Fragilidade das instituições econômicas foi determinante para crise na Argentina

Pesquisa compara políticas adotadas no Brasil e na Argentina no início dos anos 2000 sob a ótica do populismo econômico

Marcha contra a desigualdade social em Buenos Aires. 2016. (Foto: Flickr)

Os cenários socioeconômicos do Brasil e da Argentina são profundamente distintos em 2023. Enquanto o Brasil registra suas menores taxas de desemprego desde 2014 e mantém a inflação controlada, a Argentina vive uma das piores crises econômicas de sua história recente. 

De acordo com Rafael Baldrighi, mestre em relações internacionais pela Universidade de São Paulo (USP), a fragilidade das instituições econômicas da Argentina é um fator determinante para o problemático quadro econômico atual. Sua dissertação de mestrado intitulada Repensando o populismo econômico na América Latina: um desenho most-similar para consolidação institucional no Brasil e na Argentina durante a Onda Rosa foi defendida em 2022, no Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP. 

Com a orientação da professora Maria Antonieta Del Tedesco Lins, Baldrighi tinha como objetivo adequar ao presente o conceito de populismo econômico, popularizado por Dornbusch e Edwards no final da década de 1980. 

“O populismo econômico representa uma série de políticas que tendem a enfatizar o crescimento da economia e a redistribuição de renda. Ao mesmo tempo, essas políticas ignoram aspectos como a inflação, o endividamento público, as restrições que o cenário externo coloca para o cenário interno de um país e a reação racional dos agentes econômicos”, explica Baldrighi.

Segundo ele, o conceito foi elaborado a partir da observação de um ciclo comum de crescimento econômico, seguido de crises em diferentes países do continente latino-americano ao longo do século 20. Já no final dos anos 1990 e início dos anos 2000, ocorreu na América Latina a chamada Onda Rosa – fenômeno marcado pelo surgimento e ascensão de governos de esquerda ou centro-esquerda em diversos países do continente.

Ainda que as correntes ideológicas do Brasil e da Argentina fossem semelhantes, os governos agiram de forma distinta sobre o sistema de freios e contrapesos, que foi fortalecido no Brasil e enfraquecido na Argentina. “Boa parte da proteção à estabilidade macroeconômica que existia foi implodida pelos governos argentinos, sobretudo no governo da Cristina Kirchner, mas já vinha desde os anos 90 no governo Menem”, afirma.

Cristina Kirchner ao lado de Nestor Kirchner durante cerimônia de posse na Casa Rosada. 2007. (Foto: Wikimedia Commons)

Para Baldrighi, enquanto os mecanismos de proteção macroeconômica foram fragilizados na Argentina, com aparelhamento do Banco Central e até mesmo fraude nos dados de inflação, o Brasil adotou uma postura mais pragmática. Do período analisado até os dias de hoje, o país consolidou a autonomia do Banco Central, instituiu a lei de responsabilidade fiscal e desenvolveu programas capazes de criar uma rede de proteção a bancos e ao sistema financeiro. 

“A conclusão é que o Brasil está mais preparado para choques internacionais ou má administração da economia do que a Argentina. Aqui o país sobrevive, mas na Argentina cria-se um caos, como foi no início dos anos 2000 e como está agora. As taxas de inflação são as mais altas desde os anos 1990 e o país caminha para um cenário de colapso macroeconômico se nada for feito para reverter essa situação”, destaca.

Crise perpétua

A crise argentina parece estar longe do fim. No último levantamento divulgado pelo Indicador Nacional de Estatística e Censos (Indec), a inflação do país chegou a 142,7% ao ano. O mês de setembro teve o maior índice de 2023, com uma alta de 12,7%. Para efeito de comparação, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado dos últimos 12 meses no Brasil é de 4,82%.

Com esperança de encontrar alguma solução para este cenário, o povo argentino elegeu Javier Milei para a presidência do país com cerca de 55% dos votos. O futuro presidente se identifica como libertário, e pretende dolarizar a economia do país. Para Baldrighi, a própria eleição exemplifica a fragilidade das instituições do país. “É difícil dizer se o Milei vai conseguir realizar ou não suas propostas para a economia Argentina, mas existem menos mecanismos de freios e contrapesos do que no Brasil”, ressalta.

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