Pesquisadores descobrem nova ação de proteína em mitocôndrias de células cerebrais

A proteína NCLX era uma velha conhecida dos neurocientistas, mas pesquisa demonstrou que ela tem grande papel na capacidade cognitiva

Cultura de células de neurônios corticais em astrócitos de rato. Os neurônios foram coloridos em vermelho e os astrócitos em verde. [Imagem: Reprodução/ Wikimedia Commos]

O trabalho de João Victor Cabral Costa, pesquisador da área de bioquímica e neurociência, é uma parte da busca por entender o funcionamento do nosso organismo, mais especificamente, do nosso cérebro. Com uma pesquisa voltada à ação da proteína NCLX em astrócitos, o pesquisador observou que a proteína pode modular o metabolismo da glicose nas células, afetando diretamente a capacidade cognitiva.

O nosso corpo tem um combinado de reações químicas acontecendo a todo momento, produzindo energia, produtos e subprodutos. No entanto, ainda não conseguimos entender todas as reações, proteínas e células envolvidas no funcionamento do nosso organismo. De pouco em pouco vamos elucidando cada vez mais a química do corpo, do microscópico ao organismo.

A NCLX é uma proteína localizada na membrana das mitocôndrias, que só foi descoberta em 2012. Mas sua função já era conhecida desde a década de 1960: regular ativamente a entrada e saída de cálcio das mitocôndrias. “O cálcio é importante para vários processos celulares”, conta Costa. “O cálcio em si ativa várias vias metabólicas mitocondriais e extra-mitocondriais também”, explica. 

Depois de 2012, muitos estudos surgiram para entender melhor como a proteína funcionava. No coração, por exemplo, a capacidade de colocar o cálcio para fora da mitocôndria é um importante fator para energia do cardiomiócitos – as células do músculo cardíaco. 

Mas o estudo da ação da NCLX no cérebro começou pelos neurônios. Entre as pesquisas feitas, uma analisou uma família no Paquistão com uma mutação genética que causou mau funcionamento na proteína. “Ela [a proteína NCLX] não funciona direito e isso está associado a déficit cognitivo. Várias pessoas dessa família tinham déficit cognitivo. Isso levou a um estudo com neurônios”, relata Costa.

Entretanto, não existiam estudos voltados para os astrócitos, as células mais abundantes do sistema nervoso, e que desempenham diversas funções, como a de garantir substrato para o metabolismo do neurônio. 

Inovações no estudo

Durante a pesquisa, Costa pôde constatar que tanto em culturas de células quanto em camundongos – ao contrário do que acontece com os neurônios – com a inibição da NCLX, os astrócitos produziam mais lactato, o que aumenta a capacidade cognitiva, uma vez que há mais lactato para os neurônios. “Parece que essa proteína pode funcionar como um ajuste fino, como um centro de operações de metabolismo. Precisa de mais ou menos energia, como é controlado, parece que ela tem um papel ali internamente” relata Costa. 

Assim, uma das principais descobertas da pesquisa foi trazer mais evidências para a Teoria da Lançadeira de Lactato. Porém, além de contribuir com mais um indicativo da plausibilidade da teoria, a pesquisa também demonstrou que a NCLX pode ser um possível ponto de controle da lançadeira de lactato. 

A teoria da lançadeira de lactato diz que há um acoplamento de metabolismo entre neurônios e astrócitos, em que o lactato produzido como um subproduto da produção de energia dos astrócitos é usado pelos neurônios. “Ela [a teoria] começou como uma hipótese na década de 90 e foi muito criticada”, explica.

Os horizontes para a pesquisa

O estudo está no campo das pesquisas básicas, o que significa que não há necessariamente uma aplicação prática para ela, mas é feita para aumentarmos o conhecimento sobre um assunto. “São tijolos pra gente poder construir conhecimento quanto sociedade”, diz Costa. 

No entanto, tanto o cálcio como as mitocôndrias têm relação – de causa ou consequência – com doenças como epilepsia e esquizofrenia. Dessa forma, a pesquisa contribui com o entendimento e abertura de novos caminhos e opções, não apenas para pesquisas como para tratamentos. 

O mesmo acontece com doenças neurodegenerativas, como é o caso da doenças de Parkinson e Alzheimer, em que, outras pesquisas já mostraram relação entre a existência da doença e baixos níveis de NCLX. A pesquisa básica, nesse caso, abre uma série de alternativas para pesquisadores, profissionais da saúde e pacientes. 

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