A chegada da pandemia do novo coronavírus trouxe desordem e dor ao Brasil, mas também iniciativas de ajuda ao próximo, mais atenção à ciência e novos estudos capacitados à prática além do tocante a Covid. Marcelo Finger, professor titular de ciência da computação do IME (Instituto de Matemática e Estatística) e pesquisador principal do Centro de Inteligência Artificial, coordena o Estudo Spira, capaz de diagnosticar e triar pacientes com insuficiência respiratória por Covid e promete avançar os estudos para outras doenças.
Com a necessidade de ajudar profissionais de saúde e avançar na luta contra a pandemia, Finger e sua equipe decidiram, após sugestão de Ester Sabino, pesquisadora e professora da USP, conhecida, principalmente, pelo sequenciamento do genoma do novo coronavírus no Brasil, criar uma ferramenta de avaliação de áudio que fizesse a triagem dos pacientes. Primordial ao diagnóstico da Covid, o interesse da identificação de áudio foi a de esclarecer o grau da doença e, assim, a conveniência do paciente ir até o hospital. É válido lembrar que o início da pandemia foi marcado por hospitais com superlotação e escassez de instrumentos de trabalho médicos. Além do uso dos espaços sem necessidade, um paciente que deveria repousar em casa também poderia contaminar outras pessoas indo, sem urgência, a um posto ou hospital.
O processo para a determinação do grau de contaminação começa, portanto, na gravação da respiração através do próprio telefone do paciente. Depois de enviado, o áudio fica em um banco de dados até que seja transferido para o software que fará a análise. Na identificação de Covid sem complicações, o paciente é recomendado a repousar e cuidar dos sintomas de maneira semelhante à que cuidaria em uma gripe comum. A coleta de dados para a pesquisa foi realizada de maneira tão simples quanto a que o paciente faz em casa. Com grande urgência em hospitais e sem a permissão para fazer a coleta na triagem de pacientes, os próprios alunos e integrantes da pesquisa, devidamente paramentados e protegidos, fizeram a coleta com seus celulares no covidário, ala restrita à pacientes com Covid-19, sem grande assistência técnica sonora.
A gravação de voz dos pacientes foi feita, em um primeiro momento, com a leitura de duas frases, a primeira delas muito simples: “aceito”, uma autorização falada que permitia a voz do paciente no estudo, de forma que, em um momento de fácil transmissão do vírus, não fosse preciso movimentação de papelada. A segunda, criada por linguistas, foi sustentada pela intuição de que as pausas seriam a chave para determinar o grau de comprometimento respiratório em que estava o paciente: “O amor ao próximo ajuda a enfrentar esse momento com a força que a gente precisa”.
Uma frase estranha, com pausas bem definidas e que no fundo pode fazer sentido. A intuição sobre a folga entre as palavras estava certa. Por isso, o Estudo Spira ficou em primeiro lugar no Simpósio Brasileiro de Fonoaudiologia, com a pausa como biomarcador.
A técnica do biomarcador a partir da voz é nova, uma avaliação do estado de saúde com baixa interferência que, na segunda fase do estudo procura avançar os estudos além da Covid-19, procurando reconhecer insuficiência respiratória em outras doenças. O estudo já alcançou 97% de precisão no diagnóstico, é barato e aparelhos sofisticados não são necessários. No entanto, nenhum teste clínico chegou a ser feito, assim, ainda não se sabe até onde a ferramenta pode ajudar os profissionais de saúde, mesmo com sua eficiência comprovada.
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