Pesquisadoras da USP criam programa remoto de parentalidade e desenvolvimento infantil

Programa mostra como incorporar brincadeiras na rotina diária. Foto: Marcos Santos/USP Imagens

O cuidado infantil é uma das áreas mais antigas e relevantes da enfermagem, apesar de ser pouco conhecida por boa parte da sociedade. Além disso, a negligência com cuidadores e crianças é acentuada em populações economicamente vulneráveis. Visando atender a essa demanda, Katherine Maria Solis Cordeiro e sua orientadora de doutorado, Elizabeth Fujimori, da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EE-USP), desenvolveram a pesquisa Intervenções Remotas de Promoção da Parentalidade e seu efeito na interação cuidador-criança e no desenvolvimento infantil, ganhadora do Prêmio Capes de Teses 2023. A partir dela, foi criado o Programa Brincar Ensina Mudar (BEM), que educa mulheres responsáveis pelo cuidado de crianças de 12 a 23 meses de idade sobre como incorporar as brincadeiras na rotina diária, melhorando, assim, a interação com a criança e seu desenvolvimento.

Com o intuito de apoiar tutores e promover o desenvolvimento infantil saudável, foi criado o Programa BEM. Fundado como parte da tese premiada, sua abordagem é baseada na intervenção remota online e direcionada a famílias de áreas periféricas e socialmente vulneráveis. Encaminhados por meio do WhatsApp, vídeos e mensagens foram usados para capacitar cuidadoras a incentivar a inclusão de brincadeiras em sua rotina doméstica. Conforme comprovado pelos resultados do estudo, essa tática foi benéfica para as pessoas envolvidas. “Investir em programas de parentalidade que apoiem as famílias para o melhor cuidado das crianças contribui para a diminuição das iniquidades e o ciclo intergeracional de pobreza”, conta Katherine.

Na área da saúde, pedagogia e psicologia, o desenvolvimento infantil é visto como essencial a uma vida saudável e uma sociedade funcional. Boa parte da formação de personalidade e do desenvolvimento cognitivo-intelectual ocorre nos primeiros anos da vida de uma pessoa. “A evidência científica já mostrou o impacto dos primeiros anos de vida para o resto da vida. Crianças que são cuidadas por cuidadores responsivos, sensíveis e carinhosos apresentam um melhor desenvolvimento e saúde mental”, afirma a pesquisadora.

Ela destaca a importância dessa fase para além do bem-estar infantil:  “Isso terá impacto no resto da vida pois serão crianças com maior possibilidade de concluir a escola e ensino médio, ter uma formação universitária e melhores empregos, terão menos possibilidade de se envolver em condutas delitivas e melhor saúde mental. A infância é uma etapa da vida com necessidades próprias que devem ser atendidas. São seres em desenvolvimento que precisam de cuidado, guia e atenção”.

De acordo com Katherine, considerando as demandas específicas e necessidade de auxílio características da infância, deve-se haver cuidado e atenção com os pais e tutores. A participação ativa, uso de brincadeiras e criação respeitosa são essenciais para o desenvolvimento da criança e do laço tutor-criança. Apesar de tamanha importância, existem muitos obstáculos à parentalidade. O mais importante é a vulnerabilidade socioeconômica: “Famílias sob condições de vulnerabilidade social apresentam menos interações com as crianças, em qualidade e quantidade. Principalmente pobreza, baixo nível de escolaridade dos cuidadores, desemprego, saúde mental materna e violência afetam diretamente a capacidade do cuidador de se envolver em interações com a criança”. Além das dificuldades na vida dos pais, existem também impactos negativos mais diretos. “As crianças que vivem sob essas condições apresentam maior risco de apresentar atrasos no desenvolvimento pelo impacto negativo do estresse tóxico no desenvolvimento cerebral. Porém, cuidadores atenciosos, carinhosos, sensíveis e que não usam violência podem proteger o cérebro da criança do impacto negativo dessas condições adversas”.

O cuidado com o desenvolvimento infantil e parentalidade é de interesse público, não apenas da área da saúde. Adicionalmente, algumas ideias populares sobre o papel de tutores e pais também atrapalham essa fase. Segundo Katherine, a pior delas é “achar que a parentalidade é inata. Pais, mães e pessoas responsáveis pelo cuidado das crianças precisam de conhecimentos, motivação e acompanhamento para cumprir com a complexa tarefa de cuidar de crianças”. Afinal, “se queremos sociedades mais saudáveis e exitosas devemos começar por garantir a satisfação das necessidades das crianças.”

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