Encontro interétnico entre crianças é foco de pesquisa de mestrado

Rede de Apoio funciona como ponte para contato entre acadêmicos e comunidades indígenas

Opam do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo [Imagem: Arquivo Pessoal/Christina Moretti]

Os indígenas brasileiros possuem uma história, cultura e tradição ricas e que contribuíram muito para a formação do Brasil. Toda essa vastidão acaba por se tornar objeto de estudo valioso para diferentes áreas do conhecimento.

Nesse sentido, o Instituto de Psicologia (IP) da Universidade de São Paulo (USP) busca desenvolver estudos sobre a população nativa do Brasil. Para tanto, foi criada a Rede de Atenção à Pessoa Indígena, cuja função é articular o diálogo, através de atividades práticas e reflexivas, entre as comunidades indígena e acadêmica .

Christina Moretti analisou, em sua dissertação de mestrado, defendida no Instituto, o encontro promovido pela Rede entre crianças guarani e não indígenas. 

“O contato foi feito na USP, por ser um território neutro onde há uma opam, casa de reza guarani. Então, as crianças guarani sentiram que havia uma representação”, conta Christina. “As crianças trocavam vídeos, que mostravam as escolas e a aldeia, e cartas perguntando sobre o que faziam ou hobbies”.

Ao descrever o encontro, a pesquisadora conta que, “em um primeiro momento, as crianças chegavam, apresentavam-se e havia um educador indígena. Em seguida, falaram um pouco sobre a cultura, tocaram algumas músicas e depois abriram para perguntas. Após isso, as crianças apresentavam brincadeiras umas com as outras e houve o momento do lanche. Por fim, deixamos um momento livre para eles interagirem da forma que quisessem para que fosse algo espontâneo.”

Christina criou um questionário, cujas perguntas contemplavam questões sobre preconceito e estereótipos, para ser aplicado antes e depois do encontro e traçar um comparativo, visando analisar se as crianças entenderam e absorveram os conteúdos do encontro, já que o foco também era trazer a visibilidade e a realidade de hoje, e não aquela que está nos livros.

Assim, o entendimento sobre a perspectiva dos indígenas é fundamental para que os estudos e os materiais didáticos deixem de lado todo o eurocentrismo — viés que coloca a Europa como protagonista do mundo e ignora os outros pontos de vista na historiografia — empregado na história. Para superar esse cenário, o diálogo entre os pesquisadores e os indígenas é instrumento essencial na construção de uma narrativa diversificada.

Maicon Tchaka, índigena guarani que colabora com a rede, conta um pouco sobre o cenário da educação dos jovens nas aldeias: “As crianças frequentaram a escola formal por alguns anos, mas pararam de ir por sofrerem preconceito e pela dificuldade de acesso, já que a van não chega onde moramos. As crianças tinham que ir e voltar a pé, à noite, o que era perigoso. Por isso, as crianças pararam de frequentar”.

Tchaka explica que, diante deste cenário, eles mesmos tiveram a ideia de dar aula dentro da aldeia, para as crianças esquecerem essa situação difícil. Foi nesse momento que os indígenas tiveram contato com profissionais da USP, que os ajudaram a criar um projeto para a Diretoria de Ensino da Região Sul 3 da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo construir uma escola na aldeia, que até hoje não foi construída. 

“Os indígenas sempre vão lutar por seus direitos”, afirma Tchaka. “Estamos de portas abertas para as pessoas conhecerem a aldeia, nossa cultura, o nosso dia a dia e as dificuldades sobre a demarcação de terras e as lutas com o pessoal da secretaria”.

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