Agropecuária sustentável: novos caminhos para um serviço limpo

Novas técnicas testadas por pesquisadores paulistas otimizam áreas de pastagem e efetuam o sequestro de carbono do ambiente

Gado em sistema silvipastoril com plantação de eucaliptos | Foto: Site MF Rural

A agropecuária é, hoje, uma das maiores fontes de renda do país. Pode-se dizer que nos últimos 30 anos o setor foi sofrendo um processo de constantes melhorias, envolvendo o desenvolvimento genético e também técnicas de nutrição e produção animal. No Brasil, há cerca de 218 milhões de cabeças de bovinos, o equivalente a um animal por brasileiro, além de ocupar, aproximadamente, 200 milhões de hectares para pastagem.

Devido ao número expressivo, o setor acaba por atrair olhares negativos, já que a atividade é considerada poluidora. Os animais ruminantes, como os bois, exalam gases que possuem componentes intensificadores do efeito estufa, como o metano entérico (do intestino). Além disso, a população externa vê no Brasil uma pecuária atrasada, a qual ainda utiliza extensas áreas de pastagem que acabam sendo degradadas e que demora um longo período de tempo para abater o animal.

Por conta disso, há aproximadamente dez anos, a comunidade científica atuante do setor tem se organizado para encontrar soluções para essa problemática. Paulo Henrique Mazza Rodrigues, professor da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade São Paulo (FMVZ-USP), cita algumas das maneiras existentes para reverter a situação. Entre elas, a diminuição dos gases de efeito estufa por unidade animal, ou seja, fazer com que o animal diminua a emissão de gases através de mudanças na alimentação ou melhoramento genético. Além disso, Mazza conta sobre a possibilidade de diminuir a emissão, por unidade de produto animal, seja vaca leiteira ou gado de corte. A importância está no produto final, que seria o leite encontrado nos corredores da padaria ou na carne vendida. Logo, é possível obter bons resultados alterando os sistemas produtivos utilizados ou mesmo aumentando a produtividade animal.

Entre os atuais sistemas utilizados, um que vem sendo amplamente discutido é o sistema de integração da pecuária com outras atividades, como a produção de árvores e plantações de florestas, também denominados sistemas silvipastoris. O objetivo da ferramenta é melhorar o balanço das emissões no sistema como um todo, proporcionando o sequestro dos gases geradores do efeito estufa.

A aplicação desses sistemas já tem sido feita na Embrapa Pecuária Sudeste. A pesquisadora Patrícia Perondi explica as três linhas trabalhadas na empresa visando a sustentabilidade.

Em primeiro lugar, trabalham com a intensificação das áreas de pastagem. É feito um manejo correto da fisiologia da planta, além da correção e adubação do solo. Isso possibilita a maior lotação de animais em uma mesma unidade de área. Tal fato diminui a pressão sobre a floresta e evita o desmatamento.

A segunda linha trabalhada na Embrapa diz respeito ao uso de consórcio de gramíneas e leguminosas. A introdução de leguminosas cumpre duas funções: é uma fonte de proteína para os animais e diminui a necessidade do uso de adubo nitrogenado. Em seus sistemas produtivos, a Embrapa utiliza o feijão guandu como fonte de adubação verde para essas áreas de pastagem.

A terceira linha trabalha com a integração dos sistemas de produção, por meio da utilização de árvores exóticas (introduzidas no Brasil) e árvores nativas. A finalidade é diversificar as atividades rurais, tendo também uma maior fonte de renda e auxílio na questão do balanço de carbono nos sistemas. Retira-se CO2 da atmosfera durante o processo de fotossíntese e crescimento das árvores.

Além disso, a técnica possibilita um maior conforto para os animais. “Eles estão no habitat natural deles e também tem um melhor conforto térmico, se reproduzem melhor, ganham mais peso”, explica Patrícia. Os sistemas silvipastoris geram sombra e diminuem a temperatura, tornando o ambiente agradável. O calor excessivo poderia levar os animais a terem perdas embrionárias, desenvolverem estresse, comerem menos e, consequentemente, demorarem mais para serem abatidos, entre outras consequências.

Distribuição das árvores utilizadas no sistema silvipastoril | Arte: Carolina Fioratti

A Embrapa utiliza, prioritariamente, híbridos de eucalipto e eucalipto citriodora. O formato das plantações conta com, no mínimo, 25 metros de espaçamento entre as linhas de árvores. Já entre as plantas, o espaçamento é de dois metros. No momento em que estão por volta de seus 5 anos de idade, faz-se a primeira derrubada. Cerca de 50% são utilizadas para produzir madeira para mourão (cercas e portões). As árvores remanescentes permanecem no sistema até completarem entre 8 e 12 anos. Os troncos de madeira nobre serão destinados à construção civil, móveis, entre outros. “Isso, do ponto de vista ambiental, é muito importante, pois é uma forma de retirar poluição da atmosfera. Essas árvores consomem CO2, acumulam carbono em seu tronco e o carbono que é sequestrado vai permanecer na madeira que é utilizada em móveis, alvenaria, na indústria naval, entre outros”, completa Patrícia Perondi.

Sistema para gerar balanço de carbono e destinação final das árvores utilizadas | Arte: Carolina Fioratti

O objetivo central é gerar balanços de carbono neutralizados ou créditos de carbono. Faz-se então um balanço que consiste na conta entre as emissões e as remoções de gases do efeito estufa. O balanço é considerado zero quando aquilo que é emitido consegue ser removido por meio do sequestro de carbono no solo e no tronco das árvores.

Paulo Mazza acredita que a principal vantagem está na imagem que a pecuária passará para seu consumidor. “Quem quiser continuar produzindo, quem quer exportar alimentos para fora, não tem jeito, tem que atender às exigências do mundo”. O país deve atender exigências como preços acessíveis, alimentos seguros sem risco de transmitir doenças, que não sejam poluentes para o meio ambiente e que não utilizem trabalho análogo à escravidão ou de trabalhadores mal remunerados. Só assim consumidores asiáticos e europeus continuarão negociando com o Brasil.

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