Investimento em tecnologia não é suficiente para vantagem competitiva

Estudo investiga oito estudos de caso em diferentes indústrias para avaliar o impacto de práticas de inteligência competitiva nas empresas

Foto: Divulgação

Um estudo realizado no Departamento de Engenharia de Produção da Escola Politécnica da USP buscou avaliar o impacto de práticas de inteligência competitiva nas empresas. Utilizando como suporte a visão baseada em recursos (RBV – resource based view) e ferramentas de análise estratégica, foi possível comprovar que apenas o investimento em ativos computacionais não é suficiente para se ter práticas de inteligência competitiva (IC). Por outro lado, as empresas que conseguiram desenvolver tais práticas conseguiram criar uma vantagem competitiva mais consistente no mercado.

O estudo investigou oito estudos de caso em diferentes áreas, sendo quatro da indústria financeira, uma da área de diagnósticos médicos, outra de refeições congeladas e a última do mercado de cosméticos. Foram realizadas entrevistas de duas a três horas com especialistas em risco, gerentes e analistas de BI (business intelligence), além de diretores de finanças e de operações. Boa parte do trabalho foi efetivamente correlacionar as práticas de inteligência competitiva com a RBV.

“A inteligência competitiva vem de uma corrente de TI (tecnologias da informação) com o uso massivo de dados e recursos computacionais”, explica George Jager, consultor de negócios e pesquisador da Escola Politécnica da USP. “Já a visão baseada em recursos vem de um campo mais teórico e acadêmico, no âmbito da economia mesmo. Tanto que uma das maiores dificuldades que tive foi colocar ela em prática ao longo do trabalho, na aplicação das entrevistas e na avaliação das empresas”.

Indústria financeira

A metodologia aplicada, na correlação dos fatores, foi a chamada VRIO, que se refere as quatro características básicas de um recurso que pode gerar vantagem competitiva: se ele é Valioso, Raro, Inimitável e Organizado. O modelo também pode ser aplicado diretamente para avaliar se uma determinada empresa possui vantagem competitiva sustentável, ou se ela possui, na verdade, uma desvantagem competitiva. Já os critérios para a seleção dos casos foram a receita operacional bruta e os setores das empresas, buscando grandes empresas de forma variada.

“É claro que o mercado financeiro acaba se sobressaindo já que é onde há maior concentração de tecnologias mais avançadas para análise de dados”, afirma George. Chama atenção também a atual correlação de forças nesse mercado, onde há o oligopólio dos bancos e até mesmo a colaboração entre eles, de um lado, e do outro, há os novos entrantes, como as fintechs, que fazem o maior uso da IC e de estratégias de baixo custo. “É curioso porque, ao contrário do que poderia se esperar, o uso aplicado da IC na estratégia pelos grandes bancos parece ser limitado: os analistas passam 70% do tempo produzindo relatórios”, conta o pesquisador.

Diagnósticos médicos

Em compensação, o uso maior da inteligência competitiva também não significa maiores resultados. Dos casos estudados, a financeira digital (caso II), por exemplo, não foi o que que mais teve retorno concreto, embora faça mais uso dessas práticas. A empresa que ao fim da pesquisa realmente obteve maior retorno das práticas de inteligência competitiva foi a de diagnósticos médicos. Através de práticas de inteligência competitiva, a empresa identificou na operação de máquinas de tomografia sua maior desvantagem, pois elas precisavam de um operador exclusivo, que acabava sendo subaproveitado no intervalo dos exames.

“O principal ganho de produtividade foi na operação das máquinas, que passaram a ser operadas remotamente. Antes, o operador que estava alocado fisicamente próximo a máquina tinha diversas restrições em razão de estar exposto à radiação”, explica George. Por isso, tinha diversos intervalos e jornada de trabalho reduzida. Após a operação das máquinas passar a ser remota, foi possível aumentar a jornada de trabalho e reduzir os intervalos. Além disso, um único operador passou operar três máquinas de forma simultânea. Com isso, o custo variável, por exame, reduziu de forma significativa.

Entre as limitações do trabalho reconhecidas pelo pesquisador está a não generalização dos resultados e a identificação dos recursos avaliados, muito fundamentada na percepção do entrevistado com relação a empresa que ele faz parte, podendo ocorrer em interpretações pouco precisas. “Talvez o que faltou no trabalho e que agora possa ser desenvolvido melhor seja fazer uma pesquisa quantitativa, buscando avaliar de maneira mais direta como funcionam os recursos e as práticas de inteligência competitiva nas empresas. Mas ainda assim já é um caminho”.

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