Desde 2011, o Centro de Pesquisas de Águas Subterrâneas (Cepas) do Instituto de Geociências da USP, realiza estudos para entender melhor a contaminação das águas subterrâneas de Jurubatuba, uma antiga região industrial na zona sul de São Paulo. A obtenção de dados adequados para compreender o aquífero fraturado local, formado por rochas cristalinas do Pré-Cambriano, contudo, sempre foi um grande desafio. Para atender a essa demanda, Marcos Bolognini Barbosa e a equipe do Cepas desenvolveram, em seu projeto de doutorado, uma unidade móvel para ensaios hidráulicos e amostragem de água subterrânea. Esse equipamento é utilizado em sua pesquisa em andamento sobre a dinâmica hidráulica do aquífero fraturado de sua região de estudo, isto é, um tipo de reservatório subterrâneo em que a água se move pelas fraturas das rochas, apresentando um elevado grau de complexidade.
A região estudada compreende uma área de 1,5 quilômetros quadrados no distrito de Santo Amaro. Nesta, ocorreram diversos casos de liberação de solventes clorados no solo, que acabou contaminando as águas subterrâneas mais rasas e o aquífero fraturado do local. O objetivo do pesquisador é entender como a água se move no aquífero e quais são as influências dos poços de abastecimento na sua dinâmica, de modo a compreender melhor o panorama atual de contaminação. Isso é feito por meio de filmagens com ferramentas geofísicas e a coleta de amostras de água e ensaios realizados em poços lacrados – em que já não há mais bombeamento de água –, com o trailer projetado. Alguns dos componentes do trailer são trazidos do exterior e adaptados para a realidade dos aquíferos brasileiros e outros são desenvolvidos no país, sendo todos, posteriormente, configurados dentro do projeto do equipamento móvel.
A coleta de dados compreende a filmagem do interior dos poços do local, medição da vazão da água com um dispositivo que utiliza o calor como traçador do movimento da água dentro do poço, ensaios hidráulicos e coleta de amostras de água com obturadores – um dos equipamentos do trailer – que possibilitam o isolamento de trechos dos poços. Em seguida, os dados coletados são tratados e analisados. Os primeiros resultados obtidos pelo pesquisador indicam que há um fluxo descendente da água nos poços da região, ou seja, a água se move das porções mais rasas para as mais profundas. Isso tem implicações específicas no que diz respeito à contaminação do aquífero: “No caso de contaminação, os poços são como condutos que pegam as águas mais rasas – e contaminadas – e jogam para o fundo”, explica Marcos.
A etapa de obtenção de dados da pesquisa ainda está no início, mas a expectativa é que, ao longo de seu desenvolvimento, tenha-se mais informações sobre como a água no aquífero fraturado se comporta. “Já começamos a entender a dinâmica de fluxo desse aquífero e vamos entender mais ainda quando formos com o trailer coletar amostras e fazer análises em laboratório”, afirma o pesquisador. Com os dados em mãos, o próximo passo é montar um modelo conceitual e matemático que descreva a movimentação da água nas fraturas, detalhando seu comportamento hidráulico.
Importância prática
O projeto, de acordo com Barbosa, tem a função de entender um tipo de aquífero complexo e pouco estudado até então, para que, a partir disso, ações possam ser tomadas a respeito da utilização do recurso hídrico, tanto em casos de gerenciamento da contaminação, quanto no uso para abastecimento da região. “Se concluirmos que os poços são um problema porque, jogando água para baixo, estão piorando a qualidade do aquífero, eles precisam ser selados ou podem se tornar poços de monitoramento. Podemos usar essa água do aquífero, tratar e disponibilizar”, diz o pesquisador.
Os processos e testes realizados com o equipamento móvel desenvolvido são realizados, no momento, apenas em Jurubatuba. Entretanto, segundo Barbosa, a tecnologia pode ser aplicada em várias áreas. “Este é um projeto piloto de como fazer esse estudo e entender esses aquíferos. No Brasil, utilizamos muito a água superficial, mas existem regiões que dependem da água subterrânea. O que estamos fazendo pode ser aplicado da mesma forma em outro lugar, porque a ciência, o entendimento e as ferramentas são as mesmas”.
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