Desde a descoberta de que a superfície da Terra é constituída por placas tectônicas, a ciência procura explicações sobre os deslocamentos dos blocos continentais no passado. A teoria da Deriva Continental propõe um anterior encaixe entre os continentes e tem como um de seus pilares a similaridade geométrica entre as costas leste da América do Sul e oeste da África.
Mesmo que grandes avanços tenham sido feitos no campo da paleogeografia, a reconstrução precisa das placas na região de abertura do Atlântico Sul ainda é um desafio. Pelo fato do encaixe não se dar perfeitamente a partir de dois blocos continentais rígidos, modelos com subdivisões – denominadas sub-blocos litosféricos – passaram a ser elaborados. “Eles fornecem um encaixe melhor, mas a deformação interna das placas também é sujeita a algum tipo de controvérsia: onde você vai colocar a deformação?”, diz Ricardo Ivan Ferreira de Trindade, diretor e professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG).
A pesquisa Evolução cinemática da abertura do Atlântico Equatorial, desenvolvida pela doutoranda em Geofísica Juliana Fernandes Bonifacio e orientada por Trindade, busca investigar antigas e novas configurações de encaixes geométricos das costas. Partindo de amostras geológicas obtidas no Nordeste brasileiro – último ponto de união entre as placas sul-americana e africana –, o projeto também planeja identificar quais são os modelos cinemáticos existentes mais adequados.
Para os métodos de análise, o estudo utilizou técnicas de paleomagnetismo, que se baseiam em obter, a partir de certas rochas, a orientação do campo magnético no passado distante. “A partir disso, sei que as rochas vão apontar para o Norte, como se tivesse uma micro bússola dentro delas”, comenta Ricardo. Ele explica que, ao conhecer a orientação da placa no passado, é possível reconstituir seus deslocamentos e rotações, informação essencial para compreender em que momento e de que forma os continentes se separaram.
Após os processos de coleta e datação, as amostras são levadas para o laboratório e passam por um magnetômetro criogênico, instrumento capaz de medir o magnetismo das rochas. Elas também são aquecidas nos chamados fornos paleomagnéticos, que permitem resgatar o magnetismo fóssil da Terra, ou seja, a intensidade e a orientação do campo magnético de quando a rocha foi formada.
Soluções e aplicações
“Quando obtemos os resultados, é apenas uma parte do trabalho. A segunda parte é entender o que eles significam de fato”, diz o professor. Além das análises de amostras geológicas, a pesquisa também utilizará os dados de laboratório para buscar modelos cinemáticos que melhor explicam a ruptura continental entre a África e a América do Sul.
Com modelos datados desde a década de 1960, espera-se classificar aqueles que, utilizando os dados paleomagnéticos, concordam com as novas evidências e quais não são mais apropriados para uso científico. “O paleomagnetismo dá uma informação que é absoluta, ou seja, o campo magnético é o mesmo em qualquer lugar. O Norte é o mesmo para todo o mundo”, afirma o pesquisador ao ressaltar a eficiência dos métodos de avaliação adotados.
Pelo fato das placas tectônicas não se comportarem de forma sólida, o pesquisador comenta que o maior desafio agora é entender melhor as estruturas dos sub-blocos litosféricos em cada continente. Mesmo que não seja possível eliminar tantos modelos devido a complexidade nas deformações internas das placas, que exigem estudos mais aprofundados, a pesquisa de Juliana deixa o professor Ricardo com expectativas para importantes avanços em uma das questões mais fundamentais da Geologia. “Poder trabalhar com um problema tão antigo da tectônica de placas e contribuir para a solução dele é muito gratificante”.
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