Em sua dissertação de mestrado, apresentada no Instituto de Oceanografia (IOUSP), o oceanógrafo Lucas Citele caracteriza o geohabitat de fundo ao redor do Parque Estadual Ilha Anchieta (PEIA) e sua relação com a ictiofauna. Neste processo de mapeamento, o trabalho observou a presença de mais de 280 espécies que apresentam risco de extinção na ilha. O estudo foi capaz de concluir mais uma vez a importância ecológica da região, tanto para a conservação de espécies, quanto para a manutenção do estoque pesqueiro.
O PEIA foi originalmente ocupado por povos indígenas e é localizado no município de Ubatuba. No parque, foi formada uma comunidade Caiçara, que foi expulsa da região pelo Estado para a construção de um presídio, no ano de 1904. Esse foi o prenúncio de uma relação conflituosa com as comunidades da região, prolongada ao longo dos anos. Em 1955, a Secretaria de Segurança do Estado passou a administração da área à Secretaria do Meio Ambiente, criando-se, assim, o parque como hoje é conhecido: uma unidade de conservação. “Essa unidade de conservação é terrestre, então não tem uma restrição de uso do ambiente marinho. Mas, associado a isso, em 1983, a Superintendência do Desenvolvimento de Pesca criou o polígono de interdição de pesca, tornando ilegal a atividade na ilha”, comentou Lucas. A partir disso, as comunidades que residem na região foram proibidas de pescar na Ilha Anchieta e muitos de seus membros, ainda hoje, continuam sem entender os porquês. O trabalho do oceanógrafo consegue trazer uma elucidação acerca da importância ecológica e econômica do parque estadual.
Manutenção de espécies
A Ilha Anchieta é caracterizada por dar resguardo para algumas espécies que não são encontradas em outras áreas. Algumas espécies de cunho comercial são facilmente encontradas na ilha, por exemplo, não sendo avistadas em quantidade significativa em outras regiões que tenham a pesca liberada. “Meu trabalho pode potencializar essa visão de produção econômica para além dos limites da unidade de conservação”, reiterou Citele.
O estudo, além da importância econômica da região e sucesso no turismo ecológico, mostrou a descoberta de um grande banco de algas no PEIA. Ainda não se tinha nenhum registro desse banco na região de Ubatuba. Por meio de imagens foi possível mapear e georreferenciar o banco de algas, mas não foi possível reconhecer quais as espécies que o formam. “As algas são produtores primários e estão na base da teia trófica, então as espécies acabam se alimentando delas diretamente, além de servir de abrigo para outros indivíduos. Essa área é provavelmente um grande hot spot da diversidade e de sustentação da teia trófica. Então, nela, os herbívoros, vertebrados ou invertebrados, se alimentam, servindo de alimento para espécies maiores, o que sustenta essa teia”, disse o estudioso.
O entorno marinho da Ilha Anchieta já é protegido há mais de 40 anos, sendo proibida a atividade de uso direto de recursos dessa região. O parque é um local que tem uma gestão efetiva, com fiscalização e cuidados reais com a área. Assim, foi permitido que muitas espécies pudessem se utilizar da ilha para alimentação, reprodução e crescimento, ajudando na povoação de outras regiões.
Lucas trabalhou durante 7 anos no parque e comentou que, na prática, muitas espécies, que são de interesse comercial e juvenis, não eram mais encontradas após certo tempo após seu nascimento no parque. Concluiu-se que a Ilha Anchieta serviria como berçário para outros habitats marinhos. A partir de seu estudo e entendimento sobre a região tratada, o trabalho foi além do mapeamento da ilha e possibilitou um respaldo científico da importância da manutenção da área, em seus aspectos sociais, econômicos, ecológicos e históricos.
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