Estudo da Escola Politécnica da USP traz visão inovadora sobre os caminhos para a sustentabilidade no garimpo de ouro

Tese de doutorado do engenheiro de minas Carlos Henrique Xavier Araujo utiliza ciências sociais e exatas como forma de analisar os desafios técnico-sociais da sustentabilidade no garimpo de ouro na Amazônia Brasileira

Pesquisa de campo de Carlos Henrique Xavier Araújo [Foto: Arquivo pessoal/Carlos Henrique Xavier Araújo]

O garimpo no Brasil é uma antiga atividade econômica, com seus primórdios no período colonial. Inicialmente concentrada na região de Minas Gerais, a descoberta de minas de ouro e diamantes atraiu milhares de pessoas em busca de riquezas e ainda contribuiu para o povoamento do país. Logo essa prática se espalhou para outras regiões ricas em bens minerais, como a Amazônia Brasileira, que possui grande concentração de ouro.

Na segunda metade do século XX, entre os anos 1970 e 1980, com a crise do petróleo, o preço real do ouro subiu, ocasionando uma intensa corrida pelo ouro no território amazônico. De 1985 para 2020, a área atingida pela atividade garimpeira passou de 7,45 quilômetros quadrados (km²) para 102,16 km², segundo um estudo do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e da Universidade do Sul do Alabama, dos Estados Unidos,

Com o crescimento da atividade garimpeira, os impactos dessa prática se acentuaram. A crise sanitária e humanitária do povo indígena Yanomami é um dos exemplos das consequências do avanço do extração ilegal do ouro sobre a Amazônia.

Entretanto, há pesquisas e grupos de estudo que demonstram a existência de garimpo com práticas responsáveis. Esse é o caso da tese de Doutorado “Análise dos desafios sociais e técnicos para transformações voltadas à sustentabilidade no garimpo de ouro na Amazônia Brasileira”, de Carlos Henrique Xavier Araujo. 

A pesquisa do engenheiro foi dividida em dois estudos de campo: o primeiro foi realizado no distrito de Lourenço, do município de Calçoene, no estado do Amapá, que é uma região centenária onde há uma comunidade remota dependente da extração do ouro; já o segundo, com o objetivo de entender a relação entre a Rodovia Federal BR-163 e o garimpo de ouro, foi elaborado a partir do percurso entre o estado do Mato Grosso e Santarém do Pará.

Carlos explica que o garimpo de ouro é um universo heterogêneo, ou seja, com diferentes pessoas e práticas. Ao mesmo tempo em que há altos níveis de extração ilegal de ouro, há comunidades e cooperativas de garimpeiros que promovem uma atividade lícita, mas que ainda sofrem com muita precariedade. “O garimpo de ouro ainda é muito marginalizado, mas existem diversas camadas. Dar voz para essas pessoas, conversar com elas e trazer seus pontos de vista é fundamental para a ciência, porque não estamos mostrando apenas um lado. Temos que mostrar todos os lados”, explica o pesquisador.

Com o objetivo de achar novas soluções para a precariedade do setor do garimpo de ouro, o doutorando se aprofundou em diferentes áreas que pudessem trazer uma visão transformadora voltada à sustentabilidade nos aspectos sociais, técnicas, ambientais e políticas desta problemática. “Tem um fator diferente no meu projeto que foi a transdisciplinaridade, ou seja, o contato com pessoas de áreas não acadêmicas para buscar respostas. Conversei com pintores e fotógrafos, por exemplo, porque através da arte, da pintura, da fotografia, você consegue captar dados”, afirma Carlos.

O pesquisador definiu cinco pontos de análise em seu estudo: mobilização, política, organização, inovação e responsabilidade. Ele aponta que entender o papel do Estado e do setor privado e mobilizá-los para solucionar os problemas do garimpo de ouro e mudar sua imagem marginalizada é essencial. “A política tem um papel muito atuante nesse processo de transformação, que é ajudar as cooperativas garantindo um apoio técnico permanente. O ponto focal também tem que ser o investidor do garimpo, o dono. É ele quem tem o poder financeiro, para por exemplo recuperar áreas degradadas e melhorar as condições de trabalho. Ele deve ser o principal ator nesse processo de mudança, mas também não podemos esquecer o papel do Estado, dos centros de pesquisa e das universidades”.

Carlos explica que é necessário não apenas apontar o problema, mas também buscar as soluções em conjunto, a partir dos pontos de vista de diferentes pessoas. “Acho que o principal ponto da minha pesquisa é desmistificar a imagem marginalizada do garimpo, não colocar todos os envolvidos na mesma atuação. Eu quis mostrar que se queremos pensar em uma transformação no garimpo de ouro no Brasil, ela deve ser feita pela educação. É pelo incentivo à inovação, mas também pela busca dos responsáveis e da mobilização dos atores da política. Acredito que a sociedade brasileira está cobrando da ciência respostas urgentes”.

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