Estudo baseado em caos apresenta modelos mais seguros e rápidos de transmissão de informações

Sincronismo caótico melhoraria a comunicação por fibras ópticas, redes Wi-Fi e cabos em rede

Fonte: wiseGEEK

Conforme a tecnologia vai ultrapassando as fronteiras da vida cotidiana, uma quantidade cada vez maior de informações precisa encontrar meios rápidos e seguros para circular pelas redes. Até o presente momento, os códigos responsáveis por sistematizar esses sinais baseavam-se em algoritmos. Pensando numa melhor eficiência, Rodrigo Tadeu Fontes, doutorando de engenharia de sistemas eletrônicos, da Poli, prevê que sistemas baseados em sincronismo caótico possam aos poucos ganhar espaço dentro da comunicação digital. Por mais distante que o soe, o assunto convive conosco todos os dias quando trocamos mensagens pelo Facebook ou WhatsApp, por exemplo. Mas Fontes destaca já de antemão: “Dados criptografados são armazenados em um hardware, e alguém pode tentar extraí-los. No caso de sinais, do ponto de vista da transmissão alguém plantar um receptor e tentar tirar as informações. O sinal não está armazenado.” Sendo assim, como sistemas de comunicação, tantos os algoritmos, quanto o sincronismo caótico têm por função codificar informações de um ponto A (transmissor) para outro B (receptor). E para que a informação possa chegar ao seu destino, é preciso sincronizar os dois lados; a diferença reside na forma e lógica com que os sistemas fazem isso.

Os algoritmos são funções de programação que fazem uma combinação de bits da mensagem a ser transmitida pelo transmissor com uma chave. Essa mesma chave é então enviada por um canal até o receptor. Nesse modelo, as chaves são trocadas constantemente para garantir a segurança dos dados. “Um hacker conseguiria quebrar uma chave ou um esquema de criptografia em um tempo suficiente. Então, troca-se a chave para que ele não consiga decifrá-la em tempo”. No sincronismo caótico, isso já é um pouco diferente, uma vez que todo o processo de codificação baseia-se na teoria do caos. No entanto, como Fontes logo alerta, “às vezes a gente pensa em caos, no dia-a-dia, como algo sem controle, algo aleatório. Na verdade, o sinal caótico é determinístico, é uma função que consigo prever onde estará a cada momento”, basta que alguns parâmetros sejam conhecidos. Só que diferente dos algoritmos, no caos, o sinal é aperiódico, ou seja, não apresenta um padrão de comportamento regular num mesmo intervalo de tempo. O que não significa que o sincronismo seja aleatório, já que seu funcionamento continuará respondendo a uma função. Em outras palavras, o que acontece é que a chave de acesso é, por natureza, alterada continuamente. “Se alguém detectasse a chave, talvez não detectasse a mensagem. E se conseguisse a mensagem, precisaria saber qual função que a gerou, o que não é tão simples de ser obtido.”

Diferenças gráficas entre sinal periódico, aperiódico e aleatório. Fonte: Dummies.

Essas funções nada mais fazem do que gerar cada um dos estados da transmissão no decorrer do tempo. Juntando todos esses estados, temos por fim o mapa da transmissão, que descreve a forma como uma informação se comporta do transmissor ao receptor. Esse é, no entanto, seu funcionamento. Para que alguém consiga, durante o processo, determinar a forma com que a transmissão se apresenta em determinado instante, é preciso conhecer a condição inicial geradora de toda a transmissão. “Se duas pessoas estivessem, nesse exato momento, com a mesma função, e elas escolhessem condições iniciais muito próximas, porém diferentes, ao longo das iterações, elas teriam resultados completamente distintos. Somente conhecendo a condição inicial exata, poderia se ter uma cópia desse sinal”. Isso, do ponto de vista das telecomunicações, é muito positivo para a segurança dos dados.

Para que o processo se complete, ainda é preciso modular (adequar) as informações de acordo com os diferentes canais de transmissão (fibra óptica, cabo de rede, via Wi-Fi, entre outros). Nisso, não há modificação porque a codificação já havia sido feita. Além disso, Fontes comenta sobre a filtragem que se faz, por questões de adequação do sistema de comunicação, e que não apresenta nenhum prejuízo ao dado transmitido. Por exemplo, “a nossa voz captada tem geralmente frequências maiores do que aquela que se transmite. Então filtra-se o sinal de voz, porque o ouvido humano não percebe isso”. Assim, a filtragem se dá justamente para determinação do espectro de frequências desejado, o que é muito importante para o modelo caótico que, por ser um sinal de banda larga – que ocupa praticamente todo o espectro –, raramente seria possível encontrar um canal que suportaria seu tamanho, senão numa banda ajustada.

