Publicada pela primeira vez em 1865, a obra Iracema povoa o imaginário do povo brasileiro acerca do que foi a colonização e a miscigenação entre portugueses e os povos indígenas no Brasil. Escrito por José de Alencar, o livro busca retratar a criação de uma identidade e cultura nacional num romance indianista.
A narrativa retrata o enlace amoroso entre Iracema, uma indígena tabajara de personalidade marcante e fortemente ligada às tradições de seu povo, e Martim, imagem fiel dos colonizadores portugueses do século XVI. A história tem início quando o europeu se perde na mata em meio de uma de suas missões para defender o território de outros povos colonizadores, e, ao disparar uma flecha em direção ao homem e perceber que ele não reagiria de forma negativa, Iracema decide levá-lo para sua aldeia. A partir desse ponto, as festividades e rituais de seu povo são retratados com riqueza de detalhes, fato que torna a obra uma das mais conhecidas do período.
Fernando Paixão, professor do IEB e autor do livro Iracema, poética do ritmo (Fino Traço, 2021), afirma que o livro de Alencar é lido e entendido frequentemente como apenas uma obra indianista e nacionalista, porém, esquece-se que é inventada nele uma nova forma de escrever, uma nova poética.
Na obra, o professor analisa a poética de Iracema, as diferenças na linguagem utilizada em relação aos demais textos da época, e as semelhanças com outros, como a própria Bíblia. “O livro conta uma história, da índigena e do homem branco, e, ao mesmo tempo, inventa um jogo de linguagem. Há fabulações, metáforas que formam uma poética”, esclarece Paixão.
O professor explica que a utilização de elementos mais próprios da poesia, enquanto ainda trabalha no estilo de prosa, pode ser um fator que tornou a obra tão conhecida e relevante. É a chamada “prosa-poética”, gênero literário ainda em discussão acerca de sua existência e características, que tem sua origem com o autor francês Charles Baudelaire, no século XIX.
Baudelaire é, além de um dos primeiros autores a trabalhar com poemas em prosa, também um dos fundadores do movimento literário modernista, e uma grande influência dos artistas brasileiros dessa corrente artística. O professor aponta, entretanto, para a ausência de referências ao poema em prosa no Modernismo brasileiro: “Essa recusa não aconteceu em nenhum outro país, e tornou nossa história escassa em bibliografia sobre o gênero”.
Iracema é estudada por diversos grupos e autores, que variam desde alunos de Ensino Médio até doutorandos especializados. A riqueza da obra chama atenção, e a torna um dos pilares da Literatura brasileira: “É diferente, único”, expressa Paixão.
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