Estudo elaborado por pesquisadores do Instituto Oceanográfico da USP e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul identificou doze espécies de cetáceos e as áreas de distribuição das seis espécies mais comuns. Os cetáceos são mamíferos exclusivamente aquáticos representados pelas baleias, botos e golfinhos. Marcos César de Oliveira Santos, professor do Departamento de Oceanografia Biológica do Instituto Oceanográfico da USP e um dos autores do estudo, compartilha que ao menos 30% das espécies de cetáceos conhecidas globalmente foram notificadas em águas brasileiras.
A pesquisa, financiada pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de S. Paulo), coletou dados de avistagem por meio de cruzeiros com lanchas rápidas. O cruzamento dessas informações, em conjunto com bancos de dados oceanográficos mundiais permitiu a formulação de modelagens ecológicas em softwares especializados. “Essas modelagens analisam qual fator justifica a presença de uma espécie naquela região. Com esses dados, o software vai trabalhar com probabilidade de encontros, e a partir disso, criamos os mapas das seis espécies mais comuns que encontramos”, explica o pesquisador.
Nichos ecológicos
Os nichos ecológicos monitorados na pesquisa foram dos seis cetáceos mais comuns na costa paulista: Baleia-de-bryde, golfinho-pintado-do-atlântico, golfinho-de-dentes-rugosos, golfinho-nariz-de-garrafa, boto-cinza e toninha, o menor golfinho da costa brasileira e também o mais ameaçado de extinção no Atlântico Sul. A presença desses animais no litoral paulista está relacionada a variáveis ambientais, como salinidade e temperatura, e à distribuição de presas. Embora os animais apresentem preferências ambientais diferentes, a maioria deles têm sobreposição parcial entre nichos. O único caso que não teve sobreposição foi o boto-cinza, que ocupa a faixa costeira.
Isso ocorre porque alguns golfinhos afastam as espécies menores na disputa de alimento, o que pode ter levado o boto-cinza a diminuir sua área de uso, como explica o pesquisador: “Os dados que geramos mostra o boto-cinza na região costeira, provavelmente assinalando ao nariz-de-garrafa que eles não vão criar confusão, e o nariz-de-garrafa ocupando toda aquela outra faixa mais afastada junto com o dentes-rugosos, o pintado-do-atlântico, a baleia-de-bryde e a toninha e provavelmente entre eles há paz.”
De acordo com o pesquisador, a sobreposição de nichos ecológicos permite identificarmos o potencial da costa paulista. “Se uma espécie de baleia e cinco espécies de golfinhos estão se alimentando na costa do Estado de São Paulo, assim como é no litoral que pescamos e retiramos nossa comida, quer dizer que é um litoral altamente produtivo”. A alta produtividade biológica vem principalmente dos fitoplânctons, microalgas responsáveis por absorver o CO₂ (dióxido de carbono) que emitimos em excesso e também por gerar o oxigênio que respiramos.
Para entender a dimensão do papel ecológico dos cetáceos, Oliveira Santos esclarece que eles são os “engenheiros dos sistemas marinhos”: é por meio das fezes de baleias e golfinhos que ocorre a fertilização orgânica dos oceanos. Cetáceos são também excelentes indicadores de qualidade de vida: por serem acumuladores de toda a contaminação química dos mares, eles nos informam a saúde da vida marinha, além de ocupar o topo da teia alimentar, ajudando na manutenção da diversidade de espécies. “Por apresentarem uma dieta diversificada, eles balanceiam as populações de todas as presas e mantém o ambiente em equilíbrio.”
Para Oliveira Santos, o conhecimento sobre cetáceos no Brasil está em processo de construção, assim como o interesse popular pelos oceanos, que deve ser desenvolvido de dentro da academia para a sociedade: “Estamos vendo um grande número de artigos científicos mostrando baleias e golfinhos como engenheiros dos oceanos, mas essa informação vem de 10 anos para cá e estamos em um país que temos um processo muito lento da transformação da informação científica em uma informação didática e a criação da conscientização popular”, finaliza o pesquisador.
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