Seja em consultas médicas, nas aulas de educação física, na academia ou na fisioterapia, a maioria das pessoas já realizou o exercício de tentar tocar os pés com as mãos sem dobrar os joelhos. Esse é o chamado “teste 3º dedo ao solo”, que é utilizado como ferramenta de avaliação num programa de atividades físicas. No 1º dia de treinamento, por exemplo, o teste mensura a flexibilidade da pessoa e, após um determinado período, ele é repetido para verificar o efeito que o treino teve. O equilíbrio, no entanto, é um fator que afeta significativamente o resultado desse teste. Foi isso que apontou a pesquisa de doutorado de Cássio Marinho Siqueira, do Departamento de Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da USP (Fofito).
Intitulado A influência do equilíbrio postural no teste 3º dedo ao solo, o estudo avaliou se os resultados desse tipo de teste eram devidos à falta de flexibilidade ou a ajustes posturais para manter o equilíbrio.
A pesquisa mostra que o controle do comprimento muscular é feito pelo sistema nervoso de acordo com as necessidades da tarefa, demandas do ambiente e condições da pessoa. Não é só uma questão de músculos curtos que precisam ser esticados.
Segundo o pesquisador, um resultado ruim nesse teste de flexibilidade geralmente é atribuído a músculos encurtados. “Quem não consegue encostar as mãos nos pés é ‘diagnosticado’ como tendo músculos encurtados e é indicado que faça alongamentos”, conta Siqueira.
No entanto, em seu estudo, verificou-se uma relação entre equilíbrio e flexibilidade, na qual as pessoas que não conseguem ajustar o equilíbrio adequadamente vão mal no teste. Desse modo, a causa de não se tocar o chão não seria músculos encurtados, mas apenas uma forma de se equilibrar.
Para chegar a tal conclusão, o teste 3º dedo ao solo foi realizado com as condições de equilíbrio manipuladas de forma a facilitar ou dificultar sua execução. Em seguida, observou-se as respostas através de fotos das posições e cálculo dos ângulos articulares no computador e em uma plataforma que mede a força que os pés aplicam no chão.
No primeiro teste manipulado, o participante usava um cinto de segurança que o impedia de cair para frente. Houve melhora de 73% do resultado do teste. A pessoa com melhor desempenho saiu de 24 centímetros de distância da mão ao pé no teste usual e chegou a tocar o pé no teste com o cinto.
Nos testes em aclive (equilíbrio facilitado porque o teste tende a desequilibrar para a frente e o aclive desequilibra para trás – um anulando o outro) o resultado foi 63% melhor, enquanto o teste em declive (equilíbrio dificultado pela somatória da demanda do teste e do declive) obteve resultado similar ao do teste usual.
Após isso, o pesquisador orientou os participantes em relação à forma de se equilibrar para realizar o teste apenas com instruções verbais, demonstração e um rápido treino de apenas três repetições. Isso já foi suficiente para melhorar o resultado do teste de forma similar ao teste com o cinto de segurança.
Desse modo, verificou-se que a forma como a pessoa se equilibra para realizar o teste interfere bastante no resultado. O que era interpretado como um encurtamento muscular era, na verdade, ajustes de equilíbrio. “Para evitar que você caia à frente, seu sistema nervoso faz você jogar peso para trás e ‘trava’ seus músculos numa posição segura. Se você sabe se equilibrar adequadamente para jogar peso do corpo à frente, seu sistema nervoso deixa de fazer essa proteção e você passa a ser capaz de alcançar o solo”, explica Siqueira.
Segundo o pesquisador, para verificar isso, basta realizar o teste normalmente e medir a distância que a mão ficou do chão. Em seguida, levantar, fazer uma força de apertar os dentes (morder) e manter esta força enquanto repete o teste. Dessa forma, espera-se que a mão fique bem mais próxima do solo agora. Em relação ao estudo, Cássio Marinho Siqueira ainda pontua que “sua importância está na originalidade do olhar para a situação, não na complexidade da metodologia”.
Faça um comentário