Pesquisadora busca entender a desigualdade social a partir de Manuel Bomfim

Estudo resgata teses defendidas pelo autor e lança luz sobre questões históricas que perduram até hoje

[Imagem: Reprodução/Domínio Público]

Se ainda hoje em dia a discussão sobre desigualdade social e imperialismo é feita em pesquisas científicas ou em conversas com falta de embasamento, séculos atrás o assunto era popularizado em uma era de neocolonialismo, cientificismo e de uma extrema assimetria entre os povos e nações. Nesse contexto, alguns pensadores se destacaram por seus trabalhos irem na contramão da ordem estabelecida. No Brasil, esse é o caso de Manuel Bonfim, resgatado em trabalho recente.

Mestre pelo Instituto de Psicologia (IP) da Universidade de São Paulo (USP), Jéssica Lima defendeu, recentemente, sua dissertação de mestrado, intitulada Parasitismo e Desigualdade Social na Psicossociologia de Manuel Bomfim. A pesquisadora conta que escolheu esse tema por “sentir falta de discussões aprofundadas em sua área acerca da origem social do Brasil. Assim, partindo da sociologia, com o tempo e orientação, consegui trazer a questão para o campo da psicologia”.

Para contextualizar, Jéssica conta que Bomfim “é um autor que se forma em medicina, mas acaba por se decepcionar com a área, o que o leva a outras. Após realizar mestrado na França, ele retorna ao Brasil e funda o primeiro laboratório de Psicologia, voltando-se à questão educacional e de como os estrangeiros enxergam o país, ainda mais no contexto do Darwinismo Social e de racismo”.

Ao estudar o trabalho de Bonfim, para a mestranda, “a questão do parasitismo foi a mais importante, principalmente no livro A América Latina: Males de Origem, no qual a partir dessa tese o autor contrapõe as ideias organistas de que os problemas da América Latina estavam ligados à sua constituição racial”. Jéssica conta, ainda, que Manuel entendia que, na verdade, essas questões possuem origem no colonialismo parasitário sobre os povos originários, que culminou de forma definitiva na escravidão.

Em seu trabalho, a pesquisadora também aborda como as “Ciências Sociais no Brasil vão abraçar muitos o discurso do Gilberto Freyre e de outras pessoas que vão sair da ideia do racismo e ir para o culturalismo científico, que é uma forma de olhar culturas ‘superiores’, e de uma certa forma, vão dizer que o externo é melhor”. 

Assim, “Manuel não nega a questão da escravidão, pelo contrário, ele traz toda a história de depredação e da rapina que foi feita aqui pelos parasitas. Assim, os parasitados estão enfraquecidos moralmente, e o autor explica os efeitos desse sistema em vários aspectos, como o econômico e moral da sociedade”, conta Jéssica.

No que se refere às questões de desigualdade social, a mestranda conta que para o autor “os principais responsáveis pelas mazelas são os dirigentes, que não estão preocupados com o que acontece com a população. Pelo contrário, eles incentivam a precarização do trabalho e o tipo de produção, que retira tudo o que há na terra”. 

Por fim, Jéssica conta que o autor conclui que a única forma de superar esse quadro é através da educação, quando as pessoas tomam consciência desse lugar e se fortalecem enquanto sociedade para ter uma relação mais amistosa com o meio”.

Entretanto, ainda que com um ótimo trabalho de pesquisa, Bomfim não foi aceito na época. “Muitos discursavam contrários às ideias de Manuel.Bonfim. O mais conhecido deles é Sílvio Romero, que escreveu um livro refutando o trabalho realizado. Assim, havia muita resistência dos intelectuais, que estavam alinhados com as ideias eugenistas do Darwinismo Social”.  

Por fim, como os temas debatidos pelo autor ainda ocorrem com frequência no debate contemporâneo, Jéssica acredita que “Manuel Bomfim é muito atual, e exatamente por isso tem sido bastante retomado, e não apenas na psicologia, mas principalmente na sociologia e na história, por ser um autor múltiplo”.

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