Eleição de primeiro presidente de esquerda indica mudança política na Colômbia

Acordo de Paz com as Farc e polarização política: Gustavo Petro ganha eleições com promessa de ser uma grande mudança na política

Montagem sobre imagens de Raul Arboleda/ AFP.

No dia 10 de junho de 2022, a Colômbia elegeu a chapa de Gustavo Petro e Francia Márquez para a Presidência e Vice-Presidência da República. Com 50,44% dos votos, a chapa é a primeira do país do espectro ideológico da esquerda. As eleições colocam a Colômbia na chamada onda rosa movimento de ascensão de líderes de centro-esquerda na América Latina. Margarita Bautista, doutora pelo Instituto de Relações Internacionais da USP e pelo King’s College de Londres, analisa o significado da vitória de Petro e o contexto político que levou à sua chegada ao poder. 

Para Margarita, Petro representa uma mudança histórica para a política tradicional e para a figura da presidência na Colômbia. Ele defende uma transformação do modelo econômico na Colômbia para a igualdade social, com uma transição energética e uma reforma agrária”. Ela explica que, pela primeira vez, é eleito um candidato que dá espaço para uma reforma tributária que reduza a tributação sobre os mais pobres e a aumente sobre os mais ricos. Além das reformas econômicas, a especialista ainda chama atenção para Francia Márquez, eleita vice-presidente: “Francia, é uma mulher afrodescendente, líder social com histórico de luta pelo empoderamento das mulheres, que reivindica a presença do Estado nas regiões mais esquecidas e a conservação do meio ambiente”. 

As eleições de Petro acontecem em um cenário de polarização. Rodolfo Hernández, candidato que concorreu com Petro no segundo turno, recebeu 47,31% dos votos. Apesar de não ter sido eleito, o desempenho de Hernádez representa a popularidade de pautas como a aversão à política tradicional e o combate à corrupção. Margarita explica que “o público que acompanhou o candidato Hernández não se define na esquerda ou na direita, mas mostra algumas tendências à direita. Hernandez se apresentou como uma terceira via autoproclamada como a salvação do país diante dos extremos”.

Rodolfo Hernández, opositor de Gustavo Petro, recebeu 47,31% dos votos. Foto: Reprodução/Youtube

Nesse contexto, o novo presidente terá que enfrentar a desconfiança de alguns setores sociais. “A Colômbia não ter elegido até agora um presidente de esquerda está intimamente relacionado com a existência de uma classe dominante, hegemônica e muito conservadora que continua governando o país”, Margarida analisa. Para ela, esses grupos atuaram ao longo da história política colombiana evitando a ascensão da ideologia de esquerda. “[Essa elite] tem alarmado o povo argumentando que a esquerda levará ao país um modelo castrista-chavista de atraso econômico e social”. 

O Acordo de paz de Havana em 2016, que estabeleceu o desarmamento e institucionalização das Farc as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia como uma força política, foi importante para a maior aceitação da esquerda. “Após seis anos do acordo de paz, um candidato de esquerda tem a possibilidade de chegar à Presidência, em um país onde manifestações e reivindicações sociais se confundem com atos de proselitismo armado que geram estigmatização e violência contra determinados setores”, pontua Margarita. 

Por outro lado, ela lembra que a questão  do acordo não está completamente resolvida: “Tem havido problemas no reconhecimento da reincorporação de vários ex-combatentes, falta de garantias para a sua segurança, problemas na implementação dos pontos relacionados com o desenvolvimento rural e falta de soluções claras para o problema das drogas ilícitas. Até o momento, mais de 320 ex-combatentes foram assassinados e os dissidentes continuam aumentando, sem mencionar os ativistas sociais que têm sido mortos em média um a cada dois dias”.

Para resolver esses problemas, Margarita avalia ser necessário que a gestão de Petro se articule com os governos territoriais para fortalecer a presença do Estado Social de Direito nas regiões mais isoladas, o que deve ser feito com rapidez. “O novo governo precisa oferecer soluções rápidas para os problemas que enfrentam os atrasos na implementação. Pois de forma alguma será possível gerar desenvolvimento no país quando não forem resolvidas as questões estruturais que geraram pobreza, desigualdade e violência”.

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