Gráfico de ruído antes e depois de filtragem. Fonte: Scilab Online Help.

Além da questão de segurança, o sincronismo caótico apresenta também benefícios a questão do espelhamento espectral – que seria exatamente o contrário que os filtros fazem, ou seja, transmitir uma informação numa largura de banda maior que a original: “Quanto mais se espalha o sinal em frequência, menor é a possibilidade de alguém conseguir juntá-los e transformá-los. Ou seja, para eliminar interferências no sinal que se transmite”. O doutorando destaca também que o sinal caótico já está sendo utilizado para processar grandes volumes de dados (big data). Por técnicas conhecidas como compressive-sensing, que utiliza “ruído” no processamento das informações. “Os algoritmos que produzem sinais de ruído podem apresentar problemas para criar uma sequência muito longa. Então, usa-se o sinal caótico para gerar essa parte desse sistema”.

Mesmo com tantas vantagens, as empresas ainda não utilizam o sincronismo caótico por ser um sistema ainda pouco testado e ainda muito restrito a estudos mais teóricos. De fato, para tentarem analisar um tópico em específico, os pesquisadores acabam trabalhando com um canal ideal, mas Fontes explica que procurou, em sua tese, trazer esse sistema para mais próximo do que é encontrado na prática. “A gente usou um canal chamado AWGN, de ruído branco, presente em praticamente qualquer sistema de comunicação, e utilizado para vários modelos e simulações feitos em sistemas convencionais. O ruído branco interfere na recepção do sinal transmitido, impactando na taxa de erro de bits de forma relevante”. Outra interferência importante a ser estudada é quando, dentro de uma mesma transmissão, um símbolo acaba encobrindo o efeito de outro e, consequentemente, causando a perda de informação, a chamada interferência inter-simbólica. Finalmente, é também preciso saber até onde é possível fazer a filtragem e modulação de frequências, de modo que a transmissão não deixe de estar sincronizada: “Se o canal for mais restritivo que a condição que fiz, perde-se a informação do sinal caótico, e não vou conseguir mais que aquela variável passada para o receptor gere a mesma sequência do transmissor”.

Por outro lado, o pesquisador ressalta que as pesquisas estão avançando e destaca três contribuições que desenvolveu em sua tese. Até então, para tratar-se de sincronismo caótico, os estudos baseavam-se e simulavam um único mapa já bem-estabelecido na literatura: o mapa de Hénon, uma das possíveis configurações para sincronismo. A primeira contribuição foi estender esse resultado para qualquer mapa, entender quais são as condições que um sistema precisa cumprir para que o sincronismo exista. Seria possível produzir mapas que respondessem melhor as propriedades desejadas e entregassem resultados mais precisos às simulações. Outro ponto era que os trabalhos no tema utilizavam sinais com largura de banda total. A segunda contribuição foi conseguir fazer esse estudo limitado em banda, que ainda assim sincronizasse e fosse modulável aos canais de transmissão. Nas Telecomunicações, em que a Anatel regula e define todo o espectro de frequências – existem faixas para celular, TV, rádio, satélite, e assim por diante –, um estudo controlado do sincronismo caótico já se mostra mais factível às empresas. “Sei em que frequência esse sinal está, qual é a banda ocupada e, com isso, posso sintonizar o meu sinal e tirar o ruído para melhorar a recepção”.

Fonte: Anatel.

E, por fim, a terceira contribuição diz respeito a dúvida de um sinal, mesmo depois de tantas adições (modulações, filtragem, codificação, e outras coisas), continuar ou não sendo caótico. Para isso, Fontes estudou as condições das mensagens, dos parâmetros dos mapas, dos coeficientes dos filtros, possibilitando, daqui para a frente, a criação de novos modelos diferentes daqueles presentes na literatura. “Verificando alguns trabalhos anteriores, depois de analisar alguns parâmetros, percebeu-se que os sinais transmitidos não eram caóticos, apesar de terem uma forma, até mesmo visual, muito parecida”. Como o doutorando define, o trabalho responde a algumas perguntas, mas levanta outras: “O que acontecerá se usarmos outra função, filtro, mapa, propriedade de outro mapa? Ou novas técnicas, novas modulações, novas equações?” Com essa expansão da área de trabalho, inúmeras técnicas anteriores ao desenvolvimento de sistemas caóticos podem ser agora aplicadas às condições de caos. Frente a infinidade de possibilidades, Fontes destaca uma como talvez a mais importante para que a tecnologia possa começar a ser utilizada comercialmente: “Precisamos colocar esses sistemas em hardware, fazer a transmissão e a recepção, ver quais são os pontos, e aí sim, começar a utilizar em outras aplicações”.

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