Imagine, depois de algumas semanas com Covid-19, perceber que você ainda não sente o gosto da sua comida preferida e nem o cheiro do café coado pela manhã. Isso foi o que aconteceu com a autônoma Claudia Luciana Cleto e com muitos outros pacientes por todo o mundo. Esses casos fazem parte daquilo que se chamou de “covid longa”. Pensando nisso, pesquisadores da Faculdade de Odontologia (FO) da USP mostraram que o tratamento com laser é capaz de ajudar na recuperação do paladar e também do olfato.
A aplicação de laser de baixa frequência na região interna da boca acelera a cicatrização dos tecidos e resulta em melhoras significativas no paladar, conforme defendeu Pedro Cardoso Soares, em seu mestrado, orientado pela professora Luciane Hiramatsu Azevedo. Para a pesquisa, ele recebeu inscrições de pessoas que gostariam de passar pelo tratamento e selecionou aquelas que atendiam aos requisitos.
Os 37 participantes foram divididos em grupos e realizaram oito sessões cada com diferentes tipos de lasers. Durante o processo, eles eram avaliados sobre a melhora, ou não, sentida nos gostos amargo, doce, salgado e azedo, além das melhorias no olfato. Ao final, constatou-se que o laser é uma alternativa que pode auxiliar na recuperação dos sentidos de forma não invasiva, com baixa complexidade, baixo custo e sem efeitos adversos.
Claudia Luciana conta que, depois que foi infectada pela covid-19, passou por quase dois anos sem olfato e paladar: “foi horrível”. A autônoma relata ter tomado vários tipos de chá e até feito aromaterapia, mas nada funcionou. Claudia, então, ficou sabendo do tratamento oferecido pelo Laboratório Especial de Laser em Odontologia da FO e resolveu participar. “Fiquei surpresa de como uma luz vermelha pode otimizar e fazer voltar a sentir o sabor e os odores”. “Gostaria que esse relato fosse a público, porque existem muitas pessoas que mal sabem dessa alternativa e que sofrem como eu sofri.”
Soares avaliou duas principais hipóteses para a perda do paladar, que afetou parcela dos pacientes. A primeira seria a de que o vírus SARS-CoV-2, responsável pela covid-19, danifica as células da língua da pessoa infectada e, por consequência, a função de perceber o gosto dos alimentos. A outra possibilidade levantada é de que o vírus entra em no corpo e aciona o sistema imunológico. Esse sistema pode começar a reconhecer estruturas do próprio corpo como invasoras e atacar diferentes órgãos — como língua, nervos e, até mesmo cérebro —, gerando a alteração na percepção do paladar.
O olfato, apesar de não ter sido o foco da pesquisa, também apresentou melhora para a maioria dos pacientes, o que pode ser explicado por um possível efeito sistêmico causado pelo laser. Soares esclareceu que o gosto das coisas não é apenas captado pela língua, o olfato tem grande participação nesse processo. A soma dos dois sentidos forma o gosto dos alimentos consumidos. Isso faz com que as pessoas que tiveram perda parcial ou total do paladar e do olfato passem a se alimentar pior, pela falta de apetite. Outra preocupação em relação à dificuldade de sentir cheiros é o perigo que elas podem estar expostas. Sem o faro, não há como reconhecer vazamentos de gás, incêndios, produtos químicos ou até alimentos estragados.
O pesquisador explicou que uma das principais dificuldades em realizar esse trabalho foi o financiamento, por ter sido desenvolvido no período de contingenciamento de recursos estaduais e federais. Em seguida, também exaltou o potencial científico no Brasil: “Há muita qualidade da ciência brasileira, mesmo com a limitação de recursos.”
Como participar?
O Laboratório Especial de Laser em Odontologia ainda recebe inscrições de pessoas que tenham perdido o paladar ou olfato e queiram passar pelo tratamento, de forma gratuita. Todas as informações podem ser acessadas neste link.
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