Uma pesquisa realizada na Escola de Enfermagem (EE) da USP buscou analisar a dinâmica do uso de métodos contraceptivos como preservativo masculino, pílula anticoncepcional e injetável em mulheres usuárias do SUS nas cidades de São Paulo, Aracaju e Cuiabá, com o objetivo de compreender a descontinuidade e o abandono do uso desses métodos.
Ana Luiza Vilela Borges, enfermeira, professora titular do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da EE e coordenadora do estudo, explica à AUN que “a descontinuidade contraceptiva é um indicador que mede a falta de consistência no uso das diversas formas de evitar uma gravidez, causada pelo abandono, troca ou falha do método anticoncepcional escolhido”.
A especialista comenta que há dois principais tipos de métodos contraceptivos: os de curta ação, como o preservativo masculino e a pílula, e os de longa ação, como o anticoncepcional injetável, o DIU e os procedimentos cirúrgicos (como a laqueadura). Segundo ela, o primeiro grupo de métodos depende do comportamento do usuário para ter seu funcionamento adequado, pois é preciso usar preservativo em todas as relações sexuais e tomar a pílula regularmente, enquanto o segundo grupo tem ação prolongada e duradoura.
“Nenhum método anticoncepcional é 100% eficaz, mas há diferenças na eficácia entre eles. E no Brasil, percebemos que há uma maior adesão a métodos que dependem de uma conduta rígida por parte de quem os usa, como a camisinha e a pílula”, comenta Ana Luiza.
O estudo, publicado nos Cadernos de Saúde Pública, foi elaborado a partir dos dados de 2.051 mulheres entrevistadas em Unidades Básicas de Saúde (UBS) de diversas regiões das cidades de São Paulo, Aracaju e Cuiabá, compondo uma amostragem com grande diversidade geográfica, social e populacional.
Ao longo de 12 meses, essas mulheres foram acompanhadas e questionadas sobre o uso de métodos contraceptivos e os motivos do eventual abandono ou troca destes. Foi constatado que quase um terço delas abandonou o método escolhido em até 12 meses após o início do uso, por razões diversas: por conta dos efeitos colaterais de anticoncepcionais hormonais, desejo de engravidar ou busca por um método mais eficaz.
Além disso, uma em cada quatro pacientes relataram ter engravidado enquanto o parceiro usava camisinha, 18% fazendo uso de pílula anticoncepcional e 8,4% com anticoncepcional hormonal injetável — números acima da média calculada pela Organização Mundial de Saúde.
A enfermeira manifesta que o desconhecimento sobre o que esperar de cada um dos métodos contraceptivos agrava a situação, uma vez que as mulheres podem se surpreender com consequências indesejadas e abandonar a contracepção.
Como explica Ana Luiza, essa questão também tem relação com o aborto induzido, que, como não é legalizado no Brasil, expõe as mulheres a maiores riscos de saúde caso desejem interromper uma gravidez após a falha ou abandono de métodos anticoncepcionais.
“Elas precisam ter acesso a um serviço de saúde que ofereça todos os métodos contraceptivos e que as oriente nessas escolhas”, diz a pesquisadora, fazendo referência à Lei do Planejamento Familiar, que prevê a disponibilização, por parte do Estado, de todas as formas existentes de anticoncepção.
Ana Luiza defende que, em um país onde 55% das gestações não são planejadas, é preciso que métodos anticoncepcionais mais eficazes e de longo prazo não sejam restritos a um grupo específico de mulheres, como aquelas em situação de vulnerabilidade, e sim disponibilizados para toda a população feminina.
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