+ desses países”. Para isso, foram analisados quatro fatores: apoio social (se a população LGBTQI+ se sente apoiada pela sociedade), empoderamento (desejo de atuar no espaço público), percepção de discriminação e bem-estar social (qualidade do relacionamento com família, amigos e parceiros e se sentem um apoio por parte da Igreja, do Estado e no ambiente de trabalho).

Nos países que permitem o matrimônio de pessoas com o mesmo sexo, há uma maior sensação de apoio social e de bem-estar social, com uma maior percepção de discriminação e um menor empoderamento. Já nos que não permitem a união, as sensações de apoio social e bem-estar são menores, há uma menor percepção de discriminação e um maior empoderamento.

Em relação ao bem-estar social, houve pouca variação quanto à sensação de suporte por parte da família e parceiros. Em países que permitem o casamento, existe uma percepção maior de apoio em relação ao Estado e ambiente de trabalho, com um efeito negativo nas nações que proíbem a união. As variações de empoderamento “fazem sentido, pois, em países sem o direito, você luta por ele. Mas não é bom que em nações com o direito ao casamento haja um relaxamento por parte da população, pois ela ainda não está consolidada, demandando uma luta constante”, analisa Vázquez

Por fim, Vázquez perguntou aos entrevistados desses países quanto tempo eles achavam que demoraria para a criação de uma lei permitindo o casamento ou revogando a lei de proibição. “A maioria teve uma resposta mais otimista, opinando que a mudança ocorrerá em, no máximo, uma década”.

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