Meditação, leitura, jogos de tabuleiro e exercícios físicos podem ajudar na melhora da ansiedade, da depressão e da dor crônica, de acordo com revisão de estudos feita por pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP. As três doenças estão relacionadas: a dor causa estresse que pode desencadear depressão e ansiedade, e vice-versa. Os desdobramentos delas em conjunto são piores do que se as três não ocorressem ao mesmo tempo, além de que a coexistência pode reduzir a adesão e a resposta a tratamentos farmacológicos.
Segundo a professora Rosana Camarini, chefe do Departamento de Farmacologia, “o tratamento farmacológico da dor crônica isoladamente ainda é insatisfatório e a OMS preconiza estratégias não farmacológicas para seu manejo junto à administração de medicamentos”. Por isso, intervenções alternativas são investigadas.
As práticas citadas no início do texto, somadas à vivência em um ambiente com desafios, novidades e estímulos sensoriais, compõem a estratégia denominada enriquecimento ambiental. Essa técnica não possui efeitos colaterais e é de baixo custo. Sua influência e seus possíveis benefícios na melhoria das condições patológicas são debatidos nos estudos revisados pelo artigo.
Camarini explica que o enriquecimento ambiental possui várias características e elementos que podem ser aplicados para proporcionar o bem-estar. A investigação dos seus efeitos teve como foco modelos animais que foram envolvidos em diversas situações. Algumas das categorias em que as reações dos animais foram avaliadas são a convivência em grupos para maior engajamento social, a estimulação visual com brinquedos de diferentes tamanhos e cores, auditiva por exposição à música e tátil pela introdução de objetos com texturas diferentes e o exercício físico em rodinhas e rampas.
Ratos que foram inseridos em ambientes enriquecidos apresentaram melhora das funções neuroimunes e das habilidades de aprendizado e resolução de problemas, redução de comportamentos ansiosos e depressivos e diminuição da hiperalgesia, isto é, da sensibilidade exagerada à dor. “Os estudos clínicos têm mostrado que essas práticas podem ajudar no controle da dor e aliviar a neurodegeneração”, relata a professora.
Camarini diz que também foi discutido o papel da neuroinflamação de células microgliais na dor e nos distúrbios psicológicos. Esse tipo de células está presente no sistema nervoso central e atua de forma semelhante aos glóbulos brancos, fagocitando corpos estranhos e neurônios não funcionais. Sua disfunção e ativação prolongada contribui para a manifestação de diferentes enfermidades.
A suscetibilidade à dor crônica, à depressão e à ansiedade está relacionada com o ambiente psicossocial em que se está inserido e com alterações no sistema imunológico. Já foram identificadas substâncias associadas à neuroinflamação que são secretadas pela microglia em indivíduos que possuem as três doenças, o que indica a relação entre as células microgliais e as enfermidades.
Segundo Camarini, “os benefícios do enriquecimento ambiental estão relacionados com a capacidade de diminuir a expressão de genes inflamatórios e de induzir um equilíbrio homeostático das características neuroprotetora e neurotóxica da microglia”. Ou seja, a prática consegue direcionar a atividade da microglia para um caráter anti-inflamatório.
Em seres humanos, o enriquecimento ambiental já tem sido usado com resultados positivos em pacientes com traumatismo craniano e no pós-operatório de algumas cirurgias. Foram verificadas a melhora na dor, a redução no uso de analgésicos, a diminuição do estresse e uma melhor recuperação clínica. Além dos já citados, outros exemplos de enriquecimento humano são artesanato, ioga e música.
De acordo com a professora, os próximos passos envolvem mais pesquisas clínicas sobre as vantagens do enriquecimento ambiental para a depressão, a ansiedade e a dor crônica, bem como o estudo dos mecanismos neurais pelos quais a prática exerce seu benefício.
